quarta-feira, 25 de maio de 2011

Ane é pega pra Cristo na palestra do peguete sem noção

Fui com a Ane buscar um carinha no aeroporto, que ela achava que ia ser o homem da sua vida:

Ane: Adal, ele não é um carinha. É o Crisóstomo.

Adalberto: Ah, tá. Você fala como se conhecesse ele.

Ane: Mas eu conheço.

Adalberto: Ane, você ligou pro serviço de telemarketing do seu cartão de crédito e ligação caiu por engano no escritório desse cara.

Ane: A gente conversou durante uma hora.

Adalberto: E só por isso você acha que conhece ele bem?

Ane: Claro. Ele me contou a vida dele toda.

Adalberto: Jura?

Ane: Sabe quando você sente que encontrou o cara da sua vida?

Adalberto: Não.

Ane: Sei lá, parece que foi um encontro de outras vidas.

Adalberto: Sei...

Ane: Então, é isso.

É... Durante todo o trajeto de ida ao aeroporto eu não parava de me perguntar como eu fui capaz de perder o meu tempo, indo buscar um cara que a Ane só tinha falado por telefone e que eu sequer conhecia.

No aeroporto, tivemos que passar pela situação constrangedora de levantar uma plaquinha com o nome do Crisóstomo. Sempre senti vergonha alheia pelas pessoas que faziam isso nos aeroportos. E, naquele momento, viver esse experiência, pra mim, foi algo no mínimo MUITO humilhante.

Fomos surpreendidos com um susto:

Crisóstomo: Rá! Sou eu o Crisóstomo. Tudo bem, linda-fofa?

Ane: Tudo, fofo-lindo.

Que ridículo! Eles já atinham até uma maneira própria de se chamar.

Crisóstomo: Você é o Adal?

Adalberto: Adalberto.

Crisóstomo: Já ouvi muito sobre você.

Despois dessa, não parei de me perguntar que diabos a Ane falou com o Crisóstomo, durante a única hora que eles se falaram em toda a vida. Será que foi só de mim?

Ane: Fofo-lindo, você tá com fome? Quer comer alguma coisa?

Crisóstomo: Não, linda-fofa, a palestra vai ser daqui a pouco eu ainda tenho que arrumar um uniforme pra vocês...

Fingi que não ouvi.

Crisóstomo: : Mas dá tempo de tomar um café. Rá! Tô brincando, Adal. Eu sei que você não odeia café.

Nem odeio. Apenas, não gosto. Inclusive, nos dias de estresse no trabalho, eu costumo tomar café. Não achei a menor graça nesse Crisóstomo: ...

Crisóstomo: : Tô brincando. Quer um suco de melancia? Eu sei que você adora melancia.

Realmente, melancia é a fruta que eu mais gosto. Mas eu desprezo, solenemente, um suco dessa fruta.

Adalberto: Tem como a gente ir embora daqui? Eu to com um pouco de pressa.

Crisóstomo: Embora? A Ane me disse que você tirou folga no trabalho, só pra vir me buscar com ela.

Dessa vez, a resposta dele estava 100% correta. Eu é que sou o erro!

Ane: Fofo-lindo, não vai tomar nada?

Crisóstomo: Não, fofa-linda, brigado. Lá, perto do auditório, a gente toma alguma coisa.

Paramos numa loja de uniformes. Lá, eu descobri que eu e a Ane íamos trabalhar na recepção do evento.

Adalberto: Como assim?

Ane: Adal, pelamordedeus, você não pode fazer isso comigo.

Adalberto: Quem ele pensa que é? O meu chefe? E você? Tá pretendendo ocupar a vaga de namorada ou de empregadinha dele?

Ane: Adal, ele vai pagar a gente pelo serviço. É só ficar parado lá, recebendo as pessoas.

Adalberto: Não quero.

Ane: Eu conversei com ele. Ele me falou que, além da diária, te dá um saco de Serenata de Amor.

Adalberto: Tá bom. Diz pra vendedora que o número da minha calça é 38.

No auditório, recebi muitas outras responsabilidades, além de só ter que ficar parado, recebendo as pessoas.

Crisóstomo: Cadê o pessoal com o lanche coffee brake?

Adalberto: Estão atrasados.

Crisóstomo: Como assim atrasados? Isso é resposta? Liga pra lá agora e reclama da falta de profissionalismo e respeito deles. Mas grita com essa gente. Nada de perguntar com educação. Essa gente não merece educação. Ouviu?

Adalberto: Sim, senhor.

Pois é, quando dei por mim, estava de cabeça baixa e respondendo “sim, senhor” ao imbecil do Crisóstomo.

Crisóstomo: Então, liga agora! Tá esperando o quê?

Adalberto: Tá. Eu vou ali fora ligar.

Crisóstomo: De jeito nenhum! Liga aqui na minha frente. Quero ver você esbravejando com essa gente irresponsável.

Adalberto: Tá.

E, enquanto eu discava o número do serviço de buffet no meu celular (isso mesmo, eu tive que ligar do meu celular), tive a sorte do aparelho dele tocar.

Crisóstomo: Crisóstomo Fradvawsky Consultoria e Treinamentos em Segurança do Trabalho.

E essa foi a maneira mais bizarra, que eu já vi alguém atender o seu celular pessoal. Uma tia, por muito menos, me irritava. Ela atendia dizendo “eu”. Isso é maneira de atender telefone? Bom, agora eu vejo que pode não ser a mais adequada, mas é bem melhor do que Crisóstomo Fradvawsky Consultoria e Treinamentos em Segurança do Trabalho.

Crisóstomo: Fala Sueli. O quê? E isso é resposta? Não tem? Então, se vira! Eu não posso fazer o seu trabalho. Liga pra todos os meus contatos agora e tenta conseguir isso com a influência do meu nome. E só me retorna quando estiver com tudo certo.

Enquanto eu falava com o pessoal do buffet com a maior educação, escondido do Crisóstomo, a Ane corria na minha direção.

Adalberto: Onde você estava?

Ane: No térreo, falando com o pessoal da brigada de incêdio.

Adalberto: Como assim? Tá pegando fogo aqui?

Ane: Não, garoto. É só pro caso de uma emergência.

Adalberto: Mas por que você tá assim, ofegante, desesperada?

Ane: Porque todos os extintores de incêndio estão vencidos. Tô com medo de falar isso pro Crisóstomo. Fala com ele pra mim, Adal.

Adalberto: Eu? Tá louca? Já tomei o meu megaesporro do dia. Eu não tô preparado emocionalmente pra aturar outra crise do Crisóstomo. Agora, é a sua vez, babe.

E, do nada, fomos surpreendidos pelo nosso ditador:

Crisóstomo: O que foi que vocês estão falando aí, hein?

Adalberto: Oi? Você estava aí?

Crisóstomo: Já ligou pro serviço de buffet?

Adalberto: Já. Dei mó esporrão neles.

Crisóstomo: E aí?

Adalberto: Estão a caminho.

Mentira. O rapaz, que me atendeu, informou que ia o carro da entrega ia sair em 15 minutos e me pediu mil desculpas pelo atraso. Eu disse que não tinha problema nenhum. E ainda fui megaeducado com ele, claro.

Crisóstomo: E o pessoal da brigada de incêncio?

Ane: Ah, tá tudo certo. Eles já voa trazer os extintores de incêndio.

Crisóstomo: Tá tudo no prazo de validade?

Ane: Tudinho.

Putz...

Crisóstomo: Eu vou ao vestiário trocar de roupa. Adalberto, tem umas pétalas de rosa, que caíram de uns arranjos. Dá mais uma varridinha lá. Ane, não esquece que os brindes com a caixa verde são para as mulheres e os que vêm a caixa azul são para os homens. Não quero ninguém sem brinde. Adalberto, não esquece de ligar a iluminação debaixo mesa e de acender a luz da platéia, sempre que eu receber aplausos. Isso acontece o tempo inteiro. Fica atento. E não deixa de colocar a câmera no tripé. Não preciso te dizer pra apertar o botão "on" na hora da apresentação, preciso?

Adalberto: Não, senhor.

Crisóstomo: Ane, linda-fofa, eu esqueci de assinar os certificados de participação. Toma aqui a minha carteira de identidade e copia minha assinatura . São só trezentos certificados. Adal, ajuda ela nisso.

Porra, Lei Áurea pra quê, né?

Na hora da apresentação, por mais incrível que isso possa parecer, TUDO estava dentro dos conformes. Só a minha coluna que não.

Depois que todos os participantes entraram, saímos da recepção às pressas para ocupar os nossos postos de serviço dentro do auditório. A Ane foi cuidar de passar os slides e eu fiquei responsável por controlar a iluminação espetaculosa e da filmagem da palestra do Crióstomo.

Lá dentro, o que eu vi foi uma baboseira sem limite.

Crisóstomo: Então, como eu disse pra vocês, eu venci graças ao meu suor, competência, dedicação, esforço, empenho, trabalho justo, inteligência, humildade...

Blá, blá, blá, blá, blá, blá... Se a intenção dele era de motivar, a mim, ele conseguiu IRRITAR PROFUNDAMENTE. Que babaca narcisista!

Enquanto isso, a Ane não parava de atender as ligações pro Crisóstomo. Eu contabilizei pelo menos umas 15 vezes, que ele interrompeu a apresentação para mandar a pobre coitada atender ao celular.

A última ligação foi, sem o menor exagero, EXTREMAMENTE HUMILHANTE.

Ane: Oi, ele tá ocupado agora, dando palestra.

Crisóstomo: Vê quem é. Se for o Dissógenes eu atendo.

Ane: Quem tá falando? É o Benzalieu. Ele tá dizendo que o seu voo pra Minas foi cancelado . Quer saber se você pode ir na parte da noite?

Crisóstomo: Pergunta pra ele se eu sou alguma negas dele.

Ane: Oi?

Crisóstomo: É isso mesmo que você ou viu. Anda! Pergunta se eu sou alguma das negas que ele se esfrega por aí. Anda! Vou esperar você falar, anda!

Ane: É, senhor Benzalieu, é que o Crisóstomo...

Crisóstomo: Doutor Crisóstomo!

Ane: É... o doutor Crisóstomo gostaria de saber se ele é alguma das senhoras afrodescendentes, com as quais o senhor se relaciona.

Que lindo a Ane tentando ser politicamente correta...

Crisóstomo: Fala direito com essa ameba. Pergunta pra ele do jeito que eu te falei, sua anta! Anda!

Ah, não! Xingar a minha prima, assim, na frente dos outros?

Confesso que fiquei impressionado com a rapidez do meu instinto maldoso. Eu sei é que, quando dei por mim, estava tacando fogo no carpete do auditório. Na hora, eu não pensei no risco em que coloquei aquelas 300 pessoas. Só queria acabar com a raça do Crisóstomo.

Apesar de não termos podido contar com um único extintor de incêndio, por sorte, ninguém ficou ferido. O auditório inteiro pegou fogo e o Crisóstomo foi responsabilizado por essa displicência. Os diplomas todos foram queimados. E, com eles, a única prova do crime que eu e a Ane cometemos.

O caso, segundo me informei depois, tomou uma certa repercussão no mercado em que o infeliz atua, e a Crisóstomo Fradvawsky Consultoria e Treinamentos em Segurança do Trabalho perdeu todos os contratos que já tinha fechado. Bem feito!

O lance do extintor de incêndio vencido era mais sério do que podia imaginar. Ainda mais, porque o Crisóstomo era palestrante de Segurança no Trabalho. Ou seja, mó micão.

Ah, outra coisa que também foi embora com o incêndio foi a relação meteórica da Ane com esse babaca. Diga-se de passagem, sem sexo e com pouquíssimo beijo na boca.

E, pela primeira vez na vida, posso dizer que, literalmente, eu QUEIMEI o filme de alguém.

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