segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Marjorie comemora fim de relacionamento com mangueirense na quadra do Salgueiro

Fui contra a minha vontade pro sítio do carinha que a Marjorie estava ficando há umas duas semanas. Ela fez chantagem emocional e eu caí na armadilha. Se bem que, no dia, tentei pular fora do barco:

Marjorie: Como assim desistir?

Adalberto: Você não tinha me falado que esse evento seria praticamente um ensaio técnico de carnaval da Mangueira. Você sabe que eu odeio a Mangueira.

Marjorie: Quem falou que vai ser um ensaio da Magueira?

Adalberto: Você.

Marjorie: Eu disse que o pessoal de lá é todo mangueirense e que era provável que ia rolar muito samba.

Adalberto: Samba da Mangueira, claro.

Marjorie: E daí?

Adalberto: Praticamente um ensaio técnico de carnaval da Mangueira, ué.

Marjorie: Garoto, você tá maluco? Não foi você que disse que não ia mais alimentar rivalidade boba contra flamenguistas, paulistas e argentinos?

Adalberto: Foi.

Marjorie: Esqueceu que você dizia que não gostava de mangueirense, porque todo mangueirense é flamenguista?

Adalberto: Esqueci. Mas você me lembrou e eu decidi que não tenho mais nenhuma desculpa pra não ir no sítio do Cleilton.

Que merda.

Para minha surpresa, os mangueiresnes-flamenguistas estavam ouvindo MPB, conversam sobre política, tomavam vinho e tinha filhos muito bem educados. Um cenário que o meu preconceito jamais poderia imaginar. Eu nem me lembro se, em algum momento, tocou algum samba.

Marjorie: Tá gostando?

Adalberto: Não.

Marjorie: Por quê?

Adalberto: Só tem casal com filho aqui.

Marjorie: Pois é. Tenho que fazer o meu urgentemente. Tô me sentidno um peixe fora d´água.

Adalberto: E eu tô me sentindo um estudo de caso.

Pro meu azar, o Poodle Toy do Cleilton veio brincar comigo. Poucas coisas conseguem ser mais irritantes do que um Poodle Toy.

Cleilton: Que bom que você arrumou um amiguinho.

Adalberto: Tá vendo?

O pior é que quanto mais brinco com um Poodle Toy, mais gosto do ser humano.

Marjorie: Adal, o Fluc é lindo, né?

Adalberto: Eu não acho. Tô brincando com ele por mera conveniência.

Marjorie: Quer alguma coisa pra comer? Uma carne, um pão de alho, um queijo coalho...

Adalberto: Quero ir embora.

Marjorie: Já?

Adalberto: Pelo amor de Deus.

Marjorie: Só mais meia-horinha.

Adalberto: Quinze minutinhos.

Eu sabia que meia-horinha da Marjorie significava uma hora.

Marjorie: Tá bom.

Meia-hora depois, fui chamá-la.

Marjorie: Eu já ia te chamar. Tá na hora, né?

Adalberto: Tá.

A despedida foi uma das experiências mais desgastantes da minha vida. Entre apertos de mãos e dois beijinhos, fui obrigado a ouvir comentários, que davam conta de que eu estava cometendo a maior das vilanias, em tirar minha prima da companhia do namorado.

Eu não estava tirando a minha prima da companhia do namorado. Eu estava fazendo aquilo por mim.

No carro, achei que a Marjorie fosse querer me matar. Mas, pra minha surpresa, ela me agradeceu:

Marjorie: Adal, muito obrigado por me tirar dali.

Adalberto: Ué, você nãos estava gostando?

Marjorie: Não.

Adalberto: Não?

Marjorie: Não.

Adalberto: Mas pareceu que sim.

Marjorie: Garoto, o Cleilton fica o tempo todo me observando. Eu não podia demonstrar a verdade. Fora que ele sabe fazer leitura labial.

Adalberto: Jura?

Marjorie: Ele trabalha com investigação criminal.

Adalberto: Ele te falou se eu cometi algum crime ali?

Marjorie: Você deu osso de galinha pro Fluc.

Adalberto: Ele viu isso?

Marjorie: Viu.

Adalberto: Mas só foi isso de errado, né?

Marjorie: Não. Você limpou a mão de gordura na piscina, jogou gordura de carne no telhado da vizinha e nunca fechava o isopor direito, cada vez que pegava uma lata de cerveja.

Adalberto: Caramba, ele reparou nisso tudo?

Marjorie: Não só nisso tudo. Ele achou meu vestido muito curto, reclamou do jeito que eu desprezava uma mulher que chamava o marido de pai e cismou que eu estava dando confiança pro marido de uma loura velha que estava lá.

Adalberto: O seu vestido, realmente, é curto. Mas ele não tem nada a ver com isso. Desprezar uma pessoa que chama o marido de pai é mais do que correto.

Marjorie: Não é?

Adalberto: Só ficar dando confiança pra outro cara, que pode ser considerado ilícito, mas se o Cleilton se revelou um babaca questionador, e a mulher do cara, além de loura velha, é chata, eu não te condeno.

Marjorie: Brigada, primo. Por isso que eu te amo.

Adalberto: Pra onde a gente vai agora?

Marjorie: Pra quadra do Salgueiro.

Adalberto: Sério?

Marjorie: Muito sério. Vamo comemorar o fim do meu relacionamento com o babaca-questionador-mangueirense-flamenguista.

Senti alguma coisa de vingança no ar, além de uma dose bem fraca de preconceito. Mas confesso que adorei a ideia de ir pra quadra do Salgueiro.

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