Eu estava tomando um chope com um amigo gringo na segunda-feira, à tarde, em Ipanema, quando a Ane passou por nós bêbada e trôpega num vestido longo muito bonito e com um buquê de flores.
Adalberto: Ane, sua maluca!
Ane: Primo!
Adalberto: Isso são horas de sair de uma festa?
Ane: Eu estava no casamento do meu melhor amigo. E você tomando cerveja... Isso são horas de tomar cerveja?
Eram 8h da manhã.
Adalberto: Esse aqui é o meu amigo Gianfrancesco Brinkley, filho de italiana com americano, que mora na Espanha.
Ane: Ou seja, um cara complexo.
Adalberto: Exatamente.
A Ane se restringiu em apenas apertar a mão do Gian, como ele é chamado por todos.
Adalberto: Ah, ele fala português.
Ane: Então, a gente pode ser amigos.
Gian: Claro.
Ane: Quanto tempo você vai ficar aqui, Gian?
Gian: Só hoje.
Ane: Só?
Adalberto: Ele veio aqui só para casar com uma amiga minha, para poder se legalizar no país. Ele pretende vir morar aqui.
Ane: E já casaram?
Gian: Não.
Adalberto: A minha amiga é da Bahia. Perdeu o voo. Não vai ter como chegar a tempo. Uma pena.
Ane: E ele não vai casar?
Gian: Não.
Ane: Mas ele só casa se for com uma baiana?
Adalberto: Não. Pode ser com qualquer pessoa. É que ela é a única pessoa, que eu conheço, que tem interesse em tirar passaporte europeu. O cartório está agendado para a uma e meia.
Ane: Então, ele vai casar comigo.
Adalberto: De jeito nenhum!
Gian: Por que não?
Ane: É. Por que não?
Adalberto: Porque esse casamento é uma farsa.
Ane: O casamento é verdadeiro. O sentimento que vai ser uma farsa.
Adalberto: Então, pronto! Vai se casar pela primeira vez dessa maneira?
Ane: E daí? O lance é casar. Olha, dizem que, depois que a gente casa, o assédio aumenta. Eu quero que o assédio aumente!
Adalberto: Seja mais ambiciosa!
Ane: Eu quero tirar passaporte europeu e americano.
Isso me convenceu.
Quando dei por mim, estava no cartório com a Ane e o Gian.
Ah, não posso me esquecer da Lilian Passé, a amiga do Gian, que é filha de espanhola com francês, mas que mora na Alemanha. Ela estava dormindo no hotel e teve, apenas, cinco minutos para se arrumar para ser madrinha de casamento.
A Ane estava com o buquê do casamento do seu melhor amigo.
Ane: Esses seus amigos são muitos complexos, hein, Adal.
Adalberto: A Lilian não é minha amiga. A gente se conheceu hoje.
Ane: Casa com ela e tira passaporte europeu.
Adalberto: Cala a boca.
A Lilian não pôde ser testemunha do casamento da Ane comigo, porque não tem CPF brasileiro. Tive que ir à rua buscar alguém que se submetesse substituir a Lilian por cinqüenta reais. O máximo que consegui foi uma vendedora de petshop afrodescendente, cheia de creme no cabelo oxigenado. E olhe lá.
Ane: Essazinha, com a calça da Gang, foi o máximo que você conseguiu? Não podia arrumar uma madrinha com menos cara de piranha?
Adalberto: O Gian me deu cinquenta reais para eu subornar alguém para ser madrinha. Com esse dinheiro não dava para trazer a Gisele Bündchen.
Ane: Esse seu amigo gringo também é pobre?
Pior que é. Mas eu não tive coragem de falar para a Ane. Eu coleciono amigo gringo sem dinheiro. Impressionante! Tenho uma meia dúzia de amigos do Primeiro Mundo, que têm menos dinheiro e bens do que eu.
Ane: Adal, você precisa conhecer gringo melhor. Com mais dinheiro.
Adalberto: Ane, você veio aqui para casar ou para bater papo?
Ane: Chato.
Demorei muito para conseguir assinar a certidão de casamento da minha prima. A periguete da petshop assinou em um segundo e picou a mula. Mas ela não tinha nenhum envolvimento com os noivos. Me deu uma tremedeira... Eu estava muito nervoso. Era tudo fake, de mentira... Mas não deixava de ser o casamento da minha prima.
Ane: Adal, diz para a Lilian Passé, que eu vou jogar o buquê. E só tem ela de mulher. Ela vai se dar bem.
Adalberto: Ane, não inventa. A Lilian Passé está passada.
Ane: Por quê?
Adalberto: Porque esse casamento é uma piada. Parece filme de Almodóvar.
Gian: Vamos comer?
O Gian nos levou para comer num restaurante caríssimo em agradecimento. Era o mínimo que ele podia fazer por mim e pela minha prima.
Só que a conta quem pagou fui eu. O cartão do Gian, surpreendentemente, não passava.
Ainda gastei os tubos de combustível no circuito Recreio-Ipanema, Ipanema-carório, cartório-Ipanema e Ipanema-aeroporto. Tudo isso para fazer um favor por um amigo.
Ane: Adal, obrigada pelo favor que você me fez.
Adalberto: Que favor que eu te fiz? Eu fiz um favor para o Gian. Aliás, você fez um favor para ele.
Ane: Foi estranho vê-lo indo embora. Mal casei e meu marido foi morar no outro lado do mundo.
Adalberto: O seu marido mora no outro lado do mundo.
Ane: Ele bem que podia ser bonito, hein, Adal.
Adalberto: Não gostou?
Ane: Não. Muito gordo, muito baixo e muito careca.
Adalberto: Mas muito gente boa.
Ane: Será?
Adalberto: Por que você está falando isso? Percebeu alguma coisa nele?
Ane: Não. Só achei estranho o cara convidar a gente para almoçar e, na hora de pagar a conta, não ter dinheiro.
Adalberto: Mas ele disse que ia me pagar.
Ane: Quando?
Adalberto: Não sei. Não perguntei. Talvez ele faça uma transferência internacional. Não sei.
E não sabia mesmo. Aliás, não fazia a mínima idéia de como ele ia fazer para me pagar aquele almoço.
Ane: Fica tranqüilo. A partir de agora, eu vou ter direito a tudo o que ele adquirir. Você não vai sair no prejuízo, primo.
É assim que se fala!
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