quarta-feira, 17 de junho de 2015

Minha experiência com a Arnold Classic: três semanas internado num hospital

Acabei de entrar em casa. E essa é uma das sensações mais felizes da minha vida. Nunca imaginei que, entrar dentro da minha própria casa, fosse me provocar tamanha emoção. Mas, depois de três semanas internado no Barra D'Or, o sentimento não poderia ser outro.

Se eu tivesse como voltar no tempo e mudar o rumo dessa história, eu não tentaria curar uma dor de cotovelo da Marjorie, quando fui buscá-la no aeroporto, no dia que ela terminou com o Felicianderson:

Adalberto: Não chora, Jojô.

Marjorie: Eu acreditei quando ele disse que me amava.

Adalberto: Mas ele podia estar falando a verdade. O problema foi ele ter se apaixonado pelo personal trainer. Mas eu acho que, se esse cara não aparecesse na vida dele agora, o teu sofrimento só ia ser adiado pra daqui a, no máximo, uns 15 anos, quando você vai estar velha, pelancuda e com um monte de filho.

Marjorie: Por que, primo?

Adalberto: Porque ele é gay e não sabia. Uma hora, ele ia descobrir.

Marjorie: Mas podia ser antes de eu enjoar dele, né?

Adalberto: Ah, então, você não amava o Felicianderson também.

Marjorie: Ah, mas estava curtindo.

Adalberto: Engole o choro agora!

Encostei o carro em frente ao primeiro bar que vi na minha frente e dei uma ordem a ela:

Adalberto: Compra uma garrafa de 51. Vou te ajudar a sair dessa.

E enquanto eu ia com a farinha, ela vinha com o bolo. Ou melhor, com um fortão de mais ou menos uns dois metros de altura.

Marjorie: Adal, ele não deixou eu comprar a 51.

Adalberto: Como assim? Quem é ele?

Flavíssimo: Prazer, Flavíssimo.

E essa era a primeira pessoa, que conheci na minha vida, que tem o nome no superlativo.

Adalberto: Prazer, Adalberto.

O aperto de mão dele foi apertadíssimo. Tudo o que o Flavíssimo fazia era no superlativo.

Marjorie: Adal, ele vai com a gente... Pra sua casa.

Adalberto: Oi?

Marjorie: Ele é fisiculturista, veio competir no Arnold Classic. Estava perdido, pedindo informação no bar. O amigo que ia dividir hotel com ele deixou ele na pista, tá com o telefone desligado, é mole?

Adalberto: E eu com isso?

Bem, eu tive que entubar essa. E, no meio do caminho, quando um carro me deu uma cortada, ele colocou quase o corpo inteiro pra fora da janela e mostrou a que veio.

Flavíssimo: Ô, mermão, tá a fim de morrer?

Marjorie: Flavíssimo, cuidado!

Adalberto: Deixa pra lá, querido. Trânsito aqui no Rio é assim mesmo.

Flavíssimo: É assim porque vocês são um bando de conformados! Se não der porrada num cara desses, ele nunca vai aprender.

Eu e Marjorie ficamos calados.

Flavíssimo: Foi mal, gente. Essas coisas já me irritam, e eu ainda tô numa dieta frenética. Aí, já viu, né? Dá vontade de quebrar tudo.

Marjorie: Te entendo.

Flavíssimo: Então, me dá um beijo. Anda, quer apanhar? Tô brincando, eu não sou um cara violento, não.

Quando cheguei na porta do meu prédio, fui parado pelo segurança.

Segurança: O senhor tá sem o tag do estacionamento.

Adalberto: Putz, esqueci no carro da minha irmã. O meu carro estava consertando, e eu usei o carro dela. Pego mais tarde, pode ser?

Segurança: Infelizmente, não posso deixar o senhor entrar.

Flavíssimo: Como é que é?

Segurança: Eu não vou poder deixar ele entrar sem o tag do estacionamento. Foi isso que eu disse.

Adalberto: Flavíssimo, por favor. Tá tudo bem, eu vou estacionar aqui fora mesmo.

Flavíssimo: Tudo bem? Eu vou mostrar pra ele como é que fica tudo bem.

E com aqueles braços do tamanho das minha coxas, ele quebrou a cancela do meu prédio, pegou o segurança pelo colarinho e me obrigou a entrar com o carro.

Adalberto: Marjorie, esse homem não vai ficar na minha casa.

Marjorie: Calma, Adal. Entra com o carro. Lá dentro eu vou resolver isso.

Adalberto: Ele vai pagar o conserto da cancela.

Marjorie: Você vai ter coragem de falar isso pra ele.

Adalberto: Putz, tem isso ainda... Deixa que eu pago, tá muito cedo pra morrer.

Marjorie: Eu pago, primo.

Dentro da minha própria casa, eu agia pisando em ovos:

Adalberto: Flavíssimo, você quer tentar ligar pro teu amigo do meu celular? Quem sabe não é o teu aparelho que não tá funcionando direito aqui no Rio...

Flavíssimo: Tá maluco? Comprei esse aparelho tem menos de um mês.

Adalberto: É, não deve ser isso, me perdoa.

Marjorie: Você não quer tomar banho?

Flavíssimo: Tô fedendo, por acaso?

Marjorie: Não, mas você veio do Rio Grande do Sul de ônibus! Foram horas de viagem.

Flavíssimo: E daí? O ônibus tem ar-condicionado. Tá me chamando de porco? Tá? Responde!

Adalberto: Flavíssimo, não liga, não. A Marjorie tem essa mania de limpeza. Ela também vive me mandando tomar banho.

Flavíssimo: Tem o que pra comer?

Adalberto: Então, uma outra prima nossa tá trazendo uma lasanha de quatro queijos.

Flavíssimo: Tá maluco? Ninguém aqui vai comer lasanha na minha frente! Eu tô de dieta, vou competir amanhã! Ou manda ela trazer batata doce com frango grelhado ou manda ela voltar pra casa e ficar uma baleia sozinha.

Olhei pra Marjorie com cara de cu.

Marjorie: Eu ligo pra ela, Adal.

Nessa hora, a campainha tocou. Era a Lu com a lasanha.

Adalberto: Lu, é melhor você voltar.

Lu: Como assim?

Adalberto: Você não vai poder entrar aqui em casa com essa lasanha.

Lu: Tá maluco? Eu não vim de Del Castilho, de ônibus, carregando esse peso, pra ter que voltar. Não sou palhaça!

Flávíssimo: Nem eu!

Lu: Quem é idiota?

Flavíssimo: Você vai ver quem é o idiota, sua vagabunda!

Quando ele voou pra cima da Lu, consegui me meter na frente. E livrei a minha prima do maior espancamento que ela poderia ter tomado na vida. Em compensação, fui parar na emergência do Barra D'Or.

O bom de ter voltado pra casa, depois de três semanas internado, foi os mimos que recebi das primas:

Ane: Trouxe um saco de Serenata de Amor pra você!

Adalberto: Oba!

Sara: Eu fiz o Oswaldo ir tarde da noite comprar morango. Fiz com creme de leite.

Adalberto: Hummm...

Marjorie: Eu trouxe o dinheiro da cancela. E um cartão. Desculpa, primo!

Adalberto: Você não tem que me pedir desculpa. Ah, tem, sim! Não vou fazer média com você.

Lu: E eu trouxe lasanha aos quatro queijos!

Sara: E pelo cheiro, tá saborosíssima.

Adalberto: Saborosíssima? Assim, no superlativo? Quero não...

Olhei pra cara da Marjorie e nunca mais paramos de rir.