sexta-feira, 4 de maio de 2012

Credibilidade do carioca arruina Projeto Pegação de Ane

Na terça-feira, foi feriado do Dia do Trabalhador e choveu pacas no Rio. Mesmo assim, fui com a Ane à praia.

Ane: Adal, não é muita loucura nossa ir à praia, debaixo desse temporal?

Adalberto: Loucura é esse tempo, que discrimina o trabalhador.

Ane: Primo, a Natureza sabe o que faz.

Eu concordo com essa máxima. Mas, como eu estava de ovo virado, quis discordar de tudo o que vinha pela frente.

Adalberto: Ane, a Natureza não sabe de bosta nenhuma!

Ane: Ih, que pessoa amarga.

Chegamos à praia e constatamos que não éramos os únicos loucos. Havia dois loucos se banhando no mar gélido de Ipanema.

Ane: Aquele lá não é o seu amigo espanhol, que veio morar no Brasil há pouco tempo?

Adalberto: O Miguel?

Ane: Isso.

Adalberto: Ih, é ele mesmo. Vamos lá.

Ane: Mas a água não está gelada?

Adalberto: Melhor essa água gelada do que ficar dentro de casa.

Mergulhamos. E quase morremos congelados.

Adalberto: Ane, você está se afogando?

Ane: A minha batata da perna ficou dura, e eu estou sentindo muita dor.

Adalberto: Isso é cãibra.

Ane: Então, me tira daqui! Eu não estou conseguindo me mexer!

O Miguel e o outro espanhol, que eu não conhecia, me ajudaram a salvar a Ane de um princípio de afogamento. Enquanto carregávamos a minha prima para a areia, o Miguel cuidou das apresentações.

Miguel: Adal, esse é o meu amigo José Luis Fernández, de Madri. Veio passar férias no Rio.

Adalberto: Muito prazer, querido. Depois que a gente terminar de carregar a minha prima, eu aperto a sua mão.

José Luis: Claro.

Colocamos a minha prima deitada na areia e uma pergunta mudou todo o rumo da prosa.

José Luis: Ela está afogada? Eu sei fazer respiração boca-a-boca.

Adalberto: Não. É só uma cãibra.

Levei um beliscão e mudei o discurso.

Adalberto: Olha, José Luis, acha que ela se afogou, sim.

O Miguel ficou me olhando com cara de "como assim, ela não está com cãibra?", mas eu o ignorei solenemente e continuei com a ajuda à prima necessitada.

Adalberto: Você tem como fazer uma respiraçãozinha boca-a-boca nela? Coisa rápida.

Quando eu minto, apelo para os diminutivos. Não sei, parece que ameniza.

José Luis: Claro.

A Ane, inexperiente em receber respiração boca-a-boca, acabou colocando a língua onde não devia. E o espanhol espertinho não demonstrou o mínimo de estranheza. Afogou a minha prima de saliva madrilenha.

Miguel: Eles estão se beijando?

Adalberto: Parece que sim, Miguel.

Quando deu por si que a cena do beijo já estava ficando meio over, José Luis resolveu disfarçar.

José Luis: Acho que, agora, ela está bem.

Adalberto: Você acha? Eu tenho certeza.

Ane: Mi español, você salvou a minha vida. Eu te amo.

Adalberto: Como assim? Gente, ela fica doida depois que se afoga e fala coisas sem sentido. Vamos embora, Ane.

Ane: Mentira. Gente, eu não estou louca. Miguel, passa lá em casa depois para tomar um cafezinho. vai com ele José Luis.

José Luis: Claro.

Miguel: Pode deixar, queridinha. A gente vai, sim. Em duas horas estaremos na sua casa.

Passou-se duas, três, quatro e nada dos espanhóis.

Adalberto: Estranho... Os espanhóis são tão cartesianos. Se você marca com eles às oito e dezessete, você pode ter certeza que eles vão estar às oito e dezessete no lugar combinado.

Ane: Então, será que o José Luis não gostou de mim?

Adalberto: Não sei. Pode ser tudo, Ane.

Depois de meia-hora, ouvindo as possibilidades que saíam da cabeça neurótica da Ane, resolvi ligar para o Miguel, para saber o que aconteceu.

Miguel: Alô.

Adalberto: Miguel, a gente está esperando vocês até agora aqui na casa da Ane. Você disse que iam chegar em duas horas, e até agora nada.

Miguel: Ah, dessa vez era verdade?

Adalberto: Como assim?

Miguel: Eu já fui convidado para uns dez cafezinhos, desde que vim morar no Brasil. Mas, quando chegava na casa das pessoas no horário combinado, ou não tinha ninguém pronto muito menos cafezinho ou não tinha ninguém em casa. Não confio mais nos cariocas.

Adalberto: E o José Luis.

Miguel: Foi sair com uma menina.

Adalberto: Ah, está ok.

E desliguei o telefone, assim, sem contestá-lo à altura.

Quem ele pensa que é? E quem ele pensa que eu sou? E a minha prima? Esse tal de José Luis pensa que é fácil sair beijando, assim, na praia e depois desaparece?

Eu devia ter enumerado um monte de defeitos dos espanhóis. Mas nada me veio à cabeça. Vai ver eles não têm defeitos. Ou os defeitos deles são tão pequenos que passam despercebido.

Adalberto: Ane, eu devia ter dito alguma coisa nesse sentido! Que eles são tão insignificantes, tão pequenos, que não se destacam nem pelos seus defeitos.

Ane: Adal, mas isso é bem coisa de carioca, primo. Achar que é O CARA, porque tem defeitos maiores que os outros. Isso é um erro, primo.

Pior é que mais uma vez, eu concordo com a Ane. Mas, como eu ainda estava de ovo virado, respondi como um carioca, no maior sentido pejorativo, que essa palavra pode ter.

Adalberto: Verdade. É um erro. Mas eu não tenho dúvidas que nós cariocas somos OS CARAS.

E não me apedrejem por isso! Eu só estava fora de mim...

Adoro todas as naturalidades do Brasil e do mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário