terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Marjorie se mete numa furada e Ariadna, do BBB, tem tudo a ver com isso

A Marjorie apareceu, outro dia, lá em casa do nada. Estava com uma cara péssima:

Marjorie: Adal, fiz uma merda e, agora, tô morrendo de raiva de mim.

Adalberto: O que foi?

Marjorie: Fiz uma ultrassonagrafia transversal do útero e mandei pro Helenildo.

Adalberto: Tá grávida?

Marjorie: Não. Mas eu posso ficar. E esse é o meu diferencial.

Adalberto: Ele achava que você era estéril?

Marjorie: Não. Achava que eu era transexual.

Adalberto: Como assim?

Marjorie: Adal, depois da Ariadna, do BBB, agora nenhuma mulher é chamada de bicha impunemente.

Adalberto: Alguém te chamou de bicha?

Marjorie: Primo, eu trabalho com moda, esqueceu?

Adalberto: Verdade.

Trabalhar com moda e não ser chamada de bicha é, praticamente, uma afronta.

Marjorie: Foi um personal stylist, que eu encontrei no shopping.

Adalberto: O que é que tem ele?

Marjorie: Ele que fez a merda.

Adalberto: Que merda?

Marjorie: Me chamou de bicha. Agora, o Helenildo tá com medo de estar saindo com um ex-homem.

Adalberto: Marjorie, quem fez a merda foi você em ficar com esse babaca. Um ex-homem é uma mulher. A própria medicina encara a mudança de sexo como uma adequação do físico ao psicológico.

Marjorie: Fala isso pra ele.

Adalberto: Eu, não. Não vou perder meu tempo.

Marjorie: Eu grampeei um bilhetinho na ultra, pedindo uma nova chance pra ele.

Adalberto: Ridículo. Ele já respondeu?

Marjorie: Não.

Adalberto: E você? Não tá com vergonha de si? Tão inteligente. Depois, fala das maluquices da Lu. As maluquices da Lu são coerentes com a Lu.

Pelo menos, na maioria das vezes.

Marjorie: Vou voltar pra casa.

Adalberto: Você veio aqui só pra isso?

Marjorie: Não. Também vim chorar no ombro amigo do meu primo.

Adalberto: Meu amor, vem cá.

Marjorie: Não. Não quero queimar cartucho. Vou chorar em casa mesmo.

Não insisti. Fiquei com um remorso absurdo por ter sido meio frio com a minha prima. Mas concordei com o que ele disse. Ela ia me aguçar a minha escoliose à toa.

Ficamos uns três dias sem nos falar. Essa história me pareceu tão pouco importante, que eu sequer liguei pra saber como ela estava no dia seguinte. E ela, talvez, continuou sem querer queimar cartucho.

Até que, ontem, quando eu acabava de sair de uma sessão de cinema com os meus pais e o Diego, meu sobrinho, ela me ligou:

Marjorie: Pode falar?

Adalberto: Posso. Tô aqui no shopping. Vim com meu pai e minha mãe trazer o Diego pra ver Enrolados 3D.

Marjorie: E aí?

Adalberto: Chato. Mas valeu o programa em família.

Marjorie: Eles estão aí perto?

Adalberto: Não. Estão ali numa lojinha de doce, comprando Kinder Ovo pro Diego.

Marjorie: Eu recebi uma resposta do meu enrolado.

Adalberto: O Helenildo?

Marjorie: É.

Adalberto: E aí?

Marjorie: Ele me mandou uma ultrassonografia transversal do útero de uma putete, que ele também estava saindo.

Adalberto: Esse cara é um babaca mesmo. Agora, pra ficar com ele, a mulher tem que provar que é mulher desde que nasceu, com ?

Marjorie: Acho que sim. De repente, chamaram ela de bicha, sei lá.

Adalberto: Você sabia da existência dela?

Marjorie: Claro que não. Você sabe que não gosto de homem enrolado.

Adalberto: E qual foi o objetivo dele mandar a ultra da outra? Dizer que ela foi mais rápida e pegou o lugar?

Marjorie: Não. Dizer que naquele Kinder Ovo veio com surpresa.

Adalberto: Mentira. A putete tá grávida dele?

Marjorie: Tá.

Adalberto: E você?

Marjorie: Já chorei horrores aqui em casa, mas agora eu quero sair. Me leva pra algum lugar, onde eu possa me exibir pra muito homem?

Adalberto: Só se for agora. Vou deixar meus pais em casa, o Diego na minha irmã e parto praí.

Marjorie: Beleza. Tô te esperando.

Fomos prum pub bem animado, onde a Marjorie pôde sensualizar toda a sua feminilidade psicológica e física (de nascença) pruns carinhas.
Nos acabamos de tanto dançar. E, no dia seguinte, eu não era ninguém. Minha escoliose gritava de dor. Mas não me arrependo. Esse cartucho ainda tem muita carga.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O primeiro e famigerado desejo da Sara

Eu não tinha a menor condição de trabalhar na segunda-feira passada, de tanto que eu bebi na noite de domingo. O pior é que, além da ressaca, rolava um enjoo forte. Não conseguia~olhar pra comida nem pra qualquer coisa que me remetesse à comida, que me dava vontade de vomitar. Ou seja, eu não podia ir até a cozinha da minha própria casa, com aqueles azulejos com desenhos de frutas, se eu precisasse de água.

No meio da noite, o meu celular tocou. No começo, eu não sabia se era sonho ou realidade. Mas, pra minha tristeza, era realidade:

Sara: Primo, estava acordado?

Adalberto: Quem é?

Sara: Sou eu, Adal, Sara.

Adalberto: É muito urgente?

Sara: É.

Adalberto: Alguma coisa com os bebês?

Sara: Lógico.

Fiquei sóbrio na hora. A gravidez da Sara era de risco.

Adalberto: O que aconteceu?

Sara: Os seus afilhadinhos estão querendo comer gelatina de morango com queijo cheddar.

Putz. Só de pensar nessa combinação infame, o meu estômago embrulhou.

Adalberto: Como assim, Sara? Eles ainda não têm nem sexo e já querem comer um absurdo desses?

Sara: Você não disse que queria saber quando eu sentisse o primeiro desejo?

Adalberto: Mas você podia esperar pra me contar dentro do horário comercial, né, prima?

Sara: Ai, Adal, é que aqui em casa não tem gelatina de morango. Você tem aí na sua?

Eu tinha. Aliás, era só o que eu tinha de sobremesa na minha casa, mas a preguiça falou mais alto.

Adalberto: Lindona, vou ficar te devendo essa.

Sara: E os seus afilhados vão nascer com cara de gelatina com queijo cheddar?

Adalberto: Sarita, tem como a gente chamar esse abuso gastronômico de desejo x?

Sara: Por quê?

Adalberto: Eu tô passando mal. E o seu desejo x tá me dando enjoo.

Sara: Sabe que eu ainda não tive enjoo nessa minha gravidez?

Adalberto: Pois é, acho que, no momento, eu tô mais grávido do que você. Um a zero pra mim.

Sara: Mas você tá precisando de alguma coisa? quer que eu vá aí cuidar de você?

Adalberto: Não, Sara. Eu não vou tirar uma mulher grávida de casa pra cuidar de mim a uma hora dessas. Iam me sacanear pro resto da minha vida.

Sara: Que besteira. Se quiser, eu pego um táxi e chego aí rapidinho.

Adalberto: Cadê o Oswaldo?

Sara: Tá dormindo. Por quê? Você sabe de alguma coisa? Ele não vai ouvir, eu tô na sala, me fala.

Adalberto: Nada, Sara. Foi só uma pergunta. Para com essa neurose. Você tá grávida do cara e fica desconfiando de cada passo dele...

Sara: Desconfio mesmo. Duvido que eles esteja sonhando comigo. Tá com um sorriso no rosto. Comigo ele não fica assim. Quando acordar, vou querer saber quem era a piranha que estava com ele no sonho. Você vai ver.

Adalberto: Amore, foco no seu desejo. Nos bebês. Quando ele acordar, em vez de você ter um ataque de ciúme, pede pra ele realizar o seu desejo x.

Sara: Tá maluco. Eu preciso comer qualquer coisa agora. Um abacaxi com molho shoyo caía bem, hein...

Porra, segurei pra não vomitar. Precisava acabar com essa conversa o quanto antes.

Adalberto: Sarita, vamos chamar isso de desejo y.

Sara: O abacaxi desapareceu da geladeira. O Oswaldo comeu tudo e, agora, fica ali, sonhando com uma lambisgoia.

Adalberto: Pensa em outra coisa. Dá uma olhada no que você tem em casa e dá asas à criatividade. Essa não é a Sara que eu conheço. Vai lá. Você consegue.

Sara: Adal, espera. Me dá uma ideia.

Adalberto: Amore, a minha criatividade não vai alcançar a sua necessidade.

Sara: Humm... Estava dando uma olhada aqui no que eu tenho. Tô em dúvida entre carne moída com sorvete napolitano, pasta de atum com groselha ou creme de alho com Sal de Frutas Eno.

Caralho, que nojo! Fui correndo pro banheiro. Não tive nem tempo de sugerir a ela de chamar essa gororoba de desejo z.

Sara: Adal, Adal...

Vomitei até, provavelmente, a minha apaguei no banheiro mesmo. Acordei num hospital, tomando soro na veia. A sala estava vazia e eu estava ficando entediado, louco pra descobrir como eu fui parar ali. Quando estava prestes a enlouquecer, arrancar aquele soro da minha veia e sair correndo sem rumo, a Sara entrou no quarto:

Sara: Primo! Não tira isso.

Adalberto: Como é que eu vim prar aqui?

Sara: Eu fui com o Oswaldo te buscar. Do nada você parou de falar no telefone. Fiquei preocupada. Graças a Deus não foi nada.

Ela falou, falou, mas não explicou o porquê de eu estar ali. Eu não insisti. Estava com vergonha do que podia ser.

Adalberto: Onde você estava agora?

Sara: Estava comendo uma ameixa com molho de tomate.

Vomitei ainda mais. E lembrei como fui parar ali. O melhor foi que o vômito respingou no vestido da Sara, de modo que ela teve que ir embora pra casa trocar de roupa.
E eu não ouvi mais falar em coisas muito exóticas pra se comer até receber alta do hospital.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Marjorie comemora fim de relacionamento com mangueirense na quadra do Salgueiro

Fui contra a minha vontade pro sítio do carinha que a Marjorie estava ficando há umas duas semanas. Ela fez chantagem emocional e eu caí na armadilha. Se bem que, no dia, tentei pular fora do barco:

Marjorie: Como assim desistir?

Adalberto: Você não tinha me falado que esse evento seria praticamente um ensaio técnico de carnaval da Mangueira. Você sabe que eu odeio a Mangueira.

Marjorie: Quem falou que vai ser um ensaio da Magueira?

Adalberto: Você.

Marjorie: Eu disse que o pessoal de lá é todo mangueirense e que era provável que ia rolar muito samba.

Adalberto: Samba da Mangueira, claro.

Marjorie: E daí?

Adalberto: Praticamente um ensaio técnico de carnaval da Mangueira, ué.

Marjorie: Garoto, você tá maluco? Não foi você que disse que não ia mais alimentar rivalidade boba contra flamenguistas, paulistas e argentinos?

Adalberto: Foi.

Marjorie: Esqueceu que você dizia que não gostava de mangueirense, porque todo mangueirense é flamenguista?

Adalberto: Esqueci. Mas você me lembrou e eu decidi que não tenho mais nenhuma desculpa pra não ir no sítio do Cleilton.

Que merda.

Para minha surpresa, os mangueiresnes-flamenguistas estavam ouvindo MPB, conversam sobre política, tomavam vinho e tinha filhos muito bem educados. Um cenário que o meu preconceito jamais poderia imaginar. Eu nem me lembro se, em algum momento, tocou algum samba.

Marjorie: Tá gostando?

Adalberto: Não.

Marjorie: Por quê?

Adalberto: Só tem casal com filho aqui.

Marjorie: Pois é. Tenho que fazer o meu urgentemente. Tô me sentidno um peixe fora d´água.

Adalberto: E eu tô me sentindo um estudo de caso.

Pro meu azar, o Poodle Toy do Cleilton veio brincar comigo. Poucas coisas conseguem ser mais irritantes do que um Poodle Toy.

Cleilton: Que bom que você arrumou um amiguinho.

Adalberto: Tá vendo?

O pior é que quanto mais brinco com um Poodle Toy, mais gosto do ser humano.

Marjorie: Adal, o Fluc é lindo, né?

Adalberto: Eu não acho. Tô brincando com ele por mera conveniência.

Marjorie: Quer alguma coisa pra comer? Uma carne, um pão de alho, um queijo coalho...

Adalberto: Quero ir embora.

Marjorie: Já?

Adalberto: Pelo amor de Deus.

Marjorie: Só mais meia-horinha.

Adalberto: Quinze minutinhos.

Eu sabia que meia-horinha da Marjorie significava uma hora.

Marjorie: Tá bom.

Meia-hora depois, fui chamá-la.

Marjorie: Eu já ia te chamar. Tá na hora, né?

Adalberto: Tá.

A despedida foi uma das experiências mais desgastantes da minha vida. Entre apertos de mãos e dois beijinhos, fui obrigado a ouvir comentários, que davam conta de que eu estava cometendo a maior das vilanias, em tirar minha prima da companhia do namorado.

Eu não estava tirando a minha prima da companhia do namorado. Eu estava fazendo aquilo por mim.

No carro, achei que a Marjorie fosse querer me matar. Mas, pra minha surpresa, ela me agradeceu:

Marjorie: Adal, muito obrigado por me tirar dali.

Adalberto: Ué, você nãos estava gostando?

Marjorie: Não.

Adalberto: Não?

Marjorie: Não.

Adalberto: Mas pareceu que sim.

Marjorie: Garoto, o Cleilton fica o tempo todo me observando. Eu não podia demonstrar a verdade. Fora que ele sabe fazer leitura labial.

Adalberto: Jura?

Marjorie: Ele trabalha com investigação criminal.

Adalberto: Ele te falou se eu cometi algum crime ali?

Marjorie: Você deu osso de galinha pro Fluc.

Adalberto: Ele viu isso?

Marjorie: Viu.

Adalberto: Mas só foi isso de errado, né?

Marjorie: Não. Você limpou a mão de gordura na piscina, jogou gordura de carne no telhado da vizinha e nunca fechava o isopor direito, cada vez que pegava uma lata de cerveja.

Adalberto: Caramba, ele reparou nisso tudo?

Marjorie: Não só nisso tudo. Ele achou meu vestido muito curto, reclamou do jeito que eu desprezava uma mulher que chamava o marido de pai e cismou que eu estava dando confiança pro marido de uma loura velha que estava lá.

Adalberto: O seu vestido, realmente, é curto. Mas ele não tem nada a ver com isso. Desprezar uma pessoa que chama o marido de pai é mais do que correto.

Marjorie: Não é?

Adalberto: Só ficar dando confiança pra outro cara, que pode ser considerado ilícito, mas se o Cleilton se revelou um babaca questionador, e a mulher do cara, além de loura velha, é chata, eu não te condeno.

Marjorie: Brigada, primo. Por isso que eu te amo.

Adalberto: Pra onde a gente vai agora?

Marjorie: Pra quadra do Salgueiro.

Adalberto: Sério?

Marjorie: Muito sério. Vamo comemorar o fim do meu relacionamento com o babaca-questionador-mangueirense-flamenguista.

Senti alguma coisa de vingança no ar, além de uma dose bem fraca de preconceito. Mas confesso que adorei a ideia de ir pra quadra do Salgueiro.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ano Novo com muita flor e dor

Eu tinha três grandes festas para passar o Ano Novo, mas, depois da notícia da gravidez da Sara, eu decidi passar a noite da virada com ela. Ane, Lu e Marjorie aderiram a minha ideia.

Sara: Na sua casa mesmo, Adal. Assim, a gente evita a família do Oswaldo.

Adalberto: Então, tá. Vou sair pra comprar umas flores pra casa não ficar com cara de hospital.

Sara: Falando em flores, lembrei que eu tenho que regar o jardim daqui de casa. As bichinhas estão quase morrendo.

Adalberto: Como assim? Antes a gente tinha que travar você pra não matar as coitadas de tanta água...

Sara: Primo, a gravidez me deixou com perda de memória recente.

Adalberto: Ih, tá igual a mim, então.

Sara: Mas você não tá grávido.

Adalberto: É. Dois a um pra você. Amore, deixa eu ir lá, porque eu tenho que... O que eu tenho mesmo que fazer?

Sara: Comprar flores pra enfeitar o apartamento, seu louco.

Adalberto: Estava só testando a sua memória. Até que você tá bem.

Sara: Cachorro!

Adalberto: Te amo.

Comprei flores de todas as cores. A decoração tinha tudo pra ficar brega. Mas tudo aconteceu da hora que eu saí da floricultura até a meia-noite.

A tacada inicial quem deu foi a Ane:

Adalberto: Alô.

Ane: Primo, tô passando muito mal.

Adalberto: Tá sentindo o quê?

Ane: Muita dor e enjoo.

Adalberto: Mas você tem ideia da origem disso?

Ane: Tenho. Das flores que eu comprei pra jogar pra Iemanjá.

Adalberto: Ane, você voltou com essa história maluca de ficar comendo flor?

Ane: Foi só ontem.

Adalberto: Quantas você comeu?

Ane: Uma dúzia.

Adalberto: Meu Deus! Assim, você vai morrer.

Ane: Eu acho que isso já tá acontecendo, primo. Não dizem que, quando tem nascimento numa família, ele vem acompanhado por morte?

Adalberto: quem falou essa besteira?

Ane: Não sei. Mas foi alguém em algum enterro de algum conhecido.

Adalberto: Aí, só ficou na sua mente seletiva a parte ruim.

Ane: É. E se tem três bebês a caminho da vida na barriga da Sara, devem ter três parentes nossos a caminho da morte. E talvez eu seja um deles.

A Ane adora fazer drama. E eu não costuma dar a menor importância pra isso. Mas, dessa vez, ela conseguiu me deixar com medo.

Adalberto: Tô indo aí, agora, te buscar pra te levar prum hospital.

Era uma infecção alimentar. As flores que ela comeu não devem ter sido regadas por água potável. Eu fiquei lá com ela, enquanto as gotas do soro, que ela tomava na veia, pingavam a velocidade frenética de uma tartaruga. Nisso, a Marjorie entra na sala, numa maca, arrastada por uma enfermeira.

Marjorie: Vocês por aqui?

Adalberto: Eu é que pergunto. Você por aqui?

Marjorie: É. com dezessete pontos na perna esquerda.

Adalberto: O que é que você aprontou, Jojô?

Marjorie: O meu barquinho de oferendas pra Iemanjá não queria entrar pra dentro do mar. Fui conduzi-lo na direção certa e, quando vi, tinha sido arrastada pela correnteza.

Adalberto: E aí?

Marjorie: Aí que eu fui salva por aqueles helicópteros dos Bombeiros.

Adalberto: Meu Deus, que loucura!

Ane: Bem mais do que comer um monte de flor e passar mal.

Marjorie: Sua maluca, voltou a comer flor?

Ane: Foi só uma fraqueza. Me fala de você: pegou o telefone do salva-vidas?

Marjorie: Não, garota. Não deu. Eu cortei a minha perna numa pedra. Estava sangrando tanto, que eu não tinha forças pra dar mole pro salva-vidas. Pior que ela era um gatinho.

Ane: Ai, que pena, prima.

Marjorie: Pois é. Pelo menos, agora, eu tenho uma meta pra 2011. Ir atrás do carinha que salvou a minha vida.

Adalberto: Pelo que eu tô vendo, daqui vocês vão direto pro hospício.

Ou será que era a mim que elas estavam deixando maluco?

Ane: Adal, pega meu telefone ali na bolsa. Tá tocando. Atende pra mim.

Adalberto: Alô.

Sara: Primo, tô aqui há horas tentando falar com você.

Adalberto: Caramba, deixei meu celular no carro.

Sara: Eu fui picada por uma abelha, quando estava regando as flores. Tô aqui morrendo de dor. O Oswaldo tá num churrasco com os amigos e também não tá atendendo o telefone. Me ajuda.

Putz. A maldição do dia acabava de ganhar nome: Flor. Mandei ela pegar um táxi e ir pro hospital, onde eu já estava com as outras meninas. Assim, facilitava o meu trabalho.

Sara: Eu tô sem um centavo. O Oswaldo não me deixou um puto.

Adalberto: Eu pago aqui. Vem logo.

Graças a Deus ela foi atendida rapidamente e os bebês estava fora de perigo.

Com as três na sala de emergência do hospital e a duas horas do Ano Novo, senti falta da Lu. Não que eu queria que ela também estivesse com algum problema de saúde, mas porque, até aquela hora, ela não tinha sequer me ligado pra saber se tinha que levar, pelo menos, uma rabanada pra ceia.

Adalberto: Ane, vou usar o seu celular aqui rapidinho. Ligar pra Lu.

Lu: Adal, eu quero matar você, seu filho da...

Adalberto: Agora já era, seu imprestável. Só atende as minhas ligações quando quer. Se eu morresse, você ia ser o maior culpado.

Adalberto: Onde você está?

Lu: Não vou te falar. Se você se interessasse mesmo por mim, teria me atendido quando eu te liguei.

Adalberto: Meu amor, eu esqueci o meu telefone no carro. Tô aqui no hospital com a Ane, a Sara e a Marjorie. Quer ocasião pior pra passar o reveillon?

Lu: Quero.

A voz dela parecia tão próxima.

Lu: Quero você tendo que cuidar de mais uma enferma, seu safado. Olha pra trás agora!

Era ela mesma. Materializada em cima de uma maca, sendo empurrada por uma plácida enfermeira. Parecia cena de filme.

Adalberto: Como assim?

Lu: Nem te conto.

Marjorie: Gente, eu não tô acreditando nisso.

Ane: Nem eu.

Sara: Eu tô chocada.

Adalberto: Deixa eu resumir o caso delas pra você: Ane foi comeu uma dúzia de flores e teve infecção alimentar; Marjorie foi jogar flores pro mar, se afogou e ainda cortou a perna numa pedra; e Sara foi regar as flores do jardim e foi picada por uma abelha. Ou seja, se o seu caso não tem nada a ver com flores, retire-se dessa sala.

Lu: Querido, eu mereço uma maca king size. O meu problema dá de mi, a zero no delas.

Adalberto: Mas, se não tiver nada a ver com flor, não tá valendo.

Lu: Calma.

Ela não queria chocar a enfermeira. Quando ficamos a sós naquela sala de emergência, veio a notícia:

Lu: O carinha que eu estava ficando. Aquele que eu eu não sabia se colocava que estava num relacionamento sério ou enrolado no Facebook, lembra, Adal?

Adalberto: Sei. O entregador de pizza.

Lu: Não.

Adalberto: Entregador da farmácia?

Lu: Não, garoto!

Adalberto: Ele não é entregador?

Lu: É. Mas é de galão de água, seu burro.

Ane: Tá, Lu, conta logo.

Marjorie: É. Que saco vocês dois.

Sara: Até eu já estava aqui me irritando.

Lu: Então, ele queria jogar flores no mar pra Iemanjá.

Adalberto: Iemanjá também tá sendo o último grito da moda nesse hospital.

Ane: Não é?

Marjorie: Fala, Lu.

Lu: Menina, aí ele saiu tarde do trabalho e não conseguiu oferecer as flores lá pra santa. Fiquei com uma peninha dele. Aí, falei: bom, hoje, vou fazer uma surpresa legal pra esse menino.

Adalberto: Medo.

Lu: Eu coloquei uma flor na minha coleguinha, em homenagem as flores qeu ele ficou de oferecer pra Iemenjá.

Marjorie: Que homenagem doida é essa, garota?

Lu: Foi o que veio a minha mente.

Adalberto: Já ouvi de você coisas piores. Pula essa parte e fala logo como você veio parar aqui.

Lu: Se eu pular essa parte, voce não vai saber.

Ane: Então, continua.

Lu: A flor tinha espinhos. Que eu esqueci de tirar.

Sara: Você se rasgou toda?

Lu: Garota, eu fiquei arregaçada. Ele estava no elevador e eu ainda não tinha colocada a flor lá. Na pressa, acabei enfiando tudo muito rápido. Nem percebi os espinhos. Quando vi, era só sangue.

Adalberto: Meus Deus.

Lu: Mereço ou não mereço a melhor maca dessa emergência?

Sara: Maluca.

Marjorie: Claro que merece, prima. Você arrasou. Tô até com vergonha do que aconteceu comigo, depois dessa sua.

Ane: Eu dou a minha maca pra você, se for o caso. Você é a nossa rainha.

Lu: E você, Adal? Não tem nenhuma história emocionante com flor?

Adalberto: Não. Eu só saí de casa pra comprar umas flores pra enfeitar a minha casa, que estava parecendo um hospital de tão fria e básica, e vim parar aqui.

Marjorie: Ou seja, você tá em casa.

Adalberto: Praticamente.

De repente, a enfermeira entrou na sala com umas flores na mão.

Enfermeira: Gente, já é meia-noite. A chefe do plantão me pediu pra entregar essas flores pra vocês e desejar um feliz Ano Novo.

Adalberto: Querida, faz o seguinte: fica com as flores pra você, leva pra casa, dá pra outras pessoas, sei lá. A gente vai acatar, apenas, o feliz Ano Novo.

E que 2011 seja sensacional pras minhas primas!