terça-feira, 29 de março de 2011

Marjorie e Sara são vítimas de grandes sacadas travestidas de grandes falhas

Hoje, o carinha que a Marjorie tá saindo, o Silvérico, apareceu lá no trabalho pra levar um presente pra eu entregar pra ela. Esse cara é muito estranho. Desde que descobriu que a minha prima tem uma graninha boa, faz de tudo pra mostrar que é O CARA pra se casar. Agora, tá fazendo ceninha pra eu tirar a má impressão que ele me passa. Ele sabe que o meu santo não bate com o dele. Enfim, saí cedo do trabalho pra almoçar com a Marjorie e a Sara, no Baixo Méier, e entregar essa porra desse presente:

Sara: Tô adorando estar grávida. Só assim, vocês vêm almoçar comigo no Baixo Méier sem reclamar.

Marjorie: A uma grávida não se discorda!

Adalberto: Nem sempre.

Sara: Lá vem você, primo...

Adalberto: Ué, tô falando o que eu acho.

Marjorie: Esse garoto é muito chato, prima. Não liga, não. Eu concordo com tudo que você falar. Assino embaixo mesmo.

Sara: É? Que bom, prima. Vou precisar do seu apoio mesmo. Ainda mais agora, que eu tomei a decisão de me separar do Oswaldo.

Adalberto: Como assim? Que palhaçada é essa? Eu não concordo com isso.

Marjorie: Nem eu. Tá maluca?

Sara: Você acabou de dizer que a uma grávida não se discorda.

Marjorie: Mas pra toda regra há uma exceção.

Sara: Hoje eu fui fazer a ultra pra saber o sexo do bebês. Quando eu saí da clínica e liguei pro Oswaldo, ele disse que estava muito ocupado e não podia falar. Ouseja, ele não tá nem aí pra mim nem pros filhos dele. Não quero isso pra mim, não. Cansei.

Adalberto: Sarita, qual é o sexo dos meus afilhados?

Marjorie: Tô morrendo de curiosidade. Esquece o Oswaldo agora. Depois, a gente volta nele.

Sara: Um menino e duas meninas. Vocês têm sugestão de nome?

Adalberto: Claro! Vinícius, Laura e Beatriz.

Sara: Sem graça! Não vou botar os nomes dos filhos da Fátima Bernardes nos meus filhos.

Marjorie: Prima, eu vou ser a madrinha de qual?

Sara: Não sei. Ainda vou ver isso. Primeiro, eu tenho que arrumar um padrasto pra me ajudar a criar os meus filhos. Sozinha não dá. Eu não trabalho.

Marjorie: Ai, prima, homem é tudo igual. Eu tô saindo com um carinha... o Adal conhece, o Silvérico. O cara me liga de manhã pra me dar bom dia, de tarde pra dizer que tá com saudade e de noite pra me dar boa noite. Eu tô adorando. Mas sei que, homem que ama, é assim no começo. Daqui a pouco isso acaba.

Daqui a pouco, nada. Como assim a minha prima tá adorando os cortejos baratos desse babaca interesseiro?

Adalberto: Você tá gostando mesmo desse cara?

Marjorie: Adal... Tô. Tem coisas nele que me irritam? Tem. Ele só transa comigo de meia, por exemplo. Diz que é por causa do ar-condicionado. Sente frio nos pés. Mas me irrita.

Foi a deixa que eu precisava.

Adalberto: Ele não te falou que tem seis dedos no pé esquerdo?

Marjorie: Mentira! O Silvérico tem seis dedos no pé?

Adalberto: Tem.

Mentira, claro.

Sara: Como é que você sabe, Adal?

Adalberto: Ele conversou comigo e pediu a minha opinião sobre esse assunto.

Marjorie: E aí?

Adalberto: Eu disse pra ele te falar a verdade.

Marjorie: E ele?

Adalberto: Ele disse que ia te falar, ué. Pelo tempo, achei que você já soubesse.

Sara: Gente, mas qual é o problema em ter seis dedos no pé? Isso te incomoda, prima?

Às vezes, parece que a Sara se faz de boba. Claro que uma besteira como essa incomoda a Marjorie. Aliás, não só incomoda, como a deixa neurastênica.

Eu lembro que, quando o pessoal do Pânico na TV começou com aquela história de que a Cicarelli tinha seis dedos num dos pés, ela disse que a beleza da modelo tinha ido pro saco. Pra mim, com um, dois até três dedos a mais no pé a Cicarelli continua sendo uma das mulheres mais lindas do mundo.

Marjorie: Ai, brochei total.

Adalberto: Ah, prima, dá uma chance pro cara. Ele só tem seis dedos no pé esquerdo.

Marjorie: Só seis dedos no pé esquerdo? Esse cara é um babaca, um ridículo, um fraco, um pequeno, um menor, um baixo, um indiferente, um escroto, um animal, um canalha, um covarde, um otário, um imbecil...

E assim, eu consegui queimar o filme do Silvérico com a Marjorie. Mas precisava reconquistar o meu espacinho no céu.

Sara: Gente, eu tô com sono. Vou andando pra casa.

Marjorie: Já?

Sara: Tô cansada, prima.

Adalberto: Quer que eu te leve?

Sara: Não, primo. Fica aí. Eu tô bem.

Adalberto: Tá mesmo?

Sara: Tô. Prestes a terminar o meu casamento, mas tô tranquila. Deus sabe o que faz.

E eu também.

Adalberto: Olha só, a gente falou tanto, que eu acabei esquecendo de te dar isso aqui.

Sara: Que embrulho é esse?

Marjorie: Eu tô pra te perguntar desde a hora que você chegou.

Adalberto: O Oswaldo foi fazer um serviço lá perto do meu trabalho e me entregou esse presente. Pediu pra eu te entregar, porque sabia que eu vinha me encontrar com você, sua bobona.

Sara: Sério?

Adalberto: Sério.

Marjorie: Ai, que lindo, prima. Viu? Ele te ama.

Sara: Mas por que você não falou antes, Adal? Eu já ia me separar do Oswaldo, tadinho...

Marjorie: É! Não entendi nada. Primo, você já foi melhor, hein. Essa de você só me contar hoje, que o Silvérico tem seis dedos no pé e de esquecer de dar o presente do Oswaldo pra Sarinha foram duas grandes falhas. que papel, hein...

Sara: Concordo.

Eu, não. Aliás, mais uma vez, não concordei com a grávida.

Grandes falhas... Grandes sacadas! Isso, sim!

segunda-feira, 28 de março de 2011

Lu fica na pista por causa de Iphone e Air Supply

Quando eu saí do trabalho, na sexta, eu só queria sentar num barzinho com meus amigos e tomar umas duzentas cervejas. Pra que fui atender a chamada da Lu:

Adalberto: Fala, bonitona! Tô indo tomar um chope com os meus amigos do Segundo Grau. Partiu?

Lu: Que mané amigos do Segundo Grau... Bora pro show do Air Supply?

Adalberto: Nem fodendo...

Lu: No Ceará.

Adalberto: Nossa, nem fazendo a posição mais George Lucas do Kama Sutra.

Lu: Adal, por favor. Eu preciso que você conheça o Ediléo. O cara que eu conheci na semana passada numa feijoada.

Adalberto: Ediléo? Isso é nome de gente?

Lu: O nome é Edileonardo, mas eu abrevio.

Adalberto: Ah...

Lu: Mas ele tem bala. É gerente de alguma coisa maneira na empresa, que ele trabalha e mora numa cobertura no Leblon. Fora que é um lord. Dessa vez, você vai aprovar.

Adalberto: Não, Luluzita, vamos deixar pra uma próxima. Dessa vez, eu vou tomar um chopinho com os meus amigos.

Lu: Ah, não. Não aceito isso do cara que diz que eu sou uma das quatro primas que ele mais ama.

Chantagem emocional se paga com chantagem emocional.

Adalberto: Mas é verdade, lindona. Sabe, eu até iria, mas comprar passagem em cima da hora é muito caro.

Lu: Jura?

Adalberto: Juro.

Lu: Então, pode se arrumar, que eu acabei de comprar a sua passagem.

Adalberto: Como assim?

Lu: Pela internet, ué.

Caralho, vingança travestida de chantagem emocional é um prato que se como cru... Porra, queria ter ido tomar um, pelo menos um, chope com os meus amigos. Que merda!

Não dava nem tempo de eu ir pra casa. Fui varado pro aeroporto, com cheiro de expediente de trabalho.

Lu: Até que enfim, hein...

Adalberto: Lu, eu não fui nem em casa me arrumar. Essa cidade virou um grande canteiro de obras, por causa das Olimpíadas de 2016. O trânsito ficou mil vezes pior do que já era.

Tinha um cara com mó cara de babaca do lado dela. Devia ser o Ediléo. Eu me arrisquei:

Adalberto: Essa sem educação nem apresentação. Você dever ser o Ediléo. Eu sou o Adalberto, primo dela. Muito prazer.

Ediléo: A gente sempre fala de você lá em casa.

Que porra é essa?

Adalberto: Sério?

Ediléo: Sério. Eu já sei que, quando você fica bêbado, conversa em outros idiomas; que você sempre dá o primeiro pedaço de bolo pros penetras das suas festas; que você já foi ao banheiro pra fazer número dois e se limpou com a água do vaso, porque não tinha papel; e que uma vez, pra não ser asaltado, você fingiu que estava recebendo um santo e ficou falando com o assaltante como se fosse uma entidade chamada...

Adalberto: Pai Quirino.

Ediléo: Isso! Só que você fala Pai Quilino. Caraca, você é muito engraçado.

A risada do Ediléo me irritou. Não sei se era porque eu não estava achando graça nenhuma ou se era porque ele ri muito esquisito mesmo. Uma risada de Taquara rachada, sabe?

Lu: Viu como eu só falo em você?

Adalberto: Ah, claro. aliás, muito obrigado por contar coisas tão legais pros outros sobre a minha pessoa. Fico te devendo essa, prima.

E paguei no show do Air Supply. Mas foi sem querer.

A fila pra entrar no show estava imensa. E eu já estava de saco cheio:

Adalberto: O Air Supply podia fazer um show no Rio, hein...

Ediléo: Mas vai fazer em abril. E eu vou. Só que não aguentei esperar e decidi, de última hora, vir pra cá.

Que babaquice!

Adalberto: Ah, legal.

Lu: Tô com sede.

Adalberto: Eu também. Vou ali comprar uma água pra gente.

Ediléo: Quer dinheiro, Adal?

Adalberto: Não, não precisa.

Se eu fosse comprar água de verdade, até aceitaria. Mas a água foi só um pretexto pra eu sair daquela fila, que parecia procissão de santo pop da Igreja Católica.

Quando não tinha mais ninguém pra entrar e eu já devia estar na décima cerveja, o camelô resolveu me dar uma informação de altíssima relevância.

Camelô: Amigão, aqueles caras ali fumando são os caras do Air Supply.

Puta sorte que eu dei. Os caras foram fumar do lado de fora, enquanto os babacas dos fãs mofavam lá dentro. Assim, eu consegui tirar uma foto com o Graham Russell e Russell Hitchcock, antes mesmo do show começar. O legal é que, se não fosse o camelô pra me avisar, eu nem saberia de quem se tratavam.

Entrei pro show e já fui logo contando a novidade:

Ediléo: Não acredito!

Adalberto: Querido, tirei foto e tudo e já postei no Facebook, inclusive.

Lu: Você não tem celular que faz foto.

Adalberto: Eu, não. Mas o camelô tinha. E era Iphone 4, tá? Desculpa.

Ediléo: Ai, quero me matar.

Adalberto: Então, se mata, baby, porque nem a guimba do cigarro que eles fumara eu lembrei de trazer pra você.

Ediléo: Caraca, você, hein...

Adalberto: Eu o quê? Olha bem pra minha cara. Vê se ia pegar a guimba do cigarro do...

Lu: Gente, o show vai começar.

Essa foi a deixa da Lu pra evitar que eu mandasse o Ediléo ir à merda ou tomar no cu.

Fui várias vezes ao banheiro durante o show. Estava completamente alheio a tudo que o Graham Russell e o Russell Hitchcock estavam cantando. Eu, definitivamente, não posso beber cerveja antes de um show, porque, depois que eu vou ao banheiro a primeira vez, não paro mais. Podia sair tudo numa mijada só, né? que saco...

Enquanto isso, o Ediléo era quase capaz de ovular de tanta felicidade. Eu, particularmente, fiquei com vergonha de estar com ele. Tudo bem que ele é fã. Mas cantar aos berros, olhando pro artista, e chorar é tão cafona. Fora que o choro dele é tão emblemático quanto à risada.

De repente, os caras saíram do palco:

Adalberto: Ediléo, aproveita esse intervalo e vai tomar uma água. Você precisa se hidratar. Já chorou muito.

Ediléo: Vamos comigo, amorzinho?

Lu: Vamos. Adal, já volto.

Adalberto: Tá.

A merda é que não se tratava de um intervalo. Os caras do Air Supply saíram do palco, porque iam vir por trás, passando pelos fãs e cantando uma música, que eu já me esqueci qual era. Detalhe: um dos dois, que eu nunca sei se é o Graham Russell ou o Russell Hitchcock ficou parado do meu lado! Bati o mais uma foto com outro Iphone alheio.

Quando eles chegaram, o meu Transtorno da Ansiedade Generalizada já estava me matando. Não estava me aguentando de vontade de contar a boa nova pro Ediléo:

Ediléo: Mentira!

Adalberto: Sério. Eu só não te falo qual deles parou do meu lado, porque eu não sei quem é o Graham Russell e quem é o Russell Hitchcock. Pra mim, eles dois são um só. Tipo Sandy e Júnior.

Ediléo: Mas Sandy e Júnior não são um só, seu idiota.

Adalberto: Eu sei. Você que é um idiota sem sorte na vida. Eu já tive duas oportunidades de ficar cara-a-cara com o Air Supply e você, não. Seu azarado!

Ediléo: Azarado é a sua avó.

Adalberto: Realmente. Ela já morreu. Não ia ter a mesma sorte que eu de bater duas fotos com o Air Supply.

Lu: Gente, vamo parar! O show tá rolando. Ediléo, por favor! Você não quis tanto vir?

Nesse segundo embate, a Lu foi um pouquinho menos fofa. Mas o terceiro ainda estava por vir...

Adalberto: Finalmente, esse show acabou. Pô, parecia até que os caras estava na seca de subir num palco. Devem ter cantado todas as músicas da carreira deles.

Ediléo: Vamos embora, Lu.

O Ediléo, além de tudo, é um crianção. Puxou a Lu pro outro lado e nem olhou na minha cara.

Entramos em filas diferentes. Aliás, o Ediléo puxou a Lu pra outra fila, só pra me evitar. a minha fila era bem maior que a deles e eu estava louco pra ir embora daquela merda, mas meu orgulho não me deixou ir pra fila deles. E sabe o que aconteceu? Quando cheguei bem pertinho da saída, e a Lu e o Ediléo já estavam no lá fora há horas me esperando, descobri que a minha fila era maior, porque dava num hallzinho, onde o o Graham Russell e o Russell Hitchcock estavam batendo fotos com os fãs. Caralho, essa foi a melhor pra finalizar a noite. Valeu a espera!

Fiz o carinha que bateu a foto sair comigo pra mostrar o foto pro Ediléo. Ele tirou num Iphone. Pra variar.

Adalberto: Gente, olha isso!

Quando o Ediléo viu a minha foto com o Graham Russell e o Russell Hitchcock me segurando no colo, ele varou o celular do garoto pra longe e foi embora sozinho.

As perdas foram significantes: Lu ficou sem namorado e eu tive que comprar um Iphone novo pro garoto. Mas as lucros foram, imensamente, recompensadores: três fotos lindas com o Air Supply no meu Facebook.

quinta-feira, 17 de março de 2011

O dia em que a realidade não passou de um sonho

Todo mundo que me conhece sabe que eu morro de medo de fantasma e de qualquer coisa, relacionada ao transcendentalismo, mas a Ane não me poupou de conhecer a família assustadora do Faradi no sábado:

Ane: Ele disse que precisava falar com você também.

Adalberto: Mas eu tenho medo dele. Ele é meio estranho, sombrio.

Ane: Adal, acelera esse carro, senão a gente nunca vai chegar na casa dele.

Quem dera se isso fosse possível...

Uma hora e meia depois:

Adalberto: Chegamos. Medo!

Ane: Ai, garoto, para de bobeira.

Adalberto: Para de bobeira... Isso aqui é o fim do mundo. Olha a casa dele! Que coisa mais medonha. Não dá pra ver nem onde é o portão.

Era muito estranha mesmo a casa do Faradi. Toda decorada com plantas mortas. Depois de alguns minuto, tentando decifrar onde ficava o portão, ouvimos uma voz, que, provavelmente, saiu de um recôndito interfone:

Voz: Entrem!

Adalberto: É com a gente isso?

Ane: Cala a boca! Oi. A gente veio falar com o Faradi. Ele tá aí?

Voz: Entrem.

Adalberto: Cagou pro que você falou.

Ane: Cala a boca, Adal! Por favor!

Voz: Entrem!

Ane: Onde que é a porta?

De repente, parte de folhagem se recuou e um vão se abriu.

Voz: Entrem!

Ane: Acho que é por ali. Vamos?

Adalberto: Tô com medo.

Ane: Anda, garoto, vem.

Entrar naquela casa não era um boa ideia, mas ficar do lado de fora sozinho poderia ser ainda pior. Entramos. Conforme íamos pisando, as plantas iam se recuando e abrindo caminho até que chegamos num cômodo que eu não sabia exatamente o que era. Parecia uma copa, se não fosse uma fonte de água cinza, que corria de uma pilastra e seguia para um lugar, que as plantas escondiam. De repente ouvimos uma voz de criança ao longe:

Dariá: Mamãe, mamãe, hoje eu acordei morta.

Gorema: De novo, Dariá?! Você só tem sete anos e já morreu quatro vezes. O mesmo número de vezes que o seu pai, que é bem mais velho do que você. Vou te botar de castigo numa encruzilhada.

Dariá: Não, mamãe! Não, mamãe, por favor. A culpa e da tia Tamanga.

Gorema: A sua tia já morreu há três anos.

Daria: Mas ela puxa meu pé toda noite. Eu fico assustada e... Morro.

Gorema: Vou acender uma vela preta pra sua tia.

Daria: Manda ela pra bem longe, mamãe.

Gorema: Tá bom. Agora, vamos tomar o Felianus homogatus.

Daria: Não quero, mãe. Esse sangue é muito ruim.

E assim, descobri que, daquela fonte de água cinza, não saía água cinza. Aquilo era sangue.

Adalberto: Ouço passos. Acho que elas estão vindo pra cá.

Ane: Fecha essa boca!

Gorema: Olá. Quem são vocês?

Ane: Oi. Eu sou a Ane, namorada do Faradi.

Gorema: Muito prazer, Gorema. Sou irmã dele. Essa aqui é minha filha, Dariá.

Ane: Esse é meu primo, Adalberto.

Acenei de longe. Com medo. Muito medo.

Gorema: Ele já veio falar com vocês?

Ane: Não. Uma voz mandou a gente entrar, mas eu não faço ideia quem era.

Gorema: Ah, é a Voz.

Adalberto: Mas de quem era a voz?

Gorema: Não sei. Essa, o meu irmão arrancou de um morador de rua lá de Minas.

Adalberto: Ah, tá.

Queria chorar de medo. E, pela cara da Ane, ela estava se segurando pra não fazer o mesmo.

A Bruxa Gorema (maneira como eu e Ane passamos a nos referir a ela, depois que esse pesadelo passou) encheu um copo com o tal sangue cinza e deu pra menininha beber. Assustador.

Gorema: Quatro goles. Anda! Ou quer morrer de vez?

A cara de nojo que a menina fazia, enquanto bebia o tal sangue, me dava pena.

Gorema: Agora, vai chamar seu tio. Diz que a namorada e o primo dela já estão aqui pra fazer a conversão.

Ane: Conversão?

Gorema: Ele não falou com vocês?

Adalberto: Não.

Gorema: Parece que vocês também são originários da epécie Felianus homogatus.

Ane: Â?

Gorema: Só precisam fazer a conversão pra adquirir as sete vidas e fazer parte da nossa confraria.

Adalberto: Como assim? Eu sou filho da minha mãe e do meu pai. Não tenho nada a ver com gato.

Ela deu uma risadinha sarcástica. E isso me arrepiou todo.

Gorema: Bom, dá licença. Vou me deitar. Essa noite é o meu plantão no Vale da Morte.

E quando ficamos sozinhos:

Adalberto: Ane, vambora desse lugar agora!

A Ane não teve nem tempo de concordar. Puxei ela pelo braço e corremos para fora daquele lugar. Mas, diferente, do caminho que nos levaria para o portão, as plantas abriram uma trilha, que nos levou até uma floresta cheia de gatos gigantes. Tudo naquele lugar era imenso e nós parecíamos miniaturas.

Ane: Adal, aquele gato gigante tá vindo na nossa direção.

Adalberto: Vamos correr!

Corremos pra dentro de de uma mata. O gato monstruoso chegou bem próximo de nós, mas não conseguiu nos ver. Ele cheirou o local onde nós estávamos, mas, pra nossa sorte, não nos achou e saiu. Ufa!

Adalberto: Vambora daqui!

Ane: Adal!

Adalberto: O quê?

Ane: Meu pé!

Caralho, a planta se mexia e estava segurando a Ane pelo pé.

Ane: Tira esse negócio daqui!

Adalberto: Calma!

A planta maldita despertou em mim uma força, que nem eu sabia que tinha. Consegui arrancar a Ane de primeira.

Adalberto: Agora, vambora daqui.

Ane: Eu tô cansada.

Adalberto: Deixa pra descansar depois. Corre!

Acabamos chamando a atenção de vários gatos gigantes. Eles deviam estar com muita fome, porque se empurravam pra tentar nos alcançar. Algumas plantas ainda tentaram agarrar o pé da Ane, mas nós estávamos tão rápidos que elas não conseguiam prendê-la.

Não sei por quê, mas nenhuma planta ousou a me segurar. Por que será que as plantas não queriam nada comigo?

Bom, depois de mais ou menos uns cinco minutos de corrida, a Ane resolveu falar a maior merda da vida dela.

Ane: Adal, eu não aguento mais. Quero que esse chão se abra pra eu me enterrar aqui.

De repente, o chão onde nós estávamos começou a se abrir e, apesar da nossa tentativa em fugir do buraco, fomos abduzidos. Foi nessa hora que, finalmente, apareceu o Faradi. Ele estava na beira do buraco e ficou assistindo a nossa queda. E rindo. Ele ria muito mesmo.

Caímos dentro de um lugar que parecia não ter fundo. E só tínhamos noção de que estávamos longe da superfície, por que a risada do Faradi foi ficando difícil de ser ouvida. Subitamente, apareceu uma coluna no meio do buraco. Eu fui puxado prum lado e a Ane, pro outro. O desespero só aumentou.

Quando já não tinha mais voz pra gritar, caí sobre minha cama. Estava tão cansado, fraco e tonto que não aguentei levantar. Acabei dormindo e, acho que muitas horas depois, acordei com o telefone tocando:

Ane: Adal, tive um pesadelo horrível com você.

Adalberto: Eu também tive um bizarro com você.

Ane: A gente foi visitar a família de um namorado meu. Conhecemos uma irmã dele, uma bruxa, que dava sangue cinza pra filha beber. Era num lugar estranho, onde as plantas secas abriam caminho, a campainha era a voz roubada de alguém...

Adalberto: Ane, o meu pesadelo também foi assim. A gente fugia prum lugar, que dava numa floresta gigante com gatos enormes. Nos escondemos atrás de uma mata, a planta segurou você pelo pé...

Ane: Caímos num buraco...

Adalberto: Você pediu pro chão se abrir! A culpa foi sua.

Ane: Isso. Uma coluna surgiu no meio do buraco...

Adalberto: Eu caí prum lado e você, pro outro.

Demos uma gruto juntos! Era muita coincidência.

Ane: Adal, será que isso aconteceu de verdade?

Adalberto: Não sei. Tô assustado. Nunca tive o mesmo pesadelo que outra pessoa. Quero voltar a dormir.

Ane: Não! É melhor não dormir mais. Nunca mais!

Adalberto: Tá maluca? E o que eu vou fazer quando stiver cansado?

Ane: Então, me avisa quando você for dormir?

Adalberto: Por quê?

Ane: Pra eu ficar acordada. Pelo menos por esses dias.

Adalberto: Tá. Aviso, sim.

Mó mentira. Não avisei porra nenhuma. Desliguei meu celular, meu telefone de casa e dormi tranquilamente. A Ane deve ter ficado desesperada, tadinha, mas não tem a menor possibilidade de eu ficar ligando pruma pessoa toda hora que eu for dormir. Assim, eu perco até o sono.

Hoje, que eu tô de folga do trabalho, e achava que ia dormir até tarde, fui acordado pela campainha. Com certeza é o zelador, querendo que eu tire o carro da minha vaga, porque vão cortar uma árvore ou limpar alguma parte externa do prédio.

Quando abri a porta:

Adalberto: Ane!

Ane: Oi, Adal. Esse aqui é o Faradi. Amor, esse é o furão, que não quis ir comigo na sua casa no sábado.

Faradi: Não tem problema, a gente touxe uma bebida gostosa pra você experimentar. Foi minha irmã que mandou.

Adalberto: É cinza?

Ane: Que cinza? á maluco, garoto?

Estava! Acho que estava, sim. Só podia estar. Não sabia mais o que era sonho ou realidade. A Ane me confundiu totalmente. Será que não era ela no telefone comigo, quando eu acordei? Será que eu acordei? E aquele lugar esquisito? E a Bruxa Gorema? Aqueles gatos gigantes?

Precisava dormir. Não! Dormir, não! Nunca mais!

Adalberto: Olha, eu vou ao psiquiatra! Tô precisando. Vocês podem ficar aqui. Tem pão de queijo no congelador e Guaraná Antarctica Zero na geladeira. Fiquem à vontade. Tchau!

quinta-feira, 10 de março de 2011

Elas são o samba!

Passei o carnaval em casa, sem o menor saco pra sair. Vi vários filmes, comi todas as besteiras semiprontas mega engordativas e tomei não sei quantos litros de cerveja. O mais próximo de carnaval que eu fiz foi assistir ao desfile da Vila Isabel pra ver a Gisele Bündchen, que eu jamais consegui enxergar no meio da multidão; a Unidos da Tijuca, que sempre surpreende; a Portela, que é a escola do coração da minha mãe, torcendo pra que ela surpreendesse e deixasse de ser essa escola insossa; e a Beija-Flor, por causa do Rei.

E por incrível que pareça, o carnaval das minhas primas teve algo em comum com cada uma dessas agremiações. Marcamos um almoço, ontem, lá em casa pra assistirmos juntos a apuração:

Marjorie: Adal, lasanha da Sadia é brincadeira...

Adalberto: Ai, gente, sobrou do carnaval.

Ane: Então, a gente vai comer o resto do seu carnaval, é isso?

Adalberto: Não. Vocês vão comer o que eu tenho em casa. Não ia gastar dinheiro com comida se eu tenho em casa.

Lu: Mas lasanha semipronta não é comida. É bate-entope.

Sara: Se você avisasse, eu trazia alguma coisa lá de casa pra fazer aqui.

Adalberto: Ai, gente, vocês não vieram aqui casa pra me contar como foi o carnaval de vocês? Eu já tô fazendo muito em oferecer comida.

Marjorie: Ah, seu cachorro.

Adalberto: Cachorro é o estilista que inventou de te levar pra Semana de Moda de Paris.

Marjorie: Ai, nem me fala. Eu no meio das bibas e o carnaval aqui comendo à solta.

Ane: Mas lá não tem carnaval?

Marjorie: Tem mas nem se compara com o daqui, né?

Sara: E aí? Você fez o que?

Marjorie: Fiquei vendo modelo passando pra lá e pra cá. Fui fazer pesquisa pruma coleção de bolsas que o Lupe Glow quer lançar.

Adalberto: Mas foi legal pelo menos?

Marjorie: Estar em Paris é sempre fenomenal. Mas, dessa vez, eu fiquei tanto tempo, que enjoou.

Bem parecido com desfile da Vila. Acho a Gisele Bündchen um fenômeno. Mas prefiro ela nas passarelas de moda, em que os desfiles não duram nem dez minutos e ela faz, no máximo, duas ou três aparições. Overdose de Gisele no carnaval, com aquelas câmeras da Globo, que vão e voltam ad nauseam, deu uma cansada na imagem da bonitona. Pelo menos, pra mim.

Lu: Eu me mataria se eu tivesse que ir pra Paris no carnaval.

Ane: Ah, eu acho que ia gostar. É uma experiência diferente.

Sara: Também acho.

Lu: Mas experiência diferente em época de carnaval também tem seus limites. E eu já vivi a minha nesse.

Marjorie: Ai, meu Deus!

Adalberto: Carnaval na Bahia é lindo, maravilhoso, mas não tem mais o que surpreender. A única novidade é a rivalidade entre os fãs da Ivete e da Claudia Leitte, motivada pela Guerra Fria entre elas.

Lu: Então, tem outra novidade no carnaval da Bahia, que nem eu sabia.

Ane: Qual?

Lu: O bibeísmo anda a solta por lá.

Marjorie: Mentira. Sifudeu também, prima?

Lu: Não. Quando eu vi que nenhum homem olhava pra mim... Eu com um short que mostrava metade da minha bunda...

Marjorie: Ficou arrasada?

Lu: Não. Fiquei arrasada quando aqueles homens lindos começaram a se beijar.

Sara: E aí?

Lu: Aí, que o álcool é a bebida que faz milagres. Depois que todo mundo fica na mão do palhaço, cu de bêbado não tem dono. Saí pegando as bibas todas.

Ane: Jura?

Lu: Com direito à cópula e tudo.

Marjorie: Adoro cópula. Queria muito ter copulado em Paris, mas isso jamais aconteceu.

Lu: Garota, as bibas me surpreenderam. Fizemos coisas do arco da velha, como diz a tia Neide.

Como a Unidos da Tijuca, que inova a cada desfila, fazendo coisas do arco da velha com tecnologia e criatividade. Os desfiles do Paulo Barros sempre me surpreendem.

Ane: Eu também copulei.

Marjorie: Copulou, prima? E aí?

Ane: Nada demais.

Lu: Como assim nada demais? Querida, você foi pro Pernambuco. Tem que ter dado, no mínimo, prum boneco de Olinda.

Sara: Coragem!

Marjorie: Acho digno.

Ane: Também acho, mas eu fui pra casa do Amadeu. Fiquei com ele lá. Saímos. Fomos pra alguns bloquinhos, mas nada demais. Não foi ruim, mas não foi maravilhoso. Pelo menos, não gastei dinheiro.

Igualzinho à Portela. Fez um carnaval mais ou menos e, pelo visto, sem grandes investimentos orçamentários. Bem basicão mesmo.

Sara: Também não fiz nada demais. Grávida não tem muito pra onde correr.

Marjorie: Como assim, prima? Gravidez não é doença.

Ane: Já falei isso pra ela.

Adalberto: Esqueceu que, na gestação do Diego, minha irmã fazia aula de jump?

Lu: Aí também já acho demais. Camila gosta de desafiar o perigo.

Marjorie: Gente, mas a médica dela deixava. Se o médico deixa, não vejo exagero nenhum.

Adalberto: Eu também, não. Mas era o meu sobrinho naquela barriga pulando. Confesso que eu ficava tenso.

Sara: Eu não queria expor os meus bebês. Eu tô com três na barriga. É mais complicado. Não é um só.

Ane: Aí, você ficou em casa?

Sara: Não. Na mãe do Oswaldo. Foi a maior merda que eu fiz.

Adalberto: Por que, prima?

Sara: Ela defende o Oswaldo em tudo. Ele falava que ia sair, eu dizia que não, mas ela mandava ele ir. Na minha frente! Dizia que ele não casou pra ficar enclausurado dentro de casa.

Lu: Sua louca! Eu te liguei no domingo e você já estava em casa...

Sara: Porque eu voltei antes. Não ia agüentar ficar mais um dia com aquela velha maluca.

Marjorie: O Oswaldo ficou lá?

Sara: Tá maluca? Fiz ele voltar comigo.

Adalberto: O Oswaldo é bem tranqüilo.

Sara: Tranquilo, nada, primo. O homem não quis ficar?

Ane: Mentira.

Sara: Ah, eu tive que fazer a louca e quebrar uma meia-dúzia de enfeite cafona na casa da mãe dele pra fazer ele vir comigo.

Lu: E a velha? Deu na tua cara?

Sara: Ela não é maluca. Eu tô esperando três netos do filhinho querido dela, esqueceu?

Adalberto: Mas já ta tudo bem com vocês, Sarita?

Sara: Claro. Ai dele se ficar de mal comigo. A velha pode ser mãe dele, mas a mulher que atura, que faz comida, que lava, passa pra ele sou eu. E, no fim das contas, ele dá razão pra mim.

Bem no do carnaval da Beija-Flor deste ano. Cheio de emoções.

Marjorie: E você primo, ficou em casa só vendo filme mesmo?

Adalberto: Só. Acho que tô velho. Não tirei os pés de casa. Vocês são as primeiras pessoas que eu vejo nesse feriadão.

Lu: Tu é maluco, garoto. Em vez de sair, aproveitar...

Ane: É. Ver gente.

Marjorie: Pelo menos pra sair um pouco de dentro de casa, ia fazer compras, sei lá.

Adalberto: Caminhar na orla.

Adalberto: Estava com preguiça. Muita preguiça.

Marjorie: Primo, essa sua carinha não me engana. Duvido que você não fez nada.

Tem coisas que eu fiz que não vale a pena contar. E eu sou como o resultado da apuração do carnaval: imprevisível.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Lu caga no pau num dia em que todo mundo estava sem freio

No fim de semana passado, eu Ane, Marjorie, Lu e Sara fomos para o sítio de uma amiga da Lu, em Itaguaí. O Oswaldo estava viajando a trabalho e a Sara foi a viagem toda reclamando:

Sara: Acho um absurdo a empresa mandar um funcionário viajar com a mulher grávida em casa.

Marjorie: Prima, eles nem pensaram nisso.

Adalberto: É. Não é nada pessoal.

Sara: É, mas eles deviam pensar. Deviam pensar, sim. Eu, hein... Vê se pode uma coisa dessas.

Lu: Adal, para o carro. Quero comprar biscoito polvilho.

Essa devia ser a milésima vez que eu parava o carro pra comprar besteira de beira de estrada. Teve bananada, pipoca de saco rosa (que eu amo!), goiabada, sorvete, docinho, casquinha, pele...

Adalberto: Porra, eu vou chegar com obesidade mórbida nesse sítio. Não vou nem poder enrar na piscina.

Ane: É só você não comer.

Lu: É bom que sobra mais pra gente.

Sara: Eu não aguento comer mais nada. Já comi muita besteira.

Marjorie: Eu queria uma maçãzinha, primo. Será que não rola?

Adalberto: Se você vir algum vendedor, me fala que eu par o carro.

Marjorie: Tá.

A uns cinco quarteirões do sítio, já dentro da cidade de Itaguaí, a Marjorie viu um vendedor de maçã:

Marjorie: Primo, para aqui. Tem um vendedor de fruta ali na frente.

Adalberto: Eu não paro mais em lugar nenhum. Tô com uma dor de barriga aqui, que é mais forte do que eu.

Lu: Ah, garoto, para aqui rapidinho.

Adalberto: Não. Vocês podem vir andando. É pertinho. Olha, é melhor vocês não pedirem pra eu parar, não, hein. Ou a merda vai feder aqui nesse carro.

Sara: Então, não para, primo.

Ane: Vai na fé.

Lu: Eu também tô com dor de barriga. Mas, diferente do Flamengo, eu tô com freio.

Adalberto: Eu tô sem freio; quase me cagando aqui.

Ane: Ai, que cheiro podre é esse?

Adalberto: Um indício da minha grade necessidade.

Ou seja, eu peidei.

Marjorie: Corre, Adal, pelamordedeus!

Ane: Gente, não tô conseguindo respirar.

A Lu ainda demorou uns dois minutos para tirar a chave da bolsa, o que me deixou apreensivo:

Adalberto: Gente, eu tô achando que as Olimpíadas de 2016 vão acontecer antes da Lu enconrar a chave desse portão.

Marjorie: Pior é que, agora, também tô sentidno vontade de ir ao banheiro.

Ane: Eu também.

Sara: Eu também.

Lu: Achei!

Fui correndo tão rápido pro banheiro, que qualquer Claudinei Quirino perdia fácil pra mim nessa disputa. Quando acabei, fui dar a notícia desagradável:

Adalberto: Gente, o banheiro tá sem água. Ninguém entra lá, por favor.

Marjorie: Como assim? Eu também tô aqui no desespero já.

Adalberto: Bom, quem avisa amigo é.

Sara: Primo, eu também preciso muito ir a banheiro. Esqueceu que eu como por quatro agora?

Marjorie: Quatro?

Sara: Eu e mais três, ué.

Marjorie: Ah...

Ane: Eu também não tô me aguentando.

Lu: Eu ainda consigo segurar um pouco.

Adalberto: Meninas, fiquem à vontade. Eu fiz a minha parte.

Marjorie: Putz, e fez muito mal a sua parte, hein, primo. Gente, o banheiro tá interditado. Não tem a menor condição da gente entrar lá. O Adal cagou no pau.

Adalberto: No pau, não. Caguei no vaso mesmo.

Ane: Gente, que furada esse nossa vinda pra cá, hein.

Marjorie: Lu, a sua amiga não falou nada, que aqui costuma faltar água?

Lu: Não, gente. Ela emprestou a chave da casa, o que já é muito, né?

Adalberto: Ficar numa casa sem banheiro é a mesma coisa que ficar debaixo da ponte.

Sara: Também acho.

Ane: Gente, banheiro é umas das coisas mais importantes de uma casa.

Marjorie: Lu, você devia ter visto isso.

Lu: Gente, se vocês não estão satisfeitos, pode ir embora.

Marjorie: Tá bom. Vamobora, Adal?

Adalberto: Como assim?

Ane: A gente precisa cagar. Não dá pra ficar aqui.

Adalberto: Lu, você vai com a gente?

Lu: Não. Mas pode ir. Eu pego um ônibus.

Adalberto: Ah, não. Você veio com a gente, vai voltar com a gente.

Marjorie: Adal, eu concordo com você. Mas dentro de uma situação normal. O problema é que, aqui, tá todo mundo sem freio.

Lu: Menos eu.

Ane: Então, tchau, meu bem.

Lu: Tchau, ué. Ainda não foram.

Adalberto: Você vai ficar chateada comigo?

Lu: Claro que não. Chateada é pouco. Eu tô é puta com você e com essas lambisgoias, que fizeram eu me despencar do Rio pra cá e vão embora, assim, por besteira. Eu podia ter trazido outras pessoas, tá? Mas, não, escolhi vocês. Uma burra que eu sou.

Sara: Lu, a gente não tá indo embora por besteira.

Adalberto: Claro que estão. Bananada, goiabada, sorvete, pipoca de saco rosa e biscoito de polvilho são o quê? Besteira, ué.

Marjorie: Adal, cala a boca.

Eu obedeci. Uma mulher nervosa e com dor de barriga é pior do que mulher de bigode.

Paramos num sítio vizinho pra implorar, pelo menos, pra Sara, que tá grávida, um banheiro. O lugar não poderia ter sido melhor. Parece que foi escolhido a dedo. Estava tendo um churrasco de formatura de Medicina de uma faculdade, que eu já me esqueci o nome.

Bebemos, comemos, cagamos, dançamos, tomamos banho de piscina, rimos, cagamos mais, dormimos... Ah, foi muito bom.

Horas depois, lembramos de ligar pra Lu. Coitada. devia estar passando mó aperto lá no sítio fedido e sem água.

Adalberto: Amore, a gente veio parar aqui no sítio ao lado. Tá rolando mó festa aqui. Vem pra cá.

Lu: Vou, não, primo. Brigada.

A voz dela estava muito boa. A Lu negando ir a um churrasco, cheio de gente... Achei estranho. Mas já estava tão bêbado que não pude dar maior importância ao caso.

A gente acabou ficando o sábado inteiro por lá mesmo e só voltamos pra casa no domingo, depois do almoço. Tentamos ligar pra Lu, mas o celular dela estava fora da área. Fomos ao sítio em que ela estava, mas parecia não ter ninguém.

Ane: Ela, com certeza, foi embora ontem mesmo. A Lu é orgulhosa, Adal. Ela não ia contar pra gente esse fracasso.

Realmente, não. Até porque, de fracasso, não teve nada.

Na segunda, quando consegui falar com ela, fiquei sabendo de tudo:

Lu: O número da casa estava meio apagado na chave. Eu ache que era 37, mas era 87.

Adalberto: Não acredito. E como você descobriu?

Lu: Fui pro meio da rua pra saber se a falta d'água era geral ou se era só lá no sítio.

Adalberto: E aí você descobriu que estava no sítio errado.

Lu: Por um Deus grego, o Indiomar.

Adalberto: Sério? E aí?

Lu: Passamos o fim de semana inteiro juntos. O sítio da minha amiga é uma maravilha. Tem tudo o que você pode imaginar. Até tirolesa tinha. Amei. Aproveitei pra fazer minha lua-de-mel. Agora, só falta casar.

Adalberto: E a gente lá no churrasco de uns formandos de Medicina, achando que você estava passando o maior perrengue...

Lu: Tadinhos. Enquantos vocês se esbaldavam com a carne dos médicos, o Indiomar brincava de médico com a MINHA carne.

Adalberto: Ah, sua vaquinha!

Lu: Viu que, comigo, não tem erro, né?

É... Essa, sim, cagou no pau. E sem freio.