quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ano Novo com muita flor e dor

Eu tinha três grandes festas para passar o Ano Novo, mas, depois da notícia da gravidez da Sara, eu decidi passar a noite da virada com ela. Ane, Lu e Marjorie aderiram a minha ideia.

Sara: Na sua casa mesmo, Adal. Assim, a gente evita a família do Oswaldo.

Adalberto: Então, tá. Vou sair pra comprar umas flores pra casa não ficar com cara de hospital.

Sara: Falando em flores, lembrei que eu tenho que regar o jardim daqui de casa. As bichinhas estão quase morrendo.

Adalberto: Como assim? Antes a gente tinha que travar você pra não matar as coitadas de tanta água...

Sara: Primo, a gravidez me deixou com perda de memória recente.

Adalberto: Ih, tá igual a mim, então.

Sara: Mas você não tá grávido.

Adalberto: É. Dois a um pra você. Amore, deixa eu ir lá, porque eu tenho que... O que eu tenho mesmo que fazer?

Sara: Comprar flores pra enfeitar o apartamento, seu louco.

Adalberto: Estava só testando a sua memória. Até que você tá bem.

Sara: Cachorro!

Adalberto: Te amo.

Comprei flores de todas as cores. A decoração tinha tudo pra ficar brega. Mas tudo aconteceu da hora que eu saí da floricultura até a meia-noite.

A tacada inicial quem deu foi a Ane:

Adalberto: Alô.

Ane: Primo, tô passando muito mal.

Adalberto: Tá sentindo o quê?

Ane: Muita dor e enjoo.

Adalberto: Mas você tem ideia da origem disso?

Ane: Tenho. Das flores que eu comprei pra jogar pra Iemanjá.

Adalberto: Ane, você voltou com essa história maluca de ficar comendo flor?

Ane: Foi só ontem.

Adalberto: Quantas você comeu?

Ane: Uma dúzia.

Adalberto: Meu Deus! Assim, você vai morrer.

Ane: Eu acho que isso já tá acontecendo, primo. Não dizem que, quando tem nascimento numa família, ele vem acompanhado por morte?

Adalberto: quem falou essa besteira?

Ane: Não sei. Mas foi alguém em algum enterro de algum conhecido.

Adalberto: Aí, só ficou na sua mente seletiva a parte ruim.

Ane: É. E se tem três bebês a caminho da vida na barriga da Sara, devem ter três parentes nossos a caminho da morte. E talvez eu seja um deles.

A Ane adora fazer drama. E eu não costuma dar a menor importância pra isso. Mas, dessa vez, ela conseguiu me deixar com medo.

Adalberto: Tô indo aí, agora, te buscar pra te levar prum hospital.

Era uma infecção alimentar. As flores que ela comeu não devem ter sido regadas por água potável. Eu fiquei lá com ela, enquanto as gotas do soro, que ela tomava na veia, pingavam a velocidade frenética de uma tartaruga. Nisso, a Marjorie entra na sala, numa maca, arrastada por uma enfermeira.

Marjorie: Vocês por aqui?

Adalberto: Eu é que pergunto. Você por aqui?

Marjorie: É. com dezessete pontos na perna esquerda.

Adalberto: O que é que você aprontou, Jojô?

Marjorie: O meu barquinho de oferendas pra Iemanjá não queria entrar pra dentro do mar. Fui conduzi-lo na direção certa e, quando vi, tinha sido arrastada pela correnteza.

Adalberto: E aí?

Marjorie: Aí que eu fui salva por aqueles helicópteros dos Bombeiros.

Adalberto: Meu Deus, que loucura!

Ane: Bem mais do que comer um monte de flor e passar mal.

Marjorie: Sua maluca, voltou a comer flor?

Ane: Foi só uma fraqueza. Me fala de você: pegou o telefone do salva-vidas?

Marjorie: Não, garota. Não deu. Eu cortei a minha perna numa pedra. Estava sangrando tanto, que eu não tinha forças pra dar mole pro salva-vidas. Pior que ela era um gatinho.

Ane: Ai, que pena, prima.

Marjorie: Pois é. Pelo menos, agora, eu tenho uma meta pra 2011. Ir atrás do carinha que salvou a minha vida.

Adalberto: Pelo que eu tô vendo, daqui vocês vão direto pro hospício.

Ou será que era a mim que elas estavam deixando maluco?

Ane: Adal, pega meu telefone ali na bolsa. Tá tocando. Atende pra mim.

Adalberto: Alô.

Sara: Primo, tô aqui há horas tentando falar com você.

Adalberto: Caramba, deixei meu celular no carro.

Sara: Eu fui picada por uma abelha, quando estava regando as flores. Tô aqui morrendo de dor. O Oswaldo tá num churrasco com os amigos e também não tá atendendo o telefone. Me ajuda.

Putz. A maldição do dia acabava de ganhar nome: Flor. Mandei ela pegar um táxi e ir pro hospital, onde eu já estava com as outras meninas. Assim, facilitava o meu trabalho.

Sara: Eu tô sem um centavo. O Oswaldo não me deixou um puto.

Adalberto: Eu pago aqui. Vem logo.

Graças a Deus ela foi atendida rapidamente e os bebês estava fora de perigo.

Com as três na sala de emergência do hospital e a duas horas do Ano Novo, senti falta da Lu. Não que eu queria que ela também estivesse com algum problema de saúde, mas porque, até aquela hora, ela não tinha sequer me ligado pra saber se tinha que levar, pelo menos, uma rabanada pra ceia.

Adalberto: Ane, vou usar o seu celular aqui rapidinho. Ligar pra Lu.

Lu: Adal, eu quero matar você, seu filho da...

Adalberto: Agora já era, seu imprestável. Só atende as minhas ligações quando quer. Se eu morresse, você ia ser o maior culpado.

Adalberto: Onde você está?

Lu: Não vou te falar. Se você se interessasse mesmo por mim, teria me atendido quando eu te liguei.

Adalberto: Meu amor, eu esqueci o meu telefone no carro. Tô aqui no hospital com a Ane, a Sara e a Marjorie. Quer ocasião pior pra passar o reveillon?

Lu: Quero.

A voz dela parecia tão próxima.

Lu: Quero você tendo que cuidar de mais uma enferma, seu safado. Olha pra trás agora!

Era ela mesma. Materializada em cima de uma maca, sendo empurrada por uma plácida enfermeira. Parecia cena de filme.

Adalberto: Como assim?

Lu: Nem te conto.

Marjorie: Gente, eu não tô acreditando nisso.

Ane: Nem eu.

Sara: Eu tô chocada.

Adalberto: Deixa eu resumir o caso delas pra você: Ane foi comeu uma dúzia de flores e teve infecção alimentar; Marjorie foi jogar flores pro mar, se afogou e ainda cortou a perna numa pedra; e Sara foi regar as flores do jardim e foi picada por uma abelha. Ou seja, se o seu caso não tem nada a ver com flores, retire-se dessa sala.

Lu: Querido, eu mereço uma maca king size. O meu problema dá de mi, a zero no delas.

Adalberto: Mas, se não tiver nada a ver com flor, não tá valendo.

Lu: Calma.

Ela não queria chocar a enfermeira. Quando ficamos a sós naquela sala de emergência, veio a notícia:

Lu: O carinha que eu estava ficando. Aquele que eu eu não sabia se colocava que estava num relacionamento sério ou enrolado no Facebook, lembra, Adal?

Adalberto: Sei. O entregador de pizza.

Lu: Não.

Adalberto: Entregador da farmácia?

Lu: Não, garoto!

Adalberto: Ele não é entregador?

Lu: É. Mas é de galão de água, seu burro.

Ane: Tá, Lu, conta logo.

Marjorie: É. Que saco vocês dois.

Sara: Até eu já estava aqui me irritando.

Lu: Então, ele queria jogar flores no mar pra Iemanjá.

Adalberto: Iemanjá também tá sendo o último grito da moda nesse hospital.

Ane: Não é?

Marjorie: Fala, Lu.

Lu: Menina, aí ele saiu tarde do trabalho e não conseguiu oferecer as flores lá pra santa. Fiquei com uma peninha dele. Aí, falei: bom, hoje, vou fazer uma surpresa legal pra esse menino.

Adalberto: Medo.

Lu: Eu coloquei uma flor na minha coleguinha, em homenagem as flores qeu ele ficou de oferecer pra Iemenjá.

Marjorie: Que homenagem doida é essa, garota?

Lu: Foi o que veio a minha mente.

Adalberto: Já ouvi de você coisas piores. Pula essa parte e fala logo como você veio parar aqui.

Lu: Se eu pular essa parte, voce não vai saber.

Ane: Então, continua.

Lu: A flor tinha espinhos. Que eu esqueci de tirar.

Sara: Você se rasgou toda?

Lu: Garota, eu fiquei arregaçada. Ele estava no elevador e eu ainda não tinha colocada a flor lá. Na pressa, acabei enfiando tudo muito rápido. Nem percebi os espinhos. Quando vi, era só sangue.

Adalberto: Meus Deus.

Lu: Mereço ou não mereço a melhor maca dessa emergência?

Sara: Maluca.

Marjorie: Claro que merece, prima. Você arrasou. Tô até com vergonha do que aconteceu comigo, depois dessa sua.

Ane: Eu dou a minha maca pra você, se for o caso. Você é a nossa rainha.

Lu: E você, Adal? Não tem nenhuma história emocionante com flor?

Adalberto: Não. Eu só saí de casa pra comprar umas flores pra enfeitar a minha casa, que estava parecendo um hospital de tão fria e básica, e vim parar aqui.

Marjorie: Ou seja, você tá em casa.

Adalberto: Praticamente.

De repente, a enfermeira entrou na sala com umas flores na mão.

Enfermeira: Gente, já é meia-noite. A chefe do plantão me pediu pra entregar essas flores pra vocês e desejar um feliz Ano Novo.

Adalberto: Querida, faz o seguinte: fica com as flores pra você, leva pra casa, dá pra outras pessoas, sei lá. A gente vai acatar, apenas, o feliz Ano Novo.

E que 2011 seja sensacional pras minhas primas!

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