sábado, 27 de fevereiro de 2010

O velório do tio Altair, a vida alheia em pauta e o risco iminente

Fui ao velório de um ex-vizinho, o tio Altair. A emoção vivida lá seria bem menor, se não tivesse levada as minhas primas.

Marjorie: A filha da Ivone parece mais velha que a mãe. Imensa de gorda, olha lá.

Lu: Cadê?

Marjorie: Ali, do lado da tia Neide.

Adalberto: Minha mãe tá chorando tanto.

Ane: Coitadinha. O tio Altair foi padrinho do casamento dela e do tio Beto, né?

Adalberto: É. Meu pai também adorava ele. Foi ele que arrumou para o meu pai o trabalho na Caixa Econômica.

Sara: Foi, Adal?

Adalberto: Foi.

Sara: É muito sofrido perder alguém tão legal, né?

Lu: É. Mas também é sofrido ter que ver o Leonel com aquela mocreia ali.

Adalberto: Você ainda gosta dele?

Lu: Ele foi o meu primeiro amor. Eu perdi a minha virgindade pra ele.

Adalberto: Quando foi?

Lu: Como assim?

Adalberto: Em que ano?

Lu: Sei lá. Deve ter sido em mil novescentos e...

Ane: Não fala! Esse cachorro vai calcular a idade que você se perdeu.

Pior que era isso mesmo o que eu ia fazer.

Lu: Adalberto Monteiro Neto, desde quando o senhor é bom em Matemática?

Dei um sorriso amarelo, sem graçao...

Lu: Me perdi com 13 anos. Pronto, te poupei de um trabalho.

Fiz cara de que a informação não era relevante. Mas, por dentro, fiquei estarrecido.

Ane: Eu, com 14.

Marjorie: Eu, com 16.

Sara: Ganhei! Eu me perdi com 18.

Lu: Ganhou? Você perdeu foi tempo, minha filha. Quem ganhou fui eu, que estou na atividade há mais tempo.

Adalberto: A vitória pertence aquele que acredita nela, e aquele que acredita nela por mais tempo. Pearl Harbor!

Marjorie: E você ainda acredita, prima?

Sara: No quê?

Marjorie: Na sua vitória.

Sara: Não sei.

Lu: Então, a vitória é minha, porque eu acredito nela.

Ane: A vitória é toda sua, Lu.

Marjorie: Olha ali aquele garotinha.

Sara: Ai, que fofa.

Marjorie: Fofa? Ela descobriu que aquele menino espirra toda vez que alguém põe a mão no nariz dele e não para de maltratar o coitado. Olha lá!

Ane: Que garota maldita!

Sara: Por que é que trazem criança para enterro? Enterro não é lugar de brincadeira.

Lu: É lugar de encontrar as pessoas que a gente não vê há séculos, ver como a gente tá bem melhor do que elas e meter o malho.

Adalberto: Verdade. Só isso que acontece aqui.

Sara: O que será que devem estar falando da gente, hein?

Lu: Que nós somos as mais lindas desse velório e que estamos acompanhadas por um gato, não é, primo?

Adalberto: Eu não tenho dúvidas de que vocês são as mais lindas daqui.

Ane: E eu, de que você é o cara mais gato.

Adalberto: Obrigado, lindona, mas a opinião de vocês tende a ser favorável a mim. E ai de você se não fosse assim.

Marjorie: A concorrência também é favorável a você, meu bem. Olha ali o Júlio César, o Tadeu, o Rogério, o Maicon, o Leonel, o Henrique e o Matias. Esses são os melhores daqui. Agora, você acha que algum deles está melhor do que você?

OK, a concorrência era favorável a mim. Mesmo assim, fiquei com o ego inflado.

Lu: É claro que não.

Sara: Adal, você, definitivamente é o galã desse velório.

Marjorie: E merecia ganhar uma coroa de flores por isso.

Adalberto: Estou fora.

Lu: Gente, eu também estou fora.

Marjorie: Como assim? Ninguém está falando de você.

Lu: A Marissérgia!

Ane: Aquela que descobriu que o marido ficou com você?

Lu: É mas ela acha que ele ficou com você!

Ane: Hã?

Lu: Ele sempre troca os nossos nomes.

Marjorie: Então, quem está em risco aqui é a Ane.

Ane: Ah, mas se ela vier tirar satisfação comigo, eu boto ele de frente com a Lu, e ele vai ter que falar na minha cara se fui eu mesma que fiquei com ele.

Lu: Aí, quem fica em risco sou eu.

Sara: Gente, vamos embora, porque essa história vai feder.

Lu: Vamos, porque só quem pode feder aqui hoje é o defunto!

Adalberto: É melhor. O cortejo já está para sair mesmo... Não quero ficar mais.

Marjorie: A tia Neide vai ficar?

Adalberto: Vai. Ela vai de carona com a tia Gorete e o tio Sonzinho.

Lu: Gente, vamos logo, senão vocês vão ter que arrumar um espaço para mim no caixão do tio Altair. A Marissérgia vai me matar se me vir aqui.

De lá, elas deram a ideia de irmos para um pé sujo beber. As pessoas que foram ao enterro do tio Altair voltaram a ser alvo dos nossos comentários felinos. Só perdoamos a minha mãe, o meu pai e o tio Altair.

E olhe lá!

Bronco-machão, fofo-bacaninha, sua derivações e a amizade das primas

Depois que me falaram que mulher só é amiga de mulher, que não é sua concorrente no quesito homem, entendi o porquê das minhas primas se darem tão bem. Estávamos num jantar megadespretensioso no La Fiorentina, no Leme, quando a Lu, que voltava do banheiro, deu o pontapé inicial pro assunto esclarecedor:

Lu: Gente, parecia que eu nunca mais ia parar de mijar... Também bebi tanta Coca Zero...

Ane: Ai, Lu, mulher não mija. Faz xixi!

Lu: Ai, eu, sei. Mas desde que eu comecei a ficar com o Ruy, peguei o hábito de falar assim, que nem ele...

Ane: O Ruy é aquele PM, que você ficou numa blitz?

Marjorie: Como assim?

Lu: Ele mandou eu encostar... O meu carro estava com o documento atrasado, e como eu não tinha um centavo pra dar de propina pro cara, eu dei pra ele!

Só ela e a Ane riram...

Marjorie: Meu Deus!

Adalberto: Uma senhora propina!

Ane: Mas é bom que fique claro que, se ela não quisesse, eu me encarregaria desse trabalho árduo.

Sara: Esse Ruy, hein! Devia ser bom.

Lu: Ah, nem fala, prima! O cara era muito bom! Foi muito bom, enquanto durou...

Adalberto: Mas já que o Ruy foi dessa pra uma melhor, é hora de uma mudança de hábito. Mulher faz xixi e homem mija. Tá combinado assim?

Lu: Está bem, Adal. Você adora me criticar.

Adalberto: Não é isso.

Sara: Primo, sabia que, às vezes, eu também me pego dizendo que vou ao banheiro mijar. Por causa do Oswaldo! Ele não acha feio comigo...

Marjorie: Porque ele é homem bronco-machão...

Sara: Eu gosto de homem bronco-machão.

Lu: Eu já gosto de quem parece fofo-bacaninha, mas é bronco-machão.

Sara: Ah, não! Pra mim, o cara tem que parecer bronco-machão e ser bronco-machão!

Marjorie: Eu já gosto do fofo-bacaninha genuíno.

Ane: E eu prefiro o que parece bronco-machão, mas que na verdade é fofo-bacaninha.

Adalberto: Mas o Ruy era o quê, então?

Lu e Ane: Bronco-machão.

Adalberto: Bronco-machão puro?

Lu: Puríssimo!

Ane: O cara é policial, né, primo?

Sara: Então, vocês precisam rever os seus conceitos, porque acabaram de falar que preferem outro estilo de homem.

Lu: A gente prefere, bonita, mas pra evitar uma multa, qualquer coisa tá valendo.

Blitz policial à parte, elas nunca vão brigar entre si por causa de homem. E que a amizade entre as minhas primas seja eterna, enquanto durarem as diferenças do sexo masculino!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Um Adalberto incomoda muita gente...

Há uns dois meses e meio, mais ou menos, eu estava tomando uma cachaça na Academia da Cachaça do Leblon com uns amigos, quando a Lu me ligou desesperada, sentindo pontadas fortes no coração. Apesar do falatório e da quinta cachaça que eu tinha tomado... Quinta? Não lembro. Enfim, eu consegui entender que a Lu estava sentindo pontadas fortes coração. Fui correndo pegar o carro. Nem lembro se paguei a conta. A Marjorie estava no Vegetariano Social Clube com um cara:

Marjorie: Adal!

Adalberto: A Lu tá morrendo!

Marjorie: O quê?

Adalberto: Você tá bem pra dirigir?

Marjorie: Não, mas ele tá. Demógenes, esse é o meu primo Adalberto.

Adalberto: Vamos, gente, é urgente!

Senti uma vontade louca de cantar a musiquinha, que sempre me vem à cabeça, quando conheço alguém com um nome fora do comum, como o meu. Enquanto corríamos pro carro, tentei esconder que estava rindo. Não cabia...

Marjorie: Tá rindo de que, seu louco?

Adalberto: Lembrei de uma besteira.

Marjorie: O quê?

Cheguei o mais próximo que podia do ouvido dela pra evitar que o carinha ouvisse:

Adalberto: "Um Adalberto incomoda muita gente // Um Adalberto e um Demógenes incomodam, incomodam muito mais".

Marjorie: Você tá proibido de voltar a beber nessa vida!

Sabe quando você ouve uma música podre e depois não consegue mais tirar ela da cabeça? Putz... Fui fazendo o sonzinho da música do "elefonte incomoda muita gente" do Leblon até Del Castilho, na casa Lu. É que tinham momentos em que eu abstraía completamente o que a gente estava indo fazer. O movimento gostosinho do carro e a cachaça faziam isso comigo... As tosses e os pigarros da Marjorie eram o que me traziam pra realidade.

Marjorie: É aqui. Estaciona ali, Demo.

Demo? Depois, ela não queria que eu risse...

Adalberto: Você sobe lá?

Marjorie: Subo. Vamos lá comigo, Demo.

Quando eles saíram do carro, vi que a Marjorie também ia ter um ataque do coração se visse o que eu estava vendo.

Adalberto: Jojô, volta aqui. Rápido! Demógenes o apartamento é o 406. Pega ela lá! Ela tá sozinha em casa.

Marjorie: O que foi, seu retardado? Tenho medo de quando você me chama assim.

Adalberto: E eu tenho medo da sua menstruação. Olha aqui o banco do carro.

Marjorie: Hã! Mas eu tô com absorvente e o Tampax.

Adalberto: Porra! Entra aí.

Marjorie: Pra onde a gente vai?

Adalberto: Vou esconder o carro do Demógenes ali no posto, você vai ficar limpando o banco e eu vou dizer que você sofreu um sequestro relâmpago.

Marjorie: Tá maluco?

Adalberto: Quer que ele veja o carro assim, todo cagado?

Marjorie: Não. Hoje é o nosso primeiro encontro.

Saí do carro, correndo pra frente do prédio da Lu. Fiquei um tempão lá embaixo esperando. O efeito da cachaça já tinha ido pro caralho. Eu acho... Esperei mais cinco minutos e resolvi subir. A Lu estava na maior discussão com o Demógenes. Será que eles desceram e não me viram lá embaixo? Será que ela achou que o Demógenes fez alguma coisa comigo e com a Marjorie? Arrombei a porta!

Lu: Adal!

Adalberto: Você tá bem?

Lu: Estava até esse cretino chegar.

Adalberto: Como assim? Você não estava sentindo pancadas fortes no coração?

Lu: Era de amor, primo. Você é tão inteligente e não entende uma metáfora?

Adalberto: Depois da quinta cachaça, eu não entendo mais nenhuma figura de linguagem. Não é só metáfora, não.

Aliás, quando eu fico bêbado, eu costumo falar inglês.

Lu: Tira esse cretino daqui! Foi ele que me sacaneou naquela viagem a Ouro Preto. Lembra que eu te falei?

Adalberto: Eu, não. O cara é legal, veio de Leblon pra cá, teve boa vontade de te pegar aqui... Pena que roubaram o carro dele e ainda levaram a Marjorie junto.

Lu: Mentira!

O Demógenes nem falou nada. Saiu varado. Foi confirmar a informação de um bêbado.

Lu: Vou ligar pra polícia!

Adalberto: Não! Liga pra Marjorie!

Lu: Por quê?

Adalberto: Porque é mentira. Você já tinha matado a charada! A gente escondeu o carro do Demógenes ali, no posto da esquina, porque ela sujou o banco do carro dele todo de mestruação.

Lu: Ai, que nojo.

Adalberto: Liga pra ela e manda ela suspender a limpeza. Diz que o cara não vale a pena.

Lu: Limpeza de quê?

Adalberto: Deixa que eu ligo. Alô, Jojô, para de limpar o banco do carro desse filho da puta. A Lu tá bem e tem altas histórias pra te contar dele. Parece que ele não presta... Sei lá, traz o carro de volta, diz pra ele que você, realmente, sofreu um sequestro relâmpago, mas apagou o bandido com uma gravatada, quando ele estava dirigindo e recuperou o carro... O sangue no banco? Sei lá. Fala que o teu anel cortou o pescoço do bandido, que ele desmaiou no teu colo e sujou a tua calça e o banco do carro. Pronto, vem logo! Beijo! Sua cagada!

Adalberto: Tadinha, ela estava limpando o banco do carro com um creme antirrugas e os guardanapos do Vegetariano Social Clube.

Lu: Ainda bem que, até hoje, a gente tem essa mania de levar guardanapo de restaurante pra casa, né primo.

Adalberto: Seja em Nova Iguaçu ou em Paris! Que fique bem claro!

Ficamos rindo da desgraça da Marjorie e de outras desgraças alheias. E, quando ela entrou no apartamento da Lu, já estávamos com a musiquinha na ponta da cabeça:

Lu e Adalberto: "Um Adalberto incomoda muita gente // Um Adalberto e um Demógenes incomodam, incomodam muito mais // Um Adalberto, um Demógenes e um ataque cardíaco da Lu incomodam, incomodam, incomodam muita gente // Um Adalberto, um Demógenes, um ataque cardíaco da Lu e uma menstruação da Marjorie incomodam, incomodam, incomodam, incomodam muito mais".

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O passeio antropológico à Via Show

Fomos eu, Ane, Lu e Marjorie ao aniversário da Babi, uma amiga das meninas da época em que a gente passava as férias de verão em Cabo Frio. Há mil anos atrás. Ela teve a coragem de comemorar a data na Via Show, em São João de Meriti. Mas como eu e as minhas primas já estávamos a fim de fazer um passeio antropológico há tempos, isso veio a calhar.

Adalberto: De que você tá rindo?

Marjorie: Da roupa daquela menina. Deve ser um vestido de casamento velho, que não serve mais.

Ane: O legal é que ela passou creme no cabelo molhado e, agora, está pingando uma água xexelenta nas costas dela.

Lu: Parece água de poço.

Marjorie: Que nojo.

Ane: Gente, olha a Babi dançando!

Adalberto: Ela se joga, né?

Lu: Muito! Sempre foi porra louca essa aí.

Marjorie: Porra louca sou eu. Aquilo ali foi porra louca até os 10 anos.

Ane: Dos 10 aos 20, virou piranha.

Marjorie: E dos 20 até hoje, ela tá vivendo a fase de rampeira de beira de estrada.

Adalberto: Ou seja, ano que vem, ela começa uma nova fase na vida dela?

Lu: Se ela estiver viva até lá, sim.

Ane: Mas vai ser para uma fase que a nossa mente não consegue alcançar.

Marjorie: Que nada! O pansexualismo está aí, querida! Acho que ela parte para essa nova empreitada.

A Lu, que se entretia com um cara, com quem se esfregava ardentemente, resolveu se manifestar:

Lu: Gente, ela só está se divertindo.

Adalberto: E, pelo visto, você também.

Marjorie: Gente, eu estou vendo isso? A Lu tá ficando com esse afrodescendentezinho de cabelo loiro?

Adalberto: Pois é. Eu também só vi isso agora.

Ane: Será que a origem dele é duvidosa?

Marjorie: Não sei. Só sei que duvidosa rima com perigosa.

Adalberto: Olha o preconceito!

Marjorie: Rima não é preconceito, Adal. É um dos elementos da poesia.

A gente mal começou a rir, quando um cara puxou o cabelo da Ane:

Ane: Ai!

Marjorie: Seu louco! Larga o cabelo dela!

Eu tive que segurar a bolsa da Marjorie, que já ia sendo arremessada na cabeça do rapaz.

Adalberto: Tá drogada? Quer morrer?

Passado o susto inicial, Ane já estava em plena harmonia com o suposto agressor.

Marjorie: Essa aí não tem vergonha na cara, né?

Adalberto: Deixa ela. Ninguém que ela conhece, tirando a gente, está vendo isso. Vamos dançar essa música do MC Marcinho, que é a melhor coisa que a gente faz.

E quando, finalmente, a Marjorie conseguiu transcender e se acabar no funk, o Celsinho Carmona, um de seus clientes mais importantes, tropeçou nela. Isso mesmo! Justo na hora que ela tinha acabado de rever todos os seus conceitos e foi com tudo até o chão. Detalhe: eu também estava nesse barco.

Marjorie: Celsinho!

Foi a única coisa que ela conseguiu proferir.

Celsinho: O que você está fazendo aqui no chão, menina?

Na minha opinião, a pergunta deveria ser: "O que você está fazendo aqui na Via Show, sua louca?"

Marjorie: Minha bolsa caiu.

Celsinho: Tudo bem?

Ela não se preocupava em outra coisa, a não ser se explicar.

Marjorie: Eu vim aqui pro aniversário de uma amiga, mas já estou louca pra ir embora.

Celsinho: Ah, legal.

Marjorie: É uma amiga de Cabo Frio.

Celsinho: Legal.

Era o máximo que ele conseguia responder. E continuava acrescentando novas informações sobre o nosso passeio antropológico.

Marjorie: A gente conheceu ela, quando íamos passar as férias de verão em família na Região dos Lagos. O pai dele tinha casa lá. Esse que é o meu primo Adalberto, que eu tanto falo.

Celsinho: Ah, legal! Tudo bem, Adalberto?

Adalberto: Tudo bem?

Celsinho: Vocês vieram sozinhos?

Adalberto: Nós?

Eu olhei pra trás, e vi que a Lu e a Ane continuavam atracadas aos seus respectivos e, antes de pensar em qualquer resposta...

Marjorie: Viemos sozinhos! Eu e o Adal só! Mais ninguém!

Celsinho: Legal! Eu vim fazer uma pesquisa de estilo para um filme, ambientado na favela.

Marjorie: Você já estava aqui há muito tempo?

Celsinho: Nossa, eu abri isso aqui praticamente.

O desespero bateu e Marjorie não conseguiu esconder a preocupação. Será que o Celsinho viu a gente descendo até o chão?

Marjorie: Jura que você chegou cedo aqui?

Celsinho: Para você ter uma noção, o bilhete da minha cerveja foi o de número 1.

A Marjorie deu uma risada muito da sem graça e tratou de mudar logo o rumo da prosa.

Marjorie: Vocês topam sair? Para mim, isso aqui já deu.

Celsinho: Vamos, sim. Eu só ia me despedir dos filhos da minha empregada doméstica, mas eles estão ali num beijo tão caloroso com umas meninas danadinhas, que eu não vou atrapalhar. Olha ali que baixaria, gente!

Eram os meninos mal encarados que estavam ficando com a Lu e a Ane!

Marjorie: E mesmo que você tentasse atrapalhar, eu não ia deixar. Deixa os meninos amarem, Celsinho! Vamos.

A Marjorie puxou o Celsinho pelo braço, como se ele fosse seu amigo há 300 anos. Eu segui eles dois até um determinado ponto e, sorrateiramente, fingi que me perdi. Sabia que a Marjorie ia entender que eu não podia deixar as minhas primas naquele lugar sozinhas com aqueles rapazes medonhos. Ela, com certeza, se encarregou de dar uma boa desculpa pro Celsinho, por eu ter sumido.

No mais, continuei me divertindo com tudo o que estava vendo por lá e, no meio da multidão, eu parecia apenas mais um.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

O passado e o marido da amiga de infância que condenam

Num domingo chuvoso, desses que não tem nada pra se fazer, fui pra casa da Sara, no Méier, pra passar a tarde com ela. O Oswaldo tinha ido almoçar com a mãe e ela se fingiu de doente pra não acompanhá-lo, porque não estava com saco de aturar a sogra fofoqueira. Ficamos vendo o vídeo dos 15 anos da filha da vizinha dela e morrendo de rir da breguice alheia:

Sara: Olha a dona Miloca! Lembra dela, Adal?

Adalberto: Gente, como ela tá diferente!

Sara: Como ela tá acabada, né?

Adalberto: Aquele ali é o Jaiminho?

Sara: Cadê?

Adalberto: Volta um pouquinho.

Sara: Ai, lá vem você me desafiar. Eu não sei mexer direito nesses controles remotos...

Adalberto: Me dá aqui... Ih, olha lá! É o Jaiminho, sim! Meu Deus, como a gente tá bem, em comparação a essa gente!

Sara: Eu falo com as meninas, mas elas não acreditam. A gente tá ótimo. Olha só! Todo mundo gordo, todo mundo acabado...

Adalberto: Lembra que a dona Miloca ficava uma arara quando diziam que a gente era bonito?

Sara: Nossa, ela ficava pra morrer. O povo só podia elogiar o Jaminho e a Edilena.

Adalberto: Que besteira, né? Pobreza de espírito... Ih, o seu Marcílio ainda tá vivo?

Sara: Ih, menino, esse homem aí não morre, não! Vaso ruim não quebra!

Adalberto: Ô homem chato!

Sara: Eu não me esqueço do aniversário da Aline, que eu saí pra levar um pedaço de bolo pro Marcelinho.

Adalberto: Nossa, é verdade... A Aline estava brigada com ele, né?

Sara: Foi! O seu Marcílio achou um abuso eu ter levado bolo pra ele. E não deixou eu entrar mais na festa.

Adalberto: Meu Deus, que memória boa!

Sara: Foi aí que você mandou ele enfiar a festa no olho do cu.

Achei graça de como a Sara lembrava das situações com riqueza de detalhes e de como eu fui uma criança abusada, quando era necessário.

Adalberto: Naquele dia eu fiquei com medo dele.

Sara: Eu pensei que ele fosse te bater.

Adalberto: E cão que ladra morde, por acaso?

Sara: Ridículo, né? A gente era tudo criança. O garoto, tadinho, passava fome, era pobre.

Adalberto: Era? Por quê? Ele se encaminhou na vida? Pensei que ele tivesse virado bandido. Alguém comentou comigo...

Sara: Mas ele virou bandido e já foi assassinado e tudo.

Adalberto: Mentira!

Sara: Isso já tem anos, primo.

Adalberto: A Carminha, então, ficou sozinha, né? A mãe e o pai morreram naquele acidente na Rio-Petrópolis e o irmão, assassinado. Que coisa, né? Será que isso é carma?

Sara: Não sei, Adal. E o pior que eu nem posso mais falar com ela.

Adalberto: Por quê?

Sara: Porque o Mandinho resolveu achar que eu sou piranha, só porque eu tô sempre com as minhas primas, que são solteiras.

Adalberto: E daí? Qual o problema disso?

Sara: Ele acha que mulher casada tem que andar com mulher casada. Aí, pra evitar que a mulher dele cruze com as meninas, ele nem deixa ela falar comigo mais.

Adalberto: Ai, o Mandinho é muito medíocre. Que besteira!

Sara: Ele já tinha proibido ela de falar com a Ivana, porque a ela fumava, lembra?

Adalberto: Lembro!

Sara: Pois é, agora, não deixa ela falar comigo, por que eu sou piranha.

A essa altura, o vídeo já tinha até acabado. Falar mal da vida alheia estava mais divertido e engraçado.

Adalberto: A Carminha, então, tá sem amiga, né?

Sara: Praticamente. Ela só anda com as mulheres dos amigos do Mandinho. Não é a mesma coisa...

Adalberto: Claro que não! Você, ela e a Ivana não se desgrudavam.

Sara: Lembra que a Lu morria de ciúme, quando eu estava com elas. Chegou a dar na cara da Carminha no sopão do Dia das Crianças, no bar do Julinho.

O nosso passado nos condena, mas, pelo menos, é incrivelmente hilário!

Adalberto: Óbvio que lembro. A Marjorie e a Ane também tinham ciúme de você com elas, mas conseguiam disfarçar.

Sara: Uma pena, né?

Adalberto: O quê?

Sara: Perder uma amizade assim, por causa de homem...

Adalberto: É verdade. Mas posso te falar uma coisa, prima, do fundo do meu coração?

Sara: Nossa! Claro que pode!

Adalberto: Pior é se você fosse a fumante!

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Segredo de carnaval: Ane é traída por Paula Burlamaqui

Na terça-feira de carnaval, foi só eu ligar o meu celular, por volta das 15h, que ele tocou:

Ane: Oi, primo, pode falar?

Adalberto: Agora, sim.

Ane: Tô ligando desde cedo, mas só dava desligado.

Adalberto: Mas eu estava com o telefone desligado mesmo.

Ane: Por quê?

Adalberto: Porque eu assisto aos deslifes e acabo trocando o dia pela noite. Aí, eu deligo o celular pra ninguém me acordar.

Ane: Tá perto do computador?

Adalberto: Não. Mas ele tá ligado, porque eu tô fazendo fazendo o download do filme do Lula.

Ane: Ai, primo, que coisa feia!

Adalberto: Coisa feia é roubar, matar, trair...

Ane: Foi pra mim isso, é?

Adalberto: Por quê? Você roubou, matou ou traiu alguém?

Ane: Não mas fui traída.

Adalberto: Mentira!

Ane: Juro. Me arrependi de não ter ido pra Bahia com a Lu e a Marjorie.

Adalberto: Esse eu nem tive tempo de conhecer...

Ane: Não seja por isso. Já tá em frente ao computador?

Adalberto: Já.

Ane: Entra aí no Google e coloca Rodrigo Peirão mais Paula Burlamaqui.

Entrei num site qualquer de fofoca e vi mais do que imaginava: o suposto namoradinho da minha prima beijando a Paula Burlamaqui (essa era a parte que eu já imaginava) e a uma outra foto da atriz, com a cara mais lavada do mundo, chegando ao mesmo camarote com o namorado, o ator Daniel Alvim (essa é a parte que a minha imaginação jamais iria alcançar).

Adalberto: É... Nesse carnaval, não foi só o Paulo Barros que revelou alguns segredos...

Ane: Viu o safado?

Adalberto: Pelo menos, ele não te trocou por qualquer uma, né?

Ane: Pelo menos, isso também não vai sair barato pra ela.

Adalberto: O carinha é modelo, né?

Ane: É. O ordinário é modelo, sim!

Adalberto: E por que você não foi com ele pro camarote?

Ane: Porque ele não me chamou. Ele falou que ia visitar a vozinha dele que tava doente.

Adalberto: Essa da vozinha doente é antiga e não cola. Toda vozinha tem, pelo menos, um problema de coluna, uma artrose, uma artrite... Ou seja, tem problema de sobra pra ter um netinho 24 horas ao seu lado.

Ane: O pior é que eu acreditei.

Adalberto: Vivendo e aprendendo. Da próxima vez que alguém te der essa desculpa, você manda ir pastar.

Ane: Mas eu não posso generalizar, primo. Não posso acreditar que todo homem é igual, senão eu não vou poder mais acreditar no amor.

Adalberto: Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Nem todo homem é igual. Mas os que dizem que vão ficar com a vozinha doente em pleno carnaval...

Não consegui terminar a frase... Nem de segurar o riso.

Ane: Não ri! Eu tô sofrendo...

Adalberto: Não, não fica assim, lindona! Minha mãe sempre diz que é melhor a gente ser vítima a algoz, porque a vítima vai ter sempre como se defender.

Ane: Porra, que otimista a tia Neide, hein!

Adalberto: Mas eu concordo com ela. Prefiro ser traído a trair, ter o tapete puxado a puxar de alguém...

Ane: Nossa, primo, assim você me entrega de bandeja que leu Polyanna e Polyanna Moça!

Adalberto: Sabe que não! A Erika, aquela minha amiga da faculdade que você conheceu, sempre me fala desses livros. Mas eles me aparentam obras de autoajuda travestidas de romance. Não gosto!

Ane: Eu a-do-ro livro de autoajuda!

Adalberto: Eu não tenho paciência. Eu sei que uns até funcionam, mas eu acho perda de tempo.

Ane: Eu acho que eles podem ser úteis.

Adalberto: Então, você não tem nenhum livro que te ajude a reagir de maneira inteligente a essa traição?

Ane: Pior que tenho.

Adalberto: E aí?

Ane: Não me ajudou em nada.

Adalberto: Tá vendo. Livro de autoajuda só serve pra quem escreveu. E quando serve...

Ane: As minhas amigas vão me sacanear tanto.

Precisei compará-la com a Paula Burlamaqui, como tentativa de tranquilizá-la. E pior que adiantou:

Adalberto: Pelo menos, o número de pessoas que te conhece é infinitamente menor do que o da atriz que ele ficou. Ou seja, ela, provavelmente, vai ser muito mais sacaneada do que você.

Ane: É verdade... Ai, primo, isso que você falou até que me deixou bem. Acho que já até consigo sair de casa. Vamos ao shopping? Preciso fazer compras pra ficar melhor.

Adalberto: Vamos!

Ane: Passa aqui pra me pegar? Tô com preguiça de dirigir.

Adalberto: A gente vai ao RioSul mesmo?

Ane: É! Aqui pertinho... Vou tomar banho. Quando tiver chegando, dá um toque no meu celular que eu desço.

Adalberto: Tá bom. Beijo!

Ane: Beijo, primo, te amo!

Eu não imagina que um comentário nada consolador seria mais eficiente do que um livro de autoajuda. Minha mãe sempre que diz que mulher não se veste pra homem, mas pras outras mulheres. É verdade! É verdade também que, na hora da traição, não é o homem o traidor, mas a mulher que ficou com ele. No caso da minha prima, o traidor chama-se Paula Burlamaqui. E viva as mulheres!

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Tarde com pudim de pão, Carolina Dieckmann e o caráter e a personalidade de um jornalista

O pudim de pão que a Lu fez com o resto de café da manhã, como ela mesma disse, não estava tão bom quanto o papo gostoso de fim de tarde no apartamento dela, em Del Castilho:

Marjorie: Eu não consigo entender esse tipo de homem que fica com você, diz que tá apaixonado, pega o número do teu telefone, te leva em casa, diz que vai sonhar com você pra não sentir saudade, quando estiver dormindo, e, no dia seguinte, de-sa-pa-re-ce!

Lu: Eu também não. Mas já fiquei tantos desse tipo, que já era pra eu ter desvendado esse mistério.

Ane: Pelo menos o meu jornalista tem me ligado...

Lu: Garota, me fala desse homem!

Ane: Então, gente, o nome dele é Emanuel Cordeiro, ele é jornalista e tem 33 anos. Por enquanto, só isso que eu sei dele.

Sara: Só?

Adalberto: Ficou inibida de fazer suas perguntas prum jornalista?

Marjorie: Não quis saber se ele tinha caráter e personalidade, prima?

Ane: Ai, gente, ele dispensa qualquer tipo de pergunta desse gênero. É claro que ele deve ter dinheiro e um bom carro zero.

Lu: Deve ter? Como assim deve ter? Você não viu com os seus olhos míopes e infalíveis, que essa terra há de comer?

Ane: Gente, ele pagou a minha conta lá da boate e foi embora pra casa de táxi. Deve ter dinheiro...

Sara: Ou quis te impressionar.

Adalberto: Será?

Ane: Eu acho que não. O cara é inteligente.

Adalberto: Vocês me desculpem, mas todo bom jornalista é inteligente!

Marjorie: Tá defendendo a sua classe! Inteligente não é sinônimo de rico, Adal!

Lu: Vocês viram a entrevista que a Carolina Dieckmann deu prum site?

Sara: Falam que ela metida...

Lu: Eu não acho. Ela tá sempre lá no salão e trata todo mundo muito bem. Deu até umas roupinhas que não servem mais pro José pro bebê da manicure.

Ane: Mas o que foi que ela falou, prima?

Sara: Ela disse que jornalista é pobre.

Lu: Não, não foi isso que ela falou. Ela disse que vai fazer uma jornalista pobre na próxima novela das oito.

Marjorie: Passione, do Silvio de Abreu. Eu tô fazendo umas bolsas pra uma personagem dessa novela. Esqueci o nome da atriz que vai usar...

Lu: É essa novela mesmo. Coitada. Foi dar essa entrevista e já deturparam o que ela disse.

Ane: Então, se deturparam, isso não quer dizer que jornalista é pobre.

Lu: Mas depois que o bafão foi gerado, o debate veio à tona. O negócio tá babado. Um monte de gente tá criticando ela.

Adalberto: Se ela tivesse falado mesmo que jornalista é pobre, não estaria mentindo. Jornalista rico a exceção que confirma a regra.

Marjorie: Se a atriz do elenco de apoio da novela das seis tivesse dito isso, não ia ter tanta repercussão. Esse negócio com a Carolina Dieckmann já tá virando perseguição. Que coisa mais chata que deve ser isso!

Adalberto: Concordo.

Ane: Ai, gente, será que o Emanuel é a exceção que confirma a regra?

Essa pergunta gerou uma série de novos comentários sobre homens, mentiras que não colam e celebridades que são vítimas da imprensa. Até que, numa busca rápida na internet (olha a que ponto chegamos!), descobrimos que o jornalista Emanuel Cordeiro foi demitido do site "Contamos tudo", como forma de represália à informação que ele deturpou, sobre a entrevista da atriz Carolina Dieckmann a um outro site.

Lu: Babado, hein!

Por mais impensadas que tenham sido, a Lu conseguiu resumir em duas palavras todas as nossas conclusões mais elaboradas sobre o pobre (de espírito, pelo menos) do Emanuel e os seus caráter e personalidade.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Prestadores de serviços de rua e suas consequências

Outro dia, assistindo ao BBB 10, o Bial perguntou se as mulheres casa já estavam menstruando no mesmo período. Aí, lembrei que não só o ciclo menstrual, mas as situações constrangedoras também acontecem ao mesmo tempo com mulheres que estão sempre juntas, como é caso das minhas primas... Ih, meu telefone:

Adalberto: Alô.

Ane: Primo, tô muito puta.

Adalberto: Por quê?

Ane: O carro da pamonha passou aqui na rua na hora que eu estava falando com o Amarildo no celular. Que vergonha! Eu desliguei na cara dele e agora não sei o que faço...

Cinco minutos depois:

Adalberto: Alô.

Marjorie: Primo, eu quero virar uma ema e enterrar a minha cabeça no chão.

Adalberto: O que é que aconteceu?

Marjorie: Sabe o Osmar? que ficou de me ligar pra gente sair desde o começo do mês?

Adalberto: O do New Civic azul turquesa?

Marjorie: Não. Esse é o Miguel. O Osmar é o do Corolla azul piscina.

A maioria dos caras que a Marjorie fica tem um carro muito foda de alguma tonalidade de azul.

Adalberto: Claro que lembro!

Mó mentira!

Marjorie: Logo hoje que eu vim na Ilha do Governador, resolver uns problemas, ele me liga.

Adalberto: Mas ele marcou de te encontrar agora?

Marjorie: Não, mas quando eu saí do cartório, um garoto maldito botou a cabeça pra fora de uma kombi e gritou: Peixaria, saída da Ilha, Bonsucesso, Praça das Nações: o preço do ônibus! Parecia que o recado era pra mim, primo!

Adalberto: Mas o Osmar sabe que não é pra você...

Marjorie: Mas ele ficou rindo.

Adalberto: E você? Fez o quê?

Marjorie: Desliguei o celular de vergonha.

Um minuto e meio depois:

Adalberto: Alô.

Lu: Primo, você não vai acreditar!

Adalberto: Será? Olha que, de você, eu sei que nada é impossível...

Lu: Lembra do Marquinho? Aquele cara que eu conheci no show da Alcione?

Adalberto: Acho que sim.

Lu: Sabe o vassoureiro que passa aqui na rua?

Adalberto: Hummm, já sei! Passou na hora que você estava com o ele ao telefone, gritando: vassoureiro, vassoureiro!

Lu: Não. O Marquinho é o vassoureiro!

Quase me mijei de tanto rir. Pena que tive que desligar pra atender a ligação da Sara, que aparecia como chamada em espera:

Sara: Adal, aconteceu uma coisa muito estranha.

Adalberto: O que foi, Sarita?

Sara: Eu estava discutindo com o síndico daqui do prédio...

Adalberto: Pra variar, né?

Sara: Não, escuta... Dessa vez era coisa séria. Ele estava me cobrando o condomínio de outubro, como se eu não tivesse pagado...

Adalberto: E aí?

Sara: Aí, que ele começou a me destratar no telefone.

Adalberto: Mentira!

Sara: Tô te falando... Ele me deixou tão perturbada da cabeça, que eu disse que só teria sossego na vida, quando ele morresse.

Adalberto: E aí? O que foi te falou?

Sara: Nada. O amolador de facas estava passando aqui na rua...

Eu não consigo acreditar que aquela máquina barulhenta de amolar facas tenha o poder exterminador de almas. Uma tia minha sempre corre pra pegar um terço, quando ouve o zumbido desse catreco, na segunda gaveta da cômoda, do quartinho dos fundos, da casa dela (já até sei!). O fato é que, pior do que as outras primas, que ficaram chupando dedo, foi Sara, sentindo-se culpada pela morte do vizinho, que, dias depois, descobrimos: ele só tinha batido o telefone na cara dela. Continuava vivinho da Silva.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

O rotavírus, a cagada e o Sunglass da Ane

Foi na manhã de um sábado como outro qualquer. Eu estava dormindo, quando o celular tocou. Cancelei a chamada, porque achei que era o despertador do aparelho. Mas na segunda vez, já conseguia discernir que era uma ligação que insistia em acabar com a minha paz.

Adalberto: Alô!

Ane: Primo, tô aqui na Praia do Pepê. Vem me buscar agora!

Adalberto: Ane, eu acabei de acordar.

Ane: É urgente. Caso de vida ou morte.

Adalberto: Olha, se esse for caso de vida ou morte, igual a vez que você estava precisando de um rímel, eu te mato!

Ane: Primo, eu tô toda cagada.

Adalberto: Como assim?

Ane: O tal do rotavírus, lembra?

Adalberto: Meus Deus! Só vou colocar uma roupa. Me espera aí.

Ane: Ó, pega uma roupa para mim também. Essa aqui eu vou ter que jogar fora.

Adalberto: Está bem. Beijo!

Ane: Corre!

Lá no Pepê, debaixo de um sol impiedoso, encontrei minha prima jogada na areia.

Adalberto: Garota, o que você está fazendo sentada aí?

Ane: Vim abafar o cheiro de merda.

Adalberto: Está aqui a roupa que você me pediu. Onde você vai trocar?

Ane: Ali no banheiro do quiosque. Mas, antes, eu vou me lavar no mar.

Adalberto: E por que não foi antes?

Ane: E se você não viesse? Tu é mó furão, pô.

Adalberto: Vai logo, então.

Ela parecia um pinto no lixo se lavando no mar. Ficou uns bons 15 minutos lá. Depois, trocou de roupa no quiosque, jogou a roupa cagada fora e fomos pro meu carro.

Adalberto: Adorei você com camiseta masculina e bermuda de tactel.

Ane: Não ri. Ficou melhor do que aquele vestido cagado.

Adalberto: Agora, dá para você me contar o que você veio fazer aqui, no Pepê, àquela hora da manhã?

Ane: Vim atrás Sunglass.

Adalberto: De quem?

Ane: Do Sunglass. Sun-glass!

Adalberto: Ah, você está namorando um óculos escuro agora?

Ane: A gente não está namorando ainda.

Adalberto: E por que você veio tão cedo pra cá?

Ane: Eu queria conversar com ele, antes dele ir surfar.

Adalberto: E cadê ele?

Ane: Ele não veio surfar hoje.

Adalberto: Que merda!

Ane: Ai, primo, nem me fale em merda, que me dá dor de barriga de novo.

Adalberto: Para com isso! Meu carro tá limpinho.

De repente, fomos surpreendidos:

Sunglass: Meu amor!

Ane gaguejou de nervosismo.

Ane: O-oi! Onde você estava? Já tinha me visto aqui antes?

Sunglass: Não. Passei mal a noite toda e acordei tarde. Comi um camarão que não me fez muito bem. Acordei com mó dor de barriga, mas já passou.

Ane: Dor de barriga? Que coisa! Esse aqui é o meu primo, Adalberto.

Sunglass: Belezinha?

Adalberto: Tudo bem?

Sunglass: Era tu que estava na areia com uma louca, que foi correndo pro mar de calcinha e sutiã? Eu vi de lá d quiosque. Morri de rir.

A Ane me deu um beliscão daqueles e eu entendi o recado.

Adalberto: Eu? Não, não era eu não.

Sunglass: Cara, que viagem! Tinha um maluco igualzinho a você, com uma roupa parecida com a tua lá com a maluca.

Adalberto: Mas não era eu, não. Vocês se confundiram.

Sunglass: Podes crer. Já fumei tanto hoje, que devo estar fazendo confusão.

E, assim, descobri que minha prima estava ficando com um surfista maconheiro. Não consegui disfarçar a preocupação.

Adalberto: Cara, você usa drogas?

Pareceu a piada mais engraçada do mundo. O Sunglass não parava de rir. E isso me irritou profundamente.

Sunglass: Cara, tu é muito engraçado.

Adalberto: Eu?

Ane: Ah, ele é superengraçado, sim!

Recebi outro beliscão. Mas não entendi o recado desse. Será que era pra eu confirmar que era, sim, superengraçado ou pra eu ir embora? Fiz os dois.

Adalberto: Eu não ia falar, mas já que você tocou no assunto... Eu sou humorista. Aliás, tenho que ir agora. Vou participar de um quadro no Faustão.

Sunglass: Caraca, no Faustão?

A Ane não entendeu nada. Acho que ela estava acreditando. Acho também que, em vez de humorista, eu poderia investir na carreira de ator.

Adalberto: É, aquela competição de novos humoristas.

Sunglass: Pô, muito legal!

Ane: Muito, né?

Adalberto: Muito mesmo!

Se fosse verdade, não seria tão engraçado! Senti uma vontade louca de me rolar de rir no calçadão.

Sunglass: Agora que eu caso com essa menina, meu brother! Com um primo desses... Quero ver se vai ficar famoso e esquecer dos amigos...

Adalberto: Nunca! Ó, você mora aqui, ó, no coração.

Sunglass: Pô, valeu! Valeu mermo, pô! Abraça aqui, abraça aqui!

Eu, minha prima e o Sunglass nos demos um abraço triplo. Foi bizarro mas é mais uma história daquelas, que a gente guarda na manga pra contar num bar. Fui embora achando a vida uma comédia. E minha prima garantiu esse namoradinho por umas boas semanas. Graças a mim.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Um emprego que vale por uma dieta ou a mesada do marido que engorda?

Numa tarde de sexta-feira, de um dia que consegui sair mais cedo do trabalho, eu já ia tirar um cochilo de meia-horinha, antes de ir pra academia, quando o telefone tocou. Pela bina, vi o que era o número da Sara. Juro que pensei 300 vezes, antes de atender:

Adalberto: Alô.

Sara: Que voz é essa?

Adalberto: Tô cansado. Acabei de chegar do trabalho.

Sara: Adal, você vive cansado, hein! Nem parece que tem 29 anos.

Adalberto: Eu não fico o dia inteiro em casa sem fazer nada.

Sara: Eu não trabalho fora, mas ajudo a Lucy aqui em casa.

Adalberto: Quem dera se eu tivesse uma empregada...

Sara: Seu apartamento é tão pequenininho. Em dois tempos você limpa tudinho aí.

Adalberto: Sara, por que você me ligou?

Sara: Ai, nem te conto.

Adalberto: Então, tá. Vou tirar um cochilo, antes de ir pra academia.

Sara: Não! Espera! Fui ao shopping hoje.

Adalberto: Legal. Queria eu ter tempo de ir ao shopping nos dias de semana.

Sara: Primo, meu manequim aumentou um número. Pulei de 38 pra 40.

Adalberto: E aí?

Sara: Eu não comprei nada! Não vou comprar roupa com o manequim maior que o meu pra não acomodar.

Adalberto: Mas, agora, 40 é o seu novo manequim.

Sara: Adal, eu preciso arrumar um emprego! Não posso ficar em casa o dia inteiro sem fazer nada.

Adalberto: Mas você não acabou de me dizer que ajuda a Lucy na limpeza?

Sara: Mas não é todo dia, né? Eu preciso ir pra rua, ter horário, responsabilidade... Em casa, eu como toda hora. Numa firma, eu ia ter mais controle.

Adalberto: É verdade. No trabalho, a gente quase não tem tempo pra comer.

Sara: Então, primo, isso que eu quero: não ter tempo pra comer.

Adalberto: Você quer arrumar um emprego ou quer emagrecer?

Sara: Uma coisa completa a outra.

Adalberto: E o Oswaldo?

Sara: Acho que ele vai gostar da ideia.

Adalberto: Ah, vai! Ele não vai mais precisar te dar mesada.

Sara: Será?

Adalberto: Eu acho que sim.

Sara: Tá falando sério?

Adalberto: Tô.

Sara: O que você acha de vigilante do peso?

Adalberto: Uma amigas conseguiram emagrecer bastante.

Sara: Jura?

Adalberto: Já mudou de ideia?

Sara: Não quero perder a minha mesada.

E, assim, aquela avidez por conseguir emprego se esvaneceu de uma maneira recorde. Mas eu ainda quis provocar.

Adalberto: A auxiliar administrativo lá da empresa vai entrar em licença-maternidade e vão precisar de alguém pra substituí-la por seis meses.

Sara: Está bem.

Adalberto: A supervisora dela me pediu indicação.

Sara: Está bem, primo. Se eu souber de alguém, eu te falo.

Ela nunca mais tocou no assunto "trabalho" comigo. E parece que esqueceu de cumprir a promessa de ir a um vigilante do peso. E pelo que eu tenho visto, ela vai ao shopping TODA semana comprar roupa. Ao que me parece, ela aceitou bem o manequim 40.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O carinha do caldo de cana com pastel e a conta, por favor

Outro dia, fui ao UCI com a Lu ver um filme, que já nem me lembro mais de tão ruim que era. Era alguma coisa, certamente, vai levar o Framboesa de Ouro. O chope, depois da sessão no TGI Fridays, sim, merecia o Oscar de melhor colarinho. Ela me falava do Fransérgio, um cara que ela conheceu abastecendo o carro.

Adalberto: Mas ele é frentista?

Lu: Não.

Adalberto: Atendente de loja de conveniência?

Lu: Não.

Essa era minha última chance. Eu ia ter que pagar a conta do TGI Fridays, caso não adivinhasse, em três tentativas, o que o bendito do Fransérgio fazia num posto de gasolina.

Adalberto: Astronauta da Nasa.

Lu: Eu não ia ter essa sorte. Ele trabalha no lava a jato.

Adalberto: Ué, não foi você mesma que disse que, agora, só queria homem com dinheiro?

Lu: Mas ele é o dono da máquina de lava a jato.

Adalberto: Um microempresário!

Lu: Ai, nem fala que eu já me via passando flanela em carro, primo.

Adalberto: Ai, que lindo... Mas por que não rolou?

Lu: A família dele é muito porca.

Adalberto: Sério?

Lu: A gente almoçou na casa da mãe dele, com um monte de gato em cima da mesa.

Adalberto: Nossa!

Lu: E detalhe: eles deixavam os gatos comerem no prato com eles.

Adalberto: Você deixou um gato botar a boca no seu prato?

Lu: Óbvio que não!

Adalberto: Que bom que não me decepcionou.

Lu: A irmã dele limpou a unha com a ponta da faca, que ela usou pra cortar o meu pedaço de melancia pra mim. Que nojo!

Adalberto: E você comeu?

Lu: Eu já tinha dito que melancia era a minha fruta preferida...

Adalberto: Blurgt!

Lu: O pai dele caça pombo pra vender pra terreiro de macumba.

Adalberto: Que assassino de merda! Que família maldita essa!

Lu: Primo, aquilo lá é a hora da morte.

Adalberto: O Fransérgio não tem culpa de ter uma família assim, prima. Você não pode julgar o cara, por causa desses parentes sem noção.

Lu: Mas posso julgar um cara que me chama pra comer fora e me leva pra tomar caldo de cana com pastel?

Adalberto: Pode! Ele fez isso?

Lu: No dia seguinte.

Adalberto: Mas ele é um microempresário. Não tem dinheiro pra pagar um almoço decente?

Lu: Ele tá duro. A máquina de lava a jato quebrou e ele me pediu dinheiro emprestado pra comprar uma nova.

Adalberto: Jura?

Lu: Juro, primo.

Adalberto: E o que você fez?

Lu: Eu paguei a conta do caldo de cana com pastel, porque ele não tinha nenhum centavo e fui embora pra casa chorar.

E eu paguei a conta do TGI Fridays, que me saiu bem mais cara, mas fui pra casa rindo.