quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Sara faz a escolha de Sofia no Natal mas, no fim, tudo acaba bem

Esse ano, o Oswaldo bateu o pé e fez a Sara levar os trigêmeos para passar o Natal na casa dos pais dele.  A Sara nunca passou a data nos sogros e estava odiando a ideia. Eu e as outras primas iríamos passar com os meus pais, estava tudo certo. Até a Sara aparecer no dia 24, em cima da hora, com uma chantagem emocional.

Sara: Vocês vão ter a coragem de me deixar sozinha nessa?

Marjorie: Lógico.

Lu: Fui eu que casei com o Oswaldo?

Ane: Você sabe que a gente não tem a menor afinidade com aquela gente.

Sara: Adal, só você pode me ajudar. Vamos comigo?

Adalberto: Sarita, eu já combinei com as meninas de passar na casa dos meus pais. Se elas toparem ir para a casa dos pais do Oswaldo, eu até vou também. Mas sozinho eu não vou, não.

Sara: Vamos não vai estar sozinho. Vai estar comigo.

Adalberto: Você não conta. Você é, praticamente, da família.

Sara: Beleza, então. Já que ninguém vai comigo, eu também não vou. E digo mais: estou me separando do Oswaldo, vou largar as crianças com os meus sogros e vou morar em Nova York.

Marjorie: Conta outra, Sara.

Ane: Você não vai ter coragem de fazer uma coisa dessas.

Lu: Eu duvido.

Sara: Duvida? Pois não duvide de mim, meu bem. 

Adalberto: Sara, isso não é verdade, a gente sabe.

Sara: Não? Então, tudo bem. Eu vou ligar agora para o Oswaldo e dizer que não vou à casa dos pais dele, que decidi, de última hora, ficar por aqui e que é para ele arrumar as crianças e ir para lá. 

Ane: Como assim?

Sara: Ele vai ficar fulo da vida comigo, vai falar meia-dúzia de grosserias, eu vou responder com paus e pedras, ele vai dizer que quer o divórcio, como ele faz sempre que a gente briga, eu vou aceitar e, na semana que vem, embarco para Nova York.

Lu: Beleza. O problema teu.

Marjorie: Sarita, faz o que você achar melhor.

Sara: Claro. O chato é que vai ficar ruim para vocês de ver os trigêmeos na casa dos meus sogros, né? É porque o Oswaldo trabalha, então, eles vão ficar lá. E se vocês não podem passar o Natal lá, que é uma data em que as pessoas se toleram mais um pouco, imagina visitar as crianças numa outra data qualquer...

Que chantagista! Pior é que a gente cedeu. Não passava pelas nossas cabeças ficar sem ver os nossos afilhados.

Fomos para a casa dos pais do Oswaldo e ainda levamos meu pai, minha mãe, minha irmã, meu cunhado e meu sobrinho.

Marjorie: Adal.

Adalberto: Oi.

Marjorie: Viu a cara de nojo que a mãe do Oswaldo fez, quando a gente chegou?

Adalberto: Vi mas fingi que não vi.

Ane: O pai dele nem é má pessoa. Só cai no meu conceito por deixar ser manipulado pela megera da mulher.

Lu: Merece levar na cara para acordar para a vida.

Adalberto: Quem? Ele ou ela?

Lu: Ele. Mas ela também.

Ane: Ela merece levar uma surra bem dada para vê se para de fazer aquela cara de bunda e passa a fazer cara de dor.

Marjorie: Sentindo dor ela ia ficar mais bonita.

Adalberto: Mudando de pau para cacete, meu pai está irado porque não vai se vestir de Papai Noel esse ano. Ele gosta, né?

Lu: Coitadinho do tio Beto.

Adalberto: É. Ele só gosta do Natal, por causa desse momento. Um tio do Oswaldo vai se vestir. 

Marjorie: Ele trouxe a fantasia dele?

Adalberto: Está lá no carro.

Ane: Não pode ter dois?

Adalberto: Claro que não. O Diego sabe que Papai Noel só existem um. Se aparecem dois, ele vai desconfiar. Os filhos da Sara, não, porque só tem um aninho, mas o Diego já tem cinco, é mais esperto.

Marjorie: Fala para o tio Beto ver o lado positivo dessa situação. Pela primeira vez, ele vai ver o neto recebendo os presentes do Papai Noel.

Adalberto: Não adianta. Ele prefere ser o Papai Noel.

Papo vai, papo vem e fomos surpreendidos por um bandido, que invadiu a casa dos sogros da Sara.

Bandido: Todo mundo com a mão para cima e sem fazer barulho. Tem criança nessa casa?

Sara: Tem. Mas estão todas dormindo num quarto.

Bandido: Melhor assim. Detesto criança. Grita muito. Passa tudo o que vocês têm de valor.

Passamos nossos celulares, dinheiro, jóias e... A roupa de Papai Noel do tio do Oswaldo.

Bandido: Ouvi barulho de carro de polícia. Vou descer fantasiado de Papai Noel com uma criança no colo. Me dá a mais quieta de todas. Se eu sentir qualquer suspeita, eu mato. Anda, pega uma criança, antes que eu mate vocês aqui.

Como o Diego estava brincando na casa do vizinho, a Sara teve que decidir entre um de seus filhos. Parecia "A escolha de Sofia". Não conseguimos identificar a criança que ela entregou, porque estava toda enrolada numa manta. 

O bandido saiu com a criança no colo, despistou os policiais, deixou o trigêmeo ainda incógnito para nós com uma vizinha e saiu cantando pneu.

Os policiais desconfiaram e foram atrás.

Sara: gente, eu vou lá embaixo buscar a boneca da Liana.

Adalberto: Ué, você não entregou um dos seus filhos?

Sara: Claro que não. Está maluco?

E veio até o meu ouvido cochichar um comentário maldoso.

Sara: Se fosse para entregar alguém para o bandido, não seria um filho meu. Seriam os meus sogros. Deixa eu ir lá pegar a boneca da Liana. Ela só dorme agarrada com essa boneca.

Meu pai desceu com a Sara. Mas ele foi pegar outra coisa.

Nesse ínterim, um vizinho bateu à porta. Ficamos assustados com a força com que ele esmurrava, mas, finalmente, era por uma boa notícia.

Vizinho: Os policiais conseguiram pegar o bandido numa rua sem saída. Ele já está na delegacia daqui do bairro e deve ser levado para um presídio amanhã.

Lu: Eu vou lá agora arrebentar a cara desse covarde!

Adalberto: Você não vai a lugar nenhum. Quieta!  

Lu: Me solta, Adal! Eu vou matar aquele cretino. Eu quero matar aquele bandido!

A Lu caiu em prantos.

Marjorie: Gente, pega uma água com açúcar para ela. Vocês não estão vendo que ela não está bem? Está nervosa.

Uma meia-hora depois, quando a poeira havia baixado e a Sara já estava de volta, meu pai nos surpreendeu, entrando na sala vestido de Papai Noel. Isso emocionou a todos os corações ainda semi-aflitos.

Adalberto (pai): Ho, ho, ho! Feliz Natal, família que eu amo. Ho, ho, ho!

Como todo ano, ele deu presentes para o Diego, para os trigêmeos, para mim , para a minha mãe, para a minha irmã, para o meu cunhado, para a Ane, para a Lu e para a Marjorie. Na vez da Sara, além de entregar o presente, ele falou baixinho no ouvido dela.

 Adalberto (pai): Você mostrou que é muito corajosa. O titio está muito orgulhoso de você. Mas, no ano que vem, por favor, não vamos inovar. O Natal vai ser lá em casa, como sempre foi. Te amo.

Falou e disse! Esse Papai Noel é o cara.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Calendário Maia falha e ninguém vai com Deus

Como o mundo não acabou no dia 21 de dezembro, segundo previa o calendário Maia, eu me acabei com a minha família, no sábado, na quadra da Mangueira. Mas enquanto ainda não tínhamos certeza sobre o nosso dia de amanhã, tentamos viver tudo o que havia para viver no dia 20, que começou com uma ligação da Sara.

Sara: Estava dormindo?

Adalberto: Ainda estou.

Sara: Como assim? Amanhã o mundo vai acabar e você está dormindo? Deixa para dormir depois que morrer.

Até que ela não estava errada.

Adalberto: Eu vou tomar banho, então, e vou lá pular de asa delta.

Sara: Você é louco. Morre de medo de altura e vai pular mesmo de asa delta, garoto?

Adalberto: É uma maneira de eu tentar superar um dos meus limites.

Sara: No seu último dia de vida, Adal? Não era melhor fazer uma coisa que te deixasse mais feliz, sem medo.

Adalberto: Era. Mas aí ia parecer um fim de semana. Eu quero ousar no meu último dia.

Sara: Então, beleza. Eu vou com os trigêmeos e o Oswaldo agora para um parquinho aqui perto de casa. Quero que eles morram se divertindo.

É horrível o que eu vou dizer, mas eu achei isso lindo da parte dela.

Sara: Não quer mesmo vir com a gente?

Adalberto: Não, Sarita, obrigado. Detesto clima de despedida. Vou ligar para as meninas rapidinho, tomar banho e sair. Beijo.

E, antes que ela se despedisse de mim, lembrei de falar uma coisa, até então, jamais dita por mim.

Adalberto: Fica com Deus.

Sara: Obrigada, primo. Mas o mais sensato, agora, é dizer: "vai com Deus", né?

Adalberto: Verdade. Vai com Deus. Nos vemos lá.

Falei "lá" porque não sabia para onde eu iria e, ainda que eu não fosse para o mesmo lugar que a Sara, o que eu acho muito improvável, eu esperava conseguir vê-la em algum lugar.

Sara: Com certeza, primo. Nos vemos no céu.

Fiquei calado para não falar merda à beira da minha morte.

Sara: Um beijo.

Adalberto: Outro.

Liguei para a Marjorie.

Marjorie: Oi, primo.

Adalberto: E aí? Preparada?

Marjorie: Nada, garoto! acredita que eu não pensei em roupa?

Adalberto: Não. Você é estilista, esqueceu?

Marjorie: Garoto, casa de ferreiro, espeto de pau. Vou ao shopping gastar todo o meu dinheiro, comprar tudo o que eu puder, até lotar o meu carro, e depois eu vou ficar brincando de experimentar peça a peça aqui em casa. Vou fotografar tudo e colocar no Facebook. Vocês reclamam que eu não posto nada no Facebook... Preparem-se! Vou postar umas combinações esdrúxulas. Não tenho mais nada a perder mesmo, além da vida...

Adalberto: Mas vai morrer cafona?

Marjorie: Claro que não. Vou comprar alguma coisa arrasadora para morrer. Mas, até lá, vou ficar brincando de combinar coisas nada a ver.

Adalberto: Legal. Vai ser engraçado ver você cafona. Assim que você postar me avisa. Quero muito ver isso antes de morrer.

Marjorie: O Bruno que perdeu com isso, né?

Adalberto: Você não vai mais ter uma última noite com ele?

Marjorie: Com que tempo? Não vai dar. Fora que ele não merece, Adal. Nunca me deu valor.

Adalberto: Eu sei que não, mas ia ser uma história legal. Ele foi o seu primeiro e ia ser o seu último homem.

Marjorie: Pois é, ia. Mas eu vou terminar fazendo o que eu amo: inventando moda.

Adalberto: Está certa. Deixa eu ir lá. Falta falar com a Ane e a Lu. Ih, tem alguém me ligando... Ó, foi só falar nelas. É a Ane. Deixa eu atender, amore.

Marjorie: Vai lá, primo. Beijo.

Adalberto: Beijo. E olha: vai com Deus, prima.

Marjorie: Ah, até parece...

Essa ia para o mesmo lugar que eu.

Adalberto: Alô, Anita!

Ane: Meu primo que eu amo!

Adalberto: Fala, gata garota! Como estão os preparativos?

Ane: Adal, vem para cá agora brincar de Carrinho Bate-Bate!

Adalberto: Como assim?

Ane: Esqueceu que o meu pai é dono de uma agência de aluguel de carros, baby?

Adalberto: Não. Ele pode te demitir por isso, sabia?

Ane: É para rir? A gente vai morrer!

Adalberto: Eu sei. Mas ninguém merece tomar um esporro do pai um dia antes de morrer.

Ane: Não estou nem aí.

Adalberto: Você e a Lu não iam se casar para evitar de morrer solteiras?

Ane: Íamos mas ela decidiu comemorar o seu The End Day de uma outra maneira.

Adalberto: Ai, meu Deus, qual?

Ane: Não é nada que ela não costuma fazer sempre, mas deixa ela te contar. Ela pediu para eu não te falar.

Adalberto: Tudo bem.

Ane: Você vai vir aqui brincar de Carrinho Bate-Bate depois?

Adalberto: Olha, não vou te garantir. Queria pular de asa delta e, depois, ficar contemplando a natureza até a hora de morrer. Isso se eu não morrer, quando eu olhar para baixo lá do alto.

Ane: Beleza. Vou ficar em casa comendo todos os chocolates que eu não comi o ano todo, por causa de minha dieta eterna. E, se você chegar, a gente brinca de Carrinho Bate-Bate. Se não, boa sorte na tua passagem, primo. Foi muito bom te conhecer.

Senti vontade de chorar. Mas preferi desligar antes de abrir o berreiro.

Adalberto: Amore, eu tenho que ir. Fica com Deus.

Tive o ímpeto de colocar um CD da Whitney Houston e me debulhar no choro. Mas decidi evitar o drama no meu último dia de vida. Coloquei um CD do Sepultura e me acabei de dançar. Destruí o meu sofá de tanto que pulei em cima dele. Me estabaquei no chão, bati com a cabeça, achei que fosse morrer antes da hora e resolvi que era melhor ligar logo para a Lu.

Lu: Que voz é essa, Adal?

Adalberto: Acabei de bater com a cabeça no chão. Estou zonzo.

Lu: Aprontando em casa?

Adalberto: Não. Só estava pulando de um sofá para o outro, ouvindo um CD do Sepultura.

Lu: Você é doido. Eu estou aqui com o Ademárcio e o Zeferino.

Adalberto: Você de A a Z só pensa em homem, né, Luluzita?

Lu: Ai, primo. Esse é o meu vício.

Adalberto: Eles não são os irmãos que se odeiam? Fizeram as pazes?

Lu: Não. Eles fizeram uma aposta. Quem perder morre.

Adalberto: Como assim?

Lu: Não posso entrar em detalhes com você, Adal. Eles estão entrando aqui no quarto agora. Depois, eu te conto.

Adalberto: Depois quando? A gente vai morrer. Lu, uma coisa: você está incentivando mesmo um assassinato? Isso é crime!

Lu: Adal, o que é um crime no dia que o mundo vai acabar?

Adalberto: Lu, um crime é um crime.

Lu: Então, está bem. Muito obrigado pela sua explicação. Agora, deixa eu ir lá, porque a disputa vai começar. Tchau.

Adalberto: Tchau, sua maluca! Vai com Deus!

Lu: Vou, sim! Vou com quem me levar, meu amor. Beijo!

Fui pular de asa delta irado com a Lu. Como pode ser tão inconsequente até no dia de morrer? Enfim, descobri que o meu medo de altura era só uma coisa de que eu me convencia de que tinha, mas que na verdade eu nunca tive. Adorei pular de asa delta. Quero, agora, pular de parapente, paraquedas e de qualquer outra coisa que exista e eu não sei.

Fiquei tão feliz em saber que eu não tinha medo de altura, que precisava contar a novidade para alguém. Fui, então, para a casa da Ane, com o pretexto de que ia brincar de Carrinho Bate-Bate.

Ane: Adal, que bom que você veio! Eu já ia explodir de tanto chocolate que comi.

Adalberto: Eu não podia deixar de vir. E tenho uma coisa para te falar.

Ane: Conta.

Adalberto: Eu adorei pular de asa delta e descobri que não tenho medo de altura! Era tudo drama, prima!

Ane: E você fala isso rindo? Agora, é tarde.

Adalberto: Antes tarde do que nunca. Pelo menos eu provei do gostinho de ficar a 50 metros do chão e não me cagar todo.

Ane: Quem bom, primo! Mas, agora, vamos brincar.

Brincar de Carrinho Bate-Bate, realmente, é uma experiência incrível. Melhor ainda foi que o mundo não acabou à meia-noite em ponto, então, ficamos brincado até a hora do Juízo Final. Foram-se passando as horas, a Marjorie chegou, depois a Sara com a família, e, por fim, a Lu com os dois irmãos.

Adalberto: Ué, o que aconteceu?

Lu: Deu empate. Depois te conto.

Meu pai, minha mãe, minha irmã, meu cunhado e meu sobrinho também chegaram a tempo de brincar de Carrinho Bate-Bate, antes do mundo acabar. A brincadeira estava tão gostosa, que quando nos demos conta de que não havia mais nenhum carro inteiro, já era meia-noite e três do dia 22 de dezembro.

Adalberto: Gente, para tudo! Já é meia-noite e três do dia 22 de dezembro! O mundo não acabou! Urru!

Todos: Eeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeehhhhhhhhh!

Marjorie: Gente, gente! Não se esqueçam que estamos em horário de verão. Ou seja, ainda temos mais 57 minutos até o dia 22.

A cara de decepção de todos foi imediata. Eu, para ser sincero, ainda senti ódio da Marjorie.

Fomos para o apartamento da Ane, que fica na mesma rua da locadora de carros do pai dela. O clima era de funeral. Todos sentados na sala, esperando a morte. Por sorte, os trigêmeos e o meu sobrinho Diego estavam dormindo. Eles nunca iam acordar. Mas acordaram! À uma e um, meu pai estava batendo com colher em panela e cantando todos os clássicos do samba, que eu cresci ouvindo. A empolgação era tanta, que parecia que estávamos numa quadra de escola de samba. E isso me deu uma ótima ideia.

Adalberto: Que tal irmos para a Mangueira?

Lu: Eu topo ver a Mangueira entrar.

Marjorie: Também estou dentro.

Ane: Eu sou a Mangueira, primo! Estou ferrada com o meu pai, mas é óbvio que eu vou com vocês. Segunda-feira, eu tomo esporro pelos carros batidos.

Adalberto (pai): Não pensa nisso agora, minha filha. A gente dá um jeito. Na vida, tudo tem um jeito. Só não tem jeito para a morte.

Marjorie: Então, já que ninguém morreu e o mundo não acabou, vamos com a gente, tio?

Neide: Não, minha filha, obrigada. vai com Deus.

Adalberto: Como assim, "vai com Deus"? Ninguém vai com Deus, mãe. O mundo não acabou e vocês vão, sim, comigo para o samba. Sem desculpas!

Adalberto (pai): Vamos, sim, claro!

Neide: Vamos todo mundo, então! As crianças também.

Lu: Lógico, tia! Os meus gatinhos de A a Z também vão.

E fomos todos. E demos de cara com a parede. Não tinha ninguém na Mangueira. A programação dos ensaios não previa que o mundo não ia acabar. Para a sorte da Viviane Araújo, Gracyanne Barbosa e todas as outras rainhas de bateria, que viram celebridade nessa época do ano, haverá Carnaval em 2013.

Mas a minha felicidade e da minha família não podia esperar até fevereiro. Ela era tão grande, que ultrapassava o portão fechado, que impedia a nossa entrada. Para não perder a viagem, arrombamos a fechadura, entramos na quadra e fizemos a festa. Nunca me diverti tanto na vida...

Quando é mesmo a próxima previsão de fim do mundo?

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Busca por açaí branco acaba em gerundismo

Ontem, eu passei parte da minha tarde caminhando pela Zona Sul com a Marjorie, procurando uma loja de sucos que vende açaí branco, que, segundo ela, vai ser a sensação desse verão.

Marjorie: Eu li no jornal. Vai ser a nova moda do verão.

Adalberto: Mas será que isso é bom?

Marjorie: Parece que tem o mesmo sabor do açaí tradicional. Só que não mancha a boca.

Adalberto: Ah, Jojô, na boa, eu não me incomodo de manchar a minha boca, não. Aliás, eu prefiro manchar a minha boca, do que ter que andar mais um metro, atrás desse lugar que a gente nunca acha. Estou cansado.

Marjorie: Ah, Adal, não começa. Você reclama que eu nunca tenho tempo para fazer as coisas com você e, quando eu tenho, você também reclama.

Adalberto: Mas eu não estou reclamando do tempo que a gente tem. Mas do mau uso que a gente está fazendo dele. Bem melhor parar por aqui, tomar um açaí que mancha a boca mesmo e jogar conversa fora.

Marjorie: Está bem, seu chato. Vamos só até a loja de sucos da próxima esquina, então. Se não for lá, a gente termina a nossa saga e toma um açaí tradicional mesmo.

Adalberto: Combinado.

E faltando, mais ou menos, uns cinco passos para chegarmos ao nosso destino final, um cara inconveniente surgiu por trás da Marjorie e tapou os olhos dela.

Cara inconveniente: Adivinha quem é?

Que brincadeira mais século XX...

Marjorie: Ah, meu Deus, eu sou muito topeira para essas coisas. Deixa eu ver... Juvenal?

Cara inconveniente: Não.

Marjorie: Ernesto?

Cara inconveniente: Não.

Marjorie: Paulo Mello?

Cara inconveniente: Não.

Marjorie: Garrincha?

Cara inconveniente: Não.

Marjorie: Rafa Filippelli?

Cara inconveniente: Não.

A minha ansiedade em tomar um açaí, que manchasse ou não a minha boca, não podia mais esperar uma única tentativa de adivinhação da Marjorie.

Adalberto: Olha só, ele é louro, tem o cabelo rastafári, uma barbicha tipo aquela Brad Pitt deixa crescer de vez em quando, tem mais ou menos 1m80cm, está de calça jeans, camisa branca e tem alguma coisa na cintura que dá a impressão de ser uma arma!

Foi quando o cara inconveniente se revelou para a minha prima.

Cara inconveniente: Muito prazer, eu sou o seu assaltante. Passa a grana discretamente.

Adalberto: Como assim?

Cara inconveniente: Você também. E quietinho, senão, eu te mato.

E enquanto a Marjorie abria a carteira para tirar o dinheiro, o assaltante teve uma ideia.

Cara inconveniente: Isso está chamando muita atenção. Vamos fazer o seguinte, eu vou abraçar vocês dois, assim. Agora, a gente finge que é melhor amigo e entra aqui nessa loja de sucos.

Eu a Marjorie não conseguíamos esboçar qualquer emoção.

Cara inconveniente: Gente, ri! Vocês estão muito sérios hoje. Nem parece que a gente é uma família. Moça, por favor, três açaís. Vocês me acompanham, né?

Eu não conseguia falar. Estava completamente travado. E com medo.

Cara inconveniente: Responde, gente!

Marjorie: A gente quer, sim.

Cara inconveniente: Então, gatinha, confirmando: três açaís de quinhentos, por favor.

Marjorie: Para mim, de trezentos, por favor.

Cara inconveniente: E você, irmão? Quer o quê?

Chorar! Isso era o que eu queria. Chorar fazendo barulho, pulando e dando socos naquele balcão.

Cara inconveniente: Fala, cara.

Marjorie: Ele está com dor de garganta. Não consegue nem falar. Não pode tomar nada gelado.

Cara inconveniente: Então, por que você disse que ele também queria?

Marjorie: Eu tinha esquecido.

A essa altura, a atendente da loja de sucos já desconfiava de alguma coisa.

Cara inconveniente: Amorzinho, dois açaís, então. Um de quinhentos e o outro de trezentos, por favor.

E enquanto a menina fazia o pedido na cozinha, o assalto re começava.

Cara inconveniente: Agora, sim, passa toda grana. Anda! Os dois!

Eu, para variar, não tinha quase dinheiro na carteira. Entreguei míseros 13 reais e setenta e cinco centavos. Com a Marjorie, sim, ele se deu bem. Levou dela quatro mil e quinhentos reais.

Cara inconveniente: Agora vocês vão ficar olhando para a televisão e vão contar vinte segundos na cabeça de vocês.

Que medo! O que será que viria depois desses vinte segundos. Contei querendo que nunca acabasse. Seriam os vinte segundos mais rápidos da minha vida. Seriam. Mas a atendente nos interrompeu quando eu estava no nove.

Atendente: Senhor, senhora, o outro senhor já foi embora. É para eu estar cancelando o açaí dele?

E essa foi uma das melhores notícias que alguém pôde me dar  nos últimos tempos no gerúndio!

Adalberto: Não! Não cancela. Eu quero. Aliás, manda fazer um para você também.

Atendente: Senhor, eu não posso estar consumindo nada durante o trabalho.

Adalberto: Não? Uma pena. Então, pega lá o nosso, por favor. Jojô, eu achei que a gente ia morrer! Queria chorar de medo, gritar...

Marjorie: Adal, eu estou toda mijada.

Atendendo: Senhor, só mais uma coisinha. O nosso açaí tradicional acabou. Mas eu posso estar servindo o açaí branco para vocês com 50% de desconto.

Marjorie: Aqui tem açaí branco?

Atendente: Nós estamos oferecendo açaí branco, sim, senhora.

Adalberto: E é mais barato mesmo?

Atendente: Não, senhor. É mais caro. Mas como não temos mais o açaí que os senhores queriam estar tomando, vamos dar 50% de desconto no açaí branco ou, se preferirem, o dinheiro de volta.

Adalberto: Não. a gente vai estar tomando o açaí branco mesmo, com 50% de desconto.

Atendente: Está bem, senhor.

E quando a pobre coitada virou as costas, a Marjorie soltou o riso que estava preso.

Marjorie: Você é um bobo, sabia?

Adalberto: Eu? E você é uma louca, que se mijou toda por causa de um assalto e agora está aí se mijando de rir.

Marjorie: O mijo figurativo não molha. Ai, coisa feia mijar... Mulher faz xixi.

Adalberto: Mas não foi isso que você falou, depois do assalto.

Marjorie: Eu sei, mas é uma expressão. Toda mulher que é assaltada e faz xixi nas calças de nervoso, sempre fala "me mijei toda".

Adalberto: A gente está aqui e o assaltante a essa hora deve estar se divertindo com o nosso dinheiro. Os meus treze reais e setenta e cinco centavos! Vão fazer falta.

Marjorie: Ai, miserável. Aquele idiota me levou quatro mil e quinhentos reais. Está bom para você?

Adalberto: Sério, Jojô? E você está assim, tranquila?

Marjorie: Vou fazer o quê? Me desesperar por causa de dinheiro? Eu, não. O importante é a minha vida. Fora que esse dinheiro foi de um freela que eu fiz para uma amiga da época da faculdade, coisa boba. Eu não sabia que ela ia me pagar. Não vai me fazer falta.

Adalberto: Mas a mim vai. Olha, eu acho que você devia estar fazendo um boletim de ocorrência na delegacia.

Marjorie: Para de gerundismo, garoto!

Adalberto: Eu gostei de ficar falando no gerúndio, dá licença.

E falando em gerúndio...

Atendente: Senhores, os açaís de vocês.

Adalberto: Obrigado, querida.

Marjorie: Ué, é verde?

Atendente: Sim, senhora. Essa é a coloração do açaí branco.

Marjorie: Ele é pseudo-branco, então.

Atendente: Como assim, senhora?

Marjorie: Nada.

Atendente: Dá licença, então.

Marjorie: Toda.

Adalberto: Ela é pseudo-inteligente. Só sabe o que é gerúndio. mas nada.

Marjorie: Bobo!

E depois do açaí branco, que não tem graça nenhuma, mas não mancha a boca, fomos para um boteco perto da casa do Jojô, forrar o nosso estômago com muita cerveja.

A Ane e a Lu, que queriam apresentar seus novos peguetes, ligaram para nos encontrar, quando ainda estávamos no primeiro copo. Lá pelas tantas, já tínhamos até esquecido delas, quando fomos surpreendidos com a nova mania traumática do verão. Elas taparam os nossos olhos e pediram para adivinharmos quem eram.

Ane e Lu: Adivinha quem é?

Berramos de medo!

O ataque histérico até que foi bom. Sem querer, chamamos a atenção dos policiais que estavam próximos ao local, que prendeu o carinha louro, com cabelo rastafári, barbicha tipo aquela que o Brad Pitt deixa crescer de vez em quando e que estava saindo com a Ane.

O peguete da Lu também foi preso. Para o bem da humanidade, ele foi reconhecido por uma, senhora que estava numa mesa ao lado da nossa. Ele havia levado uma pulseira de ouro da pobre coitada, mais cedo, quando ela ia para o mercado fazer compras, com a técnica infalível de chegar por trás da vítima e tapar os seus olhos. Isso, pelo visto, é o novo hit dos assaltantes do Rio.

Por fim, conseguimos recuperar a pulseira de ouro e os quatro mil, quinhentos e treze reais e setenta e cinco centavos, que estavam intactos na mochila dos bandidos.

Depois de toda a confusão, a Ane e a Lu, arrasadas e decepcionadas com o mundo, foram para a casa da Sara buscar consolo. Eu a Marjorie retomamos a nossa rodada de cerveja. Bebemos todas, rimos muitos e brincamos de ficar falando no gerúndio.

Como é bom viver!

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Ane perde a vergonha na cara, mas, no fim, tudo acaba Xuxa

A programação do último domingo era ir ao show da Madonna, no Parque dos Atletas. A problemática: as primas também iam. Eu e a Lu, que tínhamos dormido na casa da Marjorie, no Leblon, fomos de carona com ela. A Ane pegou a Sara em casa, no Méier, e foi por outro caminho.

Marjorie: Esse trânsito está surreal, né?

Adalberto: O pior é saber que eu moro em frente ao local do show, podia ir andando e chegar em cinco minutos.

Lu: A gente devia ter dormido no teu apartamento ontem. Fomos burros.

Marjorie: Verdade. A gente ficou com preguiça e, agora, está pagando por isso.

Adalberto: Eu estava muito cansado. E você queria que eu dirigisse. Não ia rolar. 

Lu: Aquela festa só serviu para deixar a gente cansada. Mal tinha comida.

Marjorie: Tinha, sim.

Adalberto: Eu não comi nada.

Lu: Nem eu. Não gosto daquilo.

Marjorie: Como assim, daquilo? Tinha tanta coisa...

Adalberto: Tinha?

Marjorie: Tinha.

Lu: Então, querida, você deve ter ido a outra festa. Onde eu fui, não tinha uma bolinha de queijo para contar a História.

Adalberto: É. Foi nesse lugar que eu fui também.

Marjorie: Não tinha bolinha de queijo, mas tinha carpaccio de carne, carpaccio de salmão, carpaccio de bacalhau, caviar de esturjão, caviar d´escargot, pasta de foie gras...

Adalberto: Para, senão, eu vou vomitar.

Marjorie: Ah, para de frescura. Você não sabe o que é comida de verdade.

Lu: Comida de verdade é arroz, feijão, bife e batata frita.

Adalberto: Concordo.

Marjorie: Ah, vocês são tão basicões. Eu adorei o cardápio da festa.

Lu: Eu, não. Comida chique não é comida. 

Adalberto: Não tem gosto, não tem cara boa e não satisfaz.

Marjorie: Não enche.

Lu: Realmente. Aquela comida não enche. 

Marjorie: Não enche é para vocês, suas malas sem alça!

Adalberto: Jojô, olha para frente!

Era tarde. Ela atropelou um homem, que atravessava no sinal verde.

Marjorie e Lu: Aaaaaaaaaahhhhhhhhhh!

Para a nossa sorte, uma ambulância passou na hora do acidente. Por um momento, achei que já era o resgate do homem que a Marjorie atropelou. Por um momento, também achei que eu estava num país do Primeiro Mundo, tamanha a rapidez do atendimento, que nem sequer chegou a ser solicitado. Por um momento, finalmente, tive muito orgulho de ser brasileiro. 

Até que a ambulância parou e, quando fui levar o cara atropelado para dentro dela, deparei-me com a Ane e a Sara. E, assim, todos os meus momentos anteriores foram por água abaixo.

Adalberto: Como assim, vocês aqui?

Sara: Primo!

Ane: Claudinelson!

Ok que o mundo é um ovo. Mas daí a gente encontrar com a Ane dentro de uma ambulância e ela conhecer o cara que a Marjorie tinha acabado de atropelar era demais, né?

Ane: Eu vou arrebentar você!

Ela levantou da maca, toda troncha e começou a bater no pobre coitado. Eu, que o segurava no meu colo, tomei alguns socos por tabela.

Marjorie: Para, sua maluca! Eu acabei de atropelar essa cara. Ele está todo ferrado.

Ane: Você é uma incompetente! Tinha que ter matado essa desgraçado!

Lu: Você conhece ele de onde, garota?

Ane: Esse safado é do Rio Grande do Sul, mas que mora em São Paulo e que eu conheci aqui no Rio, quando eu voltei daquela viagem que eu fiz para a Bahia para visitar um meu amigo do Pará, que, atualmente, mora no Mato Grosso do Sul.

Adalberto: Calma! Fala devagar! Você passou por todas as regiões do Brasil sem respirar.

Ane: Esse homem me abandonou! E eu estava completamente apaixonada.

Claudinelson: Lá vem você de novo, com essa Síndrome de Scarlet O´Hara. O tempo passa e você não muda! Para de drama! Não começa.

Deu para ver que ele conhecia bem a Ane.

Ane: Para de me chamar de dramática!

Adalberto: Gente, depois vocês discutem relação. Ane, o que foi que aconteceu com você? Por que você está aqui nessa ambulância? Diz, para mim, que isso é uma pegadinha.

Ane: Isso não é uma pegadinha. Eu virei o carro numa curva. 

Sara: Ela é doida. Nunca mais entro num carro com ela no volante. Ainda bem que eu não levei nem um arranhão. Graças a Deus.

Motorista da ambulância: Gente, eu preciso sair. Só um de vocês pode acompanhar os acidentados. 

Adalberto: Deixa que eu vou com eles, Sarita. Vou ficar aqui para evitar novas agressões. Vai você e a Lu  com a Marjorie para o show da Madonna. Se der, eu passo lá depois, quem sabe, a tempo de ouvir "Like a virgin". "Like a virgin" está no repertório desse show?

Marjorie: Não sei. Acho que não. Mas isso não é hora, né, Adal

Ane: Ah, eu também adoro "Like a virgin". Eu me identifico demais com essa música.

Lu: Depois, quando eu estiver só com você, eu falo com o que você se identifica demais.

Marjorie: Vamos, Lu, senão a gente vai chegar atrasada. O trânsito não está nada bom. 

Lu: Vamos, sim. Tchau, Adal.

Sara: Beijo, primo.

No caminho para o hospital, o clima tenso entre Ane e Claudinelson já não mais existia.

Ane: Por que você não me procurou?

Claudinelson: Porque você mora aqui e eu lá. Foi a maneira que eu encontrei para não sofrer.

As desculpas masculinas são as melhores!

Ane: Eu sofri tanto.

Claudinelson: O importante é que a gente teve essa oportunidade para ficar juntos de novo. Vamos fazer com que esse momento seja eterno enquanto durar.

Ane: Mas eu não quero ficar com você só nesse momento, né, Claudinelson! Eu queria que ele durasse, pelo menos, mais um pouco. E que desse para você ir lá em casa e, quem sabe, a gente até fizesse um...

Adalberto: Gente, eu estou aqui.

Ane: Desculpa, primo. Então, Clau? O que você acha de, depois, a gente ir lá em casa?

Claudinelson: Pô, ia ser Xuxa.

Xuxa? Como assim, Xuxa?

Ane: Ia, não. Vai ser Xuxa.

Adalberto: Gente, desculpa perguntar, se for algum código obsceno vocês não precisam responder, mas o que vem a ser Xuxa?

Ane: Xuxa é tudo o que é legal, primo. É um vocabulário nosso.

Adalberto: Legal. 

Claudinelson: É que, quando a gente se conheceu, foi numa boa boate, o som estava alto e ela não entendia quando eu falava "sussa", pensava que era Xuxa.

Adalberto: E o que vem a ser sussa?

Claudinelson: Sussa de sossegado, tranquilão, maneiro, legal, beleza, sei qual é, entendi, está certo, está safo...

Ou seja, sussa tem mais acepções do que a minha paciência pôde aguentar.

Claudinelson: ... Bacana, incrível, gostei...

Adalberto: Está bom, querido. Já entendi.

Claudinelson: Então, está Xuxa.

Adalberto: Super! Super Xuxa.

Ane: Sabe que eu acabei comendo aquela parte do meio do abacaxi...

Claudinelson: Mentira? Xuxa!

Ai, que saco esse negócio de Xuxa, hein! Cansa...

Claudinelson: Viu que não tinha nada a ver com negócio de coceira?

Ane: Quem me falou isso foi a mãe dele.

Adalberto: A minha?

Ane: É. A tia Neide sempre dizia que não era para comer aquela bolinha do meio do abacaxi, porque dava coceira. 

Adalberto: Ela nunca me disse isso.

Por que será que a minha mãe nunca me disse isso? Será que ela não se preocupa comigo?

Adalberto: Ela falou alguma coisa sobre comer aqueles fiapinhos do mamão? Eu como. Será que faz mal?

Ane: Não sei, Adal. Mas eu bem que queria que o meiuca do abacaxi me desse coceira, só para mandar o Claudinelson vir me coçar. Você tinha me prometido, lembra?

Claudinelson: Claro. E eu ia voltar só para coçar você.

Ane: Só para coçar?

Claudinelson: E fazer aquelas outras coisas, que você sabe.

Ane: Você foi o cara que eu mais gostei, sabia? Carinhoso. Mas selvagem quando tinha que ser. 

Só um burro para não saber quando ele devia ser selvagem com ela.

Claudinelson: Quando eu era selvagem com você?

Ah, não!

Ane: Eu não vou falar aqui, na frente do meu primo, né?

Adalberto: Obrigado pela parte que me toca.

Claudinelson: Ah, fala. Qualquer coisa, depois, você apaga.

A Ane sorriu maliciosamente e eu fiquei sem entender lhufas.

Ane: Ah, seu safado!

Adalberto: O que foi?

Ane: Nada, primo. Quando ele fala que é para apagar, também é coisa do nosso próprio vocabulário. 

Adalberto: E o que significa?

Ane: Nada, primo. Depois te conto.

Claudinelson: Coisas do Dicionário Claudilane...

Ane: Eu nem cheguei a fazer a tatuagem.

Claudinelson: Não? Mentiu para mim?

Ane: Eu esperei você me procurar. Queria ter certeza que você era meu. Ainda bem que eu não fiz. Imagina eu andar com uma tatuagem no meu pé, escrito "Claudinelson - Amor verdadeiro, amor eterno" e não ter você...

Adalberto: Ane, você ainda não desistiu da ideia de fazer uma tatuagem igual a que a Deborah Secco fez na época em que ela namorou o Falcão, do Rappa?

Ane: O Claudinelson merecia.

Claudinelson: Merecia?

Ane: Merece.

Claudinelson: Então, você vai fazer?

Finalmente, depois de ouvir muita baboseira, chegamos ao hospital.

Ane: Depende de você.

Adalberto: Ah, mas não vai mesmo! Agora, isso depende de mim. Se até a Deborah Secco conseguiu aprender que não se tatua nome de homem no corpo, você também vai aprender. E vai aprender na marra.

E puxei-a pelo braço.

Adalberto: Vamos!

Motorista da ambulância: Senhor, a entrada do hospital é ali. 

Adalberto: Eu sei, meu amigo, mas é para a saída mesmo, que a gente está indo. O problema dela é falta de vergonha na cara. E, para isso, eu sei qual é o remédio.

Claudinelson: E eu? Quem vai ficar aqui comigo?

Adalberto: Se vira, otário!

Levei a Ane em casa, falei poucas e boas. Disse tudo que estava entalado. Nem a Deborah Secco foi poupada.

Ane: Você nunca mais vai falar comigo?

Adalberto: Vou. Claro que vou. Mas agora vamos beber, porque eu também quero perder a vergonha na cara. Agora, você, aprenda uma coisa...

E passei a maior lição de vida, que alguém já pôde ensiná-la.

Adalberto: Uma mulher não deve perder a vergonha na cara por causa de homem nenhum. Mas por causa da bebida, sim.

Ane: Então, vamos entornar o pote, primo!

Bebemos todas e mais três no primeiro bar que paramos. E jamais soubemos se a Madonna cantou ou deixou de cantar "Like a virgin". Foi Xuxa! Quer dizer, foi muito legal.