terça-feira, 29 de outubro de 2013

Mãe é tudo. E filho não vale nada

Ontem, à tarde, eu estava em casa deitado no sofá, pegando no sono, quando a minha mãe me ligou.

Adalberto: Alô.

Neide: Oi, meu filho, que voz é essa? Tá tudo bem?


Adalberto: Tá... É que eu tô com sono, aqui no sofá, ouvindo a televisão.

Neide: Ah, meu filho, queria te pedir um favor. Me leva no mercado rapidinho? É que eu tenho que comprar umas frutas pro lanche, que vai ter na igreja amanhã.

Adalberto: Mãe, me desculpe, mas vou ficar te devendo essa.

Neide: Poxa, que maldade! Eu faço tudo por você e pela tua irmã e, quando chega a minha vez, é sempre assim. Tô cansada de vocês.

Adalberto: Mas, mãe, só porque eu tô cansado e não quero te levar no mercado?

Neide: Não. Porque você nunca faz nada por mim!

Minha mãe é muito exagerada. Ela precisa parar de assistir novela mexicana urgentemente!

Adalberto: Eu não faço nada por você?

Neide: Não. Mas deixa estar... Vou ligar pro Edemésio. Ele, com certeza, vai me levar lá.

Adalberto: Se você já tinha certeza disso, por que não ligou pra ele antes, nãe?

Neide: Porque eu tenho filhos. Mas meus filhos não valem nada.

Adalberto: Mãe, é melhor você ir lá. Não quero brigar com você e tô cansado.

Neide: Tchau. E, se precisar de mim, você vai ver só o que eu vou fazer.

Adalberto: Beijo, te amo.

Pior que, depois disso, perdi o sono e senti uma fome de leão. Queria pedir uma pizza, mas, em pleno fim de mês, não tenho dez reais na minha conta.

Até que seria uma boa ir ao mercado com a minha mãe, hein... Mas eu não podia ligar pra ela, depois da nossa pseudobriga.

O telefone tocou, e eu tinha certeza que era ela, ligando pra me pedir desculpas. Atendi na pressa, sem ver que, na verdade, era a Marjorie que estava me ligando.

Adalberto: Fala, mãe linda!

Marjorie: Que mãe, garoto? Sou eu, Marjorie?

Adalberto: Oi, Jojô. Nem vi que era você. É que eu estava falando com a minha mãe, achei que fosse ela.

Marjorie: Ai, nem me fale em tia Neide. Tô fugindo dela.

Adalberto: Ela quer que você a leve no mercado também?

Marjorie: Não. Quem dera se fosse isso.

Adalberto: O que aconteceu?

Marjorie: Garoto, eu fiquei com o Edemésio.

Adalberto: Como assim? O Edemésio é seminarista da igreja dela. Você sabia disso, né?

Marjorie: Então, eu sabia. Mas não sabia que eles não podiam ficar com outras pessoas.

Adalberto: Claro que não. O cara tá estudando pra ser padre! Padres não podem casar, esqueceu?

Marjorie: Não. Mas eu não sabia que, enquanto o cara não virasse padre, não podia curtir a vida.

Adalberto: Mas pode curtir a vida. Contanto que não tenho sexo no meio.

Marjorie: Ai, eu quero me matar. Ele só me contou isso, depois que a parada acabou.

Adalberto: Ele não é bobo, né? Quando foi isso?

Marjorie: Hoje. Encontrei com ela na padaria, aí, ele veio aqui pra casa e só saiu agora. Foi pedir dispensa da igreja

Adalberto: Mentira! Minha mãe ia ligar pra ele agora. Vai ficar passada.

 Marjorie: Vai querer me matar.

Adalberto: Não sei se vai querer te matar, mas ela mistura as coisas, né? Por mais que ele tenha seguido uma vontade dele, ela vai achar que você influenciou. Ih, meu celular tá com chamada em espera. É ela. Vou atender aqui.

Marjorie: Me defende, primo.

Adalberto: Deixa comigo.

Atendi cheio de autoridade.

Adalberto: Fala, mãe.

Neide: Oi, meu filho, o Edemésio não vai poder me levar.

Adalberto: Ah, não. Por quê?

Neide: Então, tô arrasada com Edemésio. Ele não vale nada. Ai, meu filho, quebra um galho pra mim. Me leva no mercado. No caminho eu te conto.

Adalberto: Claro minha linda. Mas eu tenho uma sugestão melhor. A gente vai ao mercado e, depois, a gente conversa em algum lugar. Vamos conversar dignamente, sentados. Eu sinto falta disso.

Neide: Ótima ideia, filho. O que você sugere?

Adalberto: Ah, sei lá. Você que sabe.

Neide: Vamos, então, no churraquinho do Diógenes?

Adalberto: Ah, não, mãe. Vamos comer pizza?

Neide: Tá bom. Em quanto tempo você chega aqui?

Adalberto: Quinze minutos.

Mas, se dependesse da minha fome, eu me teletransportaria.

Minha mãe não conseguiu segurar e começou o desabafo já no carro. Descobri que o Edemésio não citou a Marjorie em momento algum. Até que o cara tem seu valor.

Na pizzaria, eu parecia uma draga. Só tive noção do tanto que comi, quando a conta chegou. Dei o golpe da carteira e minha mãe, a melhor do mundo, pagou sem reclamar. Só me deu um esporrinho, porque concluiu que, se eu esqueci a carteira em casa, provavelmente, teria esquecido a carteira de motorista junto.

Adalberto: Não, tá aqui comigo. Eu já deixo ela em cima da minha cômoda pra nunca esquecer, quando sair de casa.

Neide: Ah, tá...

Não sei se convenci. Mudei logo de assunto.

Adalberto: E agora? O que o Edemésio vai fazer?

Neide: Voltar pra cidade dele lá no Nordeste. Ele me disse que volta amanhã.

Adalberto: Ah, tá.

Tadinha da Marjorie. Perdeu o seminaristazinho.

Neide: Agora vê, né? O menino me enganou. Achei que era boa gente. Ainda bem que eu tenho os meus filhos.


Mãe é tudo. E filho não vale nada.

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