A Lu me ligou anteontem esbaforida. Fiquei
preocupado. Achei que alguma coisa de muito grave tinha acontecido.
Adalberto: Você está bem?
Lu: Mais ou menos. Só você
pode me ajudar, primo.
Medo.
Adalberto: Fala, amore.
Lu: O meu relacionamento não
vai nada bem.
Adalberto: Ué, você está namorando
alguém? Não sabia.
Lu: O Edineido, Adal. Eu te apresentei.
Adalberto: Mas você disse que usava
bermuda larga, deixando o cofrinho à mostra, andava gingando e te chamava de “mermão”.
Isso não está mais te incomodando?
Lu: Claro que está.
Adalberto: Então! Já vai em boa
hora.
Lu: Adal, o Edineido é o que eu tenho para hoje... Para
amanhã, para sexta-feira, para sábado... Até eu arrumar alguém melhor.
Adalberto: E o que você quer de
mim?
Lu: A Simone vai participar do Concurso Perna Carioca 2012.
Adalberto: Ih, bem lembrado. Ela me
falou que ia, sim. É amanhã, né?
Lu: Pois é, Adal. Esse ano o concurso vai
premiar a 1º lugar com uma viagem para Porto
de Galinhas. Eu tenho certeza que ela não vai. Ela sempre dá para alguém da
família.
Adalberto: E esse ano, se ela
ganhar, ela vai dar para mim.
Lu: Na, na, ni, na, não!
Quer dizer, você vai mesmo querer ir? Eu soube que lá nem está tão legal
assim...
Adalberto: Em Porto de Galinhas? Está de
sacanagem com a minha cara, né? Porto
de Galinhas é incrível o ano
todo, meu bem.
Lu: Adal, mas eu preciso salvar o
meu relacionamento. Eu deixei a página de um site de relacionamento aberta lá
em casa e o Edineido viu.
Adalberto: Esse cara, além de te
chamar de “mermão”, está mexendo nas suas coisas sem a sua autorização?
Lu: Não. Eu autorizei. Ele
queria ver o e-mail dele e eu deixei. Só me esqueci que o computador estava
ligado e com a página do site aberta.
Adalberto: E aí?
Lu: Ele viu tudo. Me chamou
de vagabunda para baixo.
Adalberto: Jura?
Lu: Pô! Se eu te contar...
Adalberto: Melhor não.
Lu: Adal, me ajuda. Para salvar a
minha relação, eu disse que já tinha comprado uma viagem para nós dois.
Adalberto: O como é que você já
conta com o ovo na rabo da galinha? Sabe se a Simone vai ganhar?
Lu: Ela ganha todo ano.
Adalberto: E se ela não me der o
prêmio? Desistir, mudar de ideia, hein?
Lu: Até parece. Se ela te
prometeu, ela vai te dar. Aliás, ela te deve isso há muito tempo. Você sempre
elogiou as pernas dela.
Adalberto: Viu como eu não estava
enganado? Ela vive ganhando o 1º lugar do Perna
de Carioca.
Lu: Adal, eu preciso ir no teu
lugar.
Adalberto: Pô, Lu, eu precisava relaxar.
Lu: Vai para um spa, tira
uns dias de folga e fica na casa da tia Neide,
medita, sei lá, tem tanta coisa para você fazer...
Adalberto: E você? Não pode arcar
com o que você disse?
Lu: Não. Esse mês eu estou
dura. Ser madrinha da filha da Sara foi uma das piores coisas que
aconteceu na minha vida. Já comecei a pagar a primeira prestação do empréstimo
que eu fiz para ajudar na festa.
Adalberto: Eu também peguei
empréstimo para ajudar na festa, esqueceu?
Lu: Não. Mas eu estou com o
meu relacionamento por um fio, eu fico um saco quando fico sem homem e você é o
que mais sofre com isso.
Realmente, a Lu, quando não tem um homem
para regar a sua plantinha, fica insuportável. E eu sou um dos que mais sofre
com as variações de humor dela. Ela me liga de cinco em cinco minutos para
chorar pitangas.
Cedi. Mas fiz uma
condição. Nada nessa vida pode ser tão fácil.
Adalberto: Olha, eu vou te dar.
Mas, em troca, quero um saco de Serenata
de Amor.
Lu: Te entrego amanhã. Você
vai no concurso, né?
Adalberto: Claro. Vou prestigiar
minha prima.
Lu: Hum, bobalhão! Se eu não
tivesse interesse na vitória dela, ia torcer para ela cair no chão e ficar com
a perna toda roxa.
Adalberto: Para com esse ciúme
bobo! Aliás, você, Ane, Sara e Marjorie têm que entender que eu tenho outras
primas também.
Lu: Mas nós somos as
favoritas. E, do grupo, eu sou a que tem destaque no teu coração.
Adalberto: Ah, eu não sabia...
Lu: Cachorro!
Cheguei com uma hora de
antecedência ao concurso. Não aguentava mais a ansiedade da Lu... A minha prima Simone estava linda. Foi aplaudida de pé. Ela
era de longe a dona das pernas mais bonitas do concurso. Os anos passam e ela
continua parecendo que está de meia-calça.
Para a minha triste
surpresa e ira da Lu, a
minha prima ficou em segundo lugar no concurso. E ganhou duas fantasias para
desfilar no carnaval do ano que vem pela Beija-Flor.
A menina, que ficou em terceiro lugar, ganhou um ursão daqueles que só têm a
função de ocupar espaço em cima de uma cama.
Lu: Caraca, e agora?
Adalberto: Como é que pode a minha
prima perdeu para aquela garota da perna arcada?
Lu: Adal, me ajuda! O que eu faço
com o Edineido?
Adalberto: Diz que você ficou
menstruada e não vai poder viajar. E em troca, sugere de desfilar no carnaval.
Lu: Adal, isso não é o samba do
crioulo doido, não. É a minha relação que está em jogo. De mais a mais, eu ia
agendar a minha viagem para amanhã. E ele sabe que eu não estou mais
menstruada. Eu estava na semana passada.
Adalberto: Lu, eu te falei para não contar
com o ovo...
Lu: Adalberto, cala a boca!
Adalberto: Com certeza. Porque se
eu falar mais alguma coisa, vou te mandar para um lugar que você não vai
gostar. Bom, vou ali dar parabéns para a minha prima.
Lu: Parabéns? Ele merece
levar um tapa na cara bem dado.
Ignorei esse comentário
dela, peguei o meu saco de Serenata
de Amor e deixei a Lu sozinha.
Minha prima estava
recebendo os cumprimentos de vários amigos, parentes e fãs indignados com o 2º
lugar.
Adalberto: Ficou chateada?
Simone: Claro que não. Com a
minha idade, esse segundo lugar vale muito. Eu já não sou mais uma menina. Não
tenho mais vinte e poucos. Nem trinta e poucos. Eu tenho quarenta e...
Adalberto: Abafa.
Simone: Só
não gostei de você ficar sem a sua viagem.
Sem a viagem eu já iria
ficar mesmo...
Adalberto: Mas vou desfilar no
carnaval do ano que vem pela Beija-Flor!
Simone: Ah, vai mesmo! São suas
as fantasias. Leva quem você quiser.
Adalberto: Obrigado.
Simone: O pessoal está a fim de
comer alguma coisa na Cobal do
Humaitá. Vamos dar um pulinho lá?
Adalberto: Claro. Só vou pegar o
meu carro, que eu deixei a quilômetros daqui para evitar de pagar o
estacionamento caro, e encontro e vocês lá.
Simone: Combinado.
Quando eu estava entrando
no meu carro, vi que a dona da perna arcada desceu de um táxi na esquina
em que eu estava e, logo em seguida, um carro chegou ao local para buscá-la.
Era o Gilmar Barreto. O
dono do Concurso Perna Carioca!
Fui atrás do filho da mãe.
E acho que ele desconfiou de mim. Ou não. De repente, pensou que era tentativa
de assalto. Eu sei é que, quando ele percebeu que o meu carro o seguia, ele
disparou. E eu fui atrás. Parecia perseguição de filme policial. Eu estava me
sentindo o cara. Costurando no trânsito como ninguém, dando altos
cavalinhos-de-pau, tirando a maior onda... Até que eu bati num poste e lembrei
que o seguro do meu carro estava vencido. Aí foi que eu me enfureci. E
incorporei o “tira da pesada”. Fiz sinal para um táxi, dei um soco na cara do
motorista, que ficou desacordado, tomei a condução do veículo e voltei a
protagonizar o meu filme de ação.
Foram várias as manobras
mirabolantes e as cantadas de pneu.Tudo para não ter que aturar a carência
insuportável da Lu quando fica solteira.
De repente e sem nenhum
por que, o carro do Gilmar parou. Nós estávamos numa pista livre,
não tinha ninguém na nossa frente. Concluí que ele estava se rendendo, com medo
de mim. E me achei o cara mais incrível do mundo, o pica das galáxias. Fui até
ele.
Adalberto: Desistiu de fugir?
Gilmar: Não. A gasolina acabou.
Mesmo assim, continuei me
achando o cara.
Adalberto: Agora entendi por que
ela ganhou o Perna Carioca 2012...
Gilmar: Cala a boca!
Adalberto: Você sabe que eu posso
contar para todo mundo da relação de vocês dois?
Gilmar: O que você quer?
Adalberto: A viagem para Porto de Galinhas e o conserto do meu carro. E eu fico
de bico fechado.
Gilmar: Só isso?
Adalberto: Ué, não é muito?
Ele riu e eu fiquei sem
graça.
Ele me entregou um
envelope, as passagens e a reserva do hotel, que a perna arcada tinha ganhado e
me deu um cheque bem gordo para eu consertar o meu carro. Ia sobrar dinheiro
para eu ir para Porto de
Galinhas com a Lu e o Edineido.
Saí no lucro! Yes! Minha história já podia acabar ali.
Gilmar: Se precisar de mais
dinheiro, me apresenta a nota fiscal do serviço que eu te reembolso.
Ele falou isso, porque
sabia que não ia faltar.
Adalberto: Está bem. Obrigadão, Gilmar.
Por pouco, não mandei um
“te amo” para ele.
Voltei para o táxi feliz
da vida, me achando o todo poderoso do filme policial que eu criei. Mas, a essa
altura, o taxista já tinha acordado e estava furioso. Ele me enfiou a porrada e
levou com ele o prêmio da perna arcada, o cheque que o Gilmar me deu e o meu saco de Serenata de Amor.
Eu queria me matar. Mas
não passava nenhum carro àquela hora para eu me jogar na frente. Resolvi voltar
para casa, depois de quase ficar desidratado de tanto chorar.
Agora, tenho que pagar o
conserto do carro e aturar a carência da Lu.
Saí no prejuízo.
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