domingo, 11 de novembro de 2012

Quando todos os caminhos dão no show da Lady Gaga

Na sexta-feira, eu saí do trabalho mais cedo, porque fiquei de levar umas doações para um convento. Como não gosto de fazer nada sozinho, chamei a primeira prima que me veio à cabeça para me acompanhar.

Sara: Alô.

Adalberto: Está fazendo o que, Sarita?

Sara: Oi, Adal. Estou aqui no supermercado, fazendo compras de mês. 

Adalberto: O Oswaldo está com você?

Sara: Não. Por quê? Você está sabendo de alguma coisa dele? Olha, se estiver, pode falar, Adal, nós somos primos.

Adalberto: Sara, que neura! Perguntei por perguntar. Não sei de nada. Beijo.

Depois dessa, decidi convidar a Marjorie, a prima prática.

Marjorie: Fala, Adal.

Adalberto: O que você está fazendo de bom?

Marjorie: De bom, nada. Eu estou esperando uma cliente, que está vindo conversar sobre a próxima coleção. Ih, primo, ela acabou de chegar. Tenho que desligar. Beijo, tchau.

Viu como ela é prática? Próxima opção: Ane.

Ane: Priminho!

Adalberto: Oi, amoreca, onde você está?

Ane: Aqui, na casa do Afonsino.

Adalberto: Quem é esse.

Ane: Meu novo "amor verdadeiro, amor eterno".

Adalberto: Ane, você não vai tatuar essa cafonice no seu pé.

Ane: Eu, vou. Só faltava encontrar o meu amor. Agora que encontrei, já posso escrever "Afonsino - Amor verdadeiro, amor eterno". Isso não é cafona.

Adalberto: Pode até não ser. Mas a Deborah Secco já tatuou isso no pé, quando estava namorando o Falcão. Você sabe disso. 

Ane: Claro. Eu estou copiando dela, porque achei lindo.

Adalberto: Copiar a cafonice dos outros é ser cafona ao quadrado.

Ane: Ai, Adal, deixa eu desligar. O Afonsino está quase batendo na mãe dele, porque ela não acha um par de meias dele. Vou ajudar a procurar.

Adalberto: Como assim?

Ane: A mãe dele perde tudo que é dele. 

Adalberto: E só por isso ele quer bater nela?

Ane: Toda semana ele bate nela, mas ela não aprende...

Adalberto: Ane, então, corre daí, antes que esse cara te bata.

Ane: Ele não é maluco.

Adalberto: Ah, o cara que bate na mãe não é maluco?

Ane: Ela dá motivos?

Adalberto: E perder uma meia é motivo?

Ane: Isso para ele é importante, Adal. Você, quando viaja, coloca fralda geriátrica, porque tem medo de sentir vontade de fazer número 2 e não ter onde. Isso para você é importante. Para o Afonsino, um par de meias também é importante. 

Ela precisava fazer essa comparação?

Adalberto: Ane, se você não sair dessa casa agora, quem vai te bater sou eu. Onde já se viu? O cara bate na mãe e você ainda quer tatuar o nome dele no seu pé. O teu amor-próprio está no pé mesmo, hein...

Ane: Ih, deixa eu ir lá. Ele está molhando o pano de prato.

Não entendi a ação.

Adalberto: E quando a pessoa molha o pano de prato, o que isso quer dizer?

Ane: Quer dizer que ele vai bater na mãe dele com pano de prato molhado. Tchau, Adal!

Meu Deus! A minha prima está muito mal parada. O pior é que eu nem sabia onde ela estava para tirá-la à força daquele lugar.

Resolvi não ficar preocupado com a Ane para não comprometer a tranquilidade do meu dia. Ela já passou por situações piores e soube dar a volta. 

Liguei para a Lu.

Lu: Oi, meu amor.

Adalberto: Lindona, vamos comigo levar umas doações naquele convento, que eu ajudo sempre?

Lu: Adal, eu estou indo à feira. Vou comprar tomate e, depois, vou aproveitar para tomar caldo de cana com pastel. Estou com esse desejo há dias. Vem para cá.

Adalberto: Não posso, amore.

Lu: Por quê? É rapidinho. Eu como e a gente vai.

Adalberto: Não. Agora que vi, estou atrasado.

Mentira. Estou de dieta. Engordei três quilos no último feriadão.

Lu: Então, está bem. A gente se fala. Beijo.

Para a minha surpresa, depois que eu entreguei as minhas doações, a madre superiora, que se acha superior às outras, me entregou um envelope.

Madre superiora: Isso aqui é para te agradecer.

Adalberto: Ah, madre, obrigado.  

Eu imaginei que fosse um cartão, com uma mensagem linda. Mas eram dois ingressos para o show da Lady Gaga.

Eu tinha ouvido que o show dela não bombou nas vendas. Mas daí a ter distribuição de ingresso em convento... É muita apelação!

Como não tinha nada para fazer, decidi ir ao show. Não chamei ninguém para ir comigo, porque queria tentar vender o outro ingresso na porta e fazer uma graninha extra.

Me dei mal. Os cambistas estavam trocando biscoito e refrigerante por ingresso para o show.

Fui ser solidário.

Adalberto: Toma aqui, moço. Quem sabe, com esse, o senhor não consegue a passagem de volta para casa...

Cambista: Obrigado, meu filho. Acabei de trocar cinco ingressos por um golinho de Coca-Cola e sete, por uma mordida num sanduíche de presunto com ovo.

Meu Deus, que decadência! Eu queria adotar esse cambista, pagar por todos os ingressos que ele comprou, na esperança de ter lucro e, quem sabe, colocar comida dentro de casa, mas eu não tinha condições de fazer isso. Eu não tinha um centavo no bolso. Meu cartão tinha sido bloqueado e eu fui ao show com a roupa do corpo e nada mais.

Adalberto: Moço, saiu muito caro para o senhor comprar os ingressos para revender aqui na porta?

Cambista: Nada. Umas freiras subiram lá no morro onde eu moro e saíram distribuindo. Só eu ganhei uns vinte.

Adalberto: Ah, tá.

Então, ele estava no lucro... E eu com pena desse sujeito...

Cambista: Tu vai entrar no show ou também veio tentar vender ingresso?

Adalberto: Não, eu vou entrar. 

Cambista: Então, vamos! Eu também vou. Minha família está toda lá dentro.

Dentro do Parque dos Atletas, onde aconteceu o show, cabem cem mil pessoas. Mas parecia que só tinham cem. Cem monstrinhos, diga-se de passagem. A Lady Gaga, sim, era digna de pena.

Mas ela não se abalou por isso. Fez sua apresentação como se estivesse diante de uma plateia de um milhão de... Mostrinhos!

De repente, fui chamado ao palco.

Lady Gaga: Hey, you!

Adalberto: Eu?  

Lady Gaga: Yeah!

Subi ao palco.

Lady Gaga: Do you like my concert?

Adalberto: Yes.

Lady Gaga: Really? So you are having a good time, aren´t you?

Adalberto: Yes.

Lady Gaga: Did you come alone?

Adalberto: No.

Eu detesto ser monossilábico, mas também morro de vergonha de falar inglês na frente de um monte de gente que fala a mesma língua que eu. Tudo bem que não tinham cem mil pessoas. Mas tinham cem!

Lady Gaga: Who came with you?

Caramba! Eu não sabia o nome do cambista. Também ia ficar chato eu falar para a cantora que eu entrei com um cara que estava fazendo venda ilegal de ingressos do show dela. Fora que eu não sei como se fala cambista em inglês. Será que existe cambista nos lugares em que se fala inglês? Ou isso é coisa que só tem no dicionário de português do Brasil?

Adalberto: Sorry, I came alone.

Lady Gaga: Oh, ok. And what´s your name?

Tive dúvidas se ela ia conseguir pronunciar meu nome.

Adalberto: My name is very difficult for you to speak.

Lady Gaga: But say to me. What´s your name my little monster?

Depois de ter visto como eram os seus fãs, entendi isso como um xingamento. Mas tive pena de dizer para ela que eu não era um monstrinho. O show já não tinha bombado... 

Adalberto: My name is Adalberto.

Lady Gaga: What?

Adalberto: Adalberto:

Lady Gaga: Sorry, baby. Spell your name, please.

E depois da cena ridícula, em que eu soletrei o meu nome para a Lady Gaga, ela finalmente improvisou, para mim, uma versão de "Alejandro".

Lady Gaga: Adalberto, Adalberto // Ada-Adalberto, Ad-Adalberto // Don´t call my name, don´t call my name, Adalberto // I´m not your babe, I´m not your babe...

Que mico! Naquele momento, eu virei uma celebridade da mídia. Da mesma safra dos ex-BBBs, das mulheres que invadem as partidas de futebol completamente nuas, das ex-namoradas dos jogadores de futebol e das mulheres que ficam viúvas de famosos e escrevem livros para contar como era a vida deles.

De repente, de cima do palco, vi uma confusão. E como era pouca gente nos show, consegui ver as minhas quatro primas e o Oswaldo no meio de uma briga. Isso chamou a atenção da Lady Gaga, que interceptou.

Lady Gaga: Hey, please, stop fighting, my little monsters!

Adalberto: Deixa que eu falo em português com eles.

E tomei o microfone da mão dela.

Adalberto: Gente, vamos parar com a briga! Vamos parar com essa palhaçada! Não tem tanta gente aqui para ter briga. Dá para todo mundo ver o show de perto. Cadê os seguranças, hein?

Os seguranças estava dormindo. Era tão pouca gente, que eles achavam que não iam ter trabalho e ficaram dormindo nas guaritas. Isso foi o que me contaram depois. 

Um policial, que estava curtindo o show, algemou um homem e o levou para fora do local. Deis dois beijinhos na Lady Gaga e desci para ficar com as minhas primas. Ela voltou a cantar como se nada tivesse acontecido. Essa menina, como diria minha mãe, é uma artistona. Sabe superar as dificuldades...

Adalberto: gente, o que vocês estão fazendo aqui? O que aconteceu? Que confusão era aquela?

Marjorie: Calma, Adal. A gente se encontrou aqui por coincidência. Eu ganhei um ingresso daquela cliente que foi lá em casa hoje.

Lu: Eu ganhei o meu na barraquinha de tomate, da feira. 

Sara: Eu ganhei dois ingressos no mercado, onde fiz compras de mês.

Ane: E eu vim com o Afonsino.

Adalberto: E cadê ele?

Ane: Ele foi preso. Um policial que estava aqui à paisana levou ele para fora.

Adalberto: Eu vi isso de lá de cima do palco! Era o Afonsino?

Ane: Era, Adal, vamos lá comigo atrás dele?

Adalberto: Está maluca? Para quê? Para ele me bater? O cara que bate na mãe merece isso. Ser preso! Mas o que esse louco aprontou?

Marjorie: Foi pego furtando dinheiro da bolsa de uma monstrinha.

Percebi a ironia da Marjorie e senti vontade de rir, mas não era a ocasião para isso.

Lu: O cara não presta. Roubou uma freira todos os ingressos que uma freira ia distribuir numa favela. 

Adalberto: Ah, deve ser do convento que eu ajudo. As freiras de lá saíram distribuindo ingressos para o show pela favelas. Eu ganhei o meu de lá... Mas como é que você soube que ele roubou uma freira?

Lu: Aquela madre superiora, que está ali na frente comprando cerveja, me contou. Ele ficou o tempo todo com a gente aqui no show. Ela se joga, primo. Muito legal.

Adalberto: Gente, é a madre superiora do convento que eu faço doação! Como assim?

Marjorie: Como assim, que eu vou embora!

Adalberto: Já?

Marjorie: Primo, todos os mosquitos do mundo já me comeram aqui. Eu preciso estar viva para terminar uma coleção até o fim da semana que vem. Estou indo. Beijo!

Sara: E eu vou com o Oswaldo. Também não estou aguentando esses mosquitos.

Oswaldo: Eles são os verdadeiros monstrinhos.

Sara: Tchau, primo.

Adalberto: Gente, então, eu também vou.

Lu: Eu vou com você. Vamos beber fora daqui, primo. A cerveja aqui dentro é muito cara e eu nem gosto tanto assim dessa gaga.

Ane: Ah, sua falsa! Você ficou aos prantos, quando ela acenou para você de dentro do carro, chegando aqui...

Lu: Porque eu pensei que fosse aquela outra que eu gosto.

Adalberto: E quem é aquela outra que você gosta.

Ane: É a Kate Perry. Mas ela nem sabia o nome da mulher.

Lu: Ah, não sabia mesmo, não. Só sabia que ela cantava aquela música que eu gosto, assim "nãnãnã, nãnã, nãnãnãnãnã, nãnãnã, nã".

Adalberto: Que música é essa?

Ane: Ah, sei lá, Adal. Vamos embora daqui. Vou atrás do Afonsino.

Adalberto: Ah, mas não vai mesmo. Senão, eu vou bater em você, como ele faz com a mãe dele: com pano de prato molhado.

Fui com a Ane e a Lu para um bar perto da minha casa. A essa altura, o show já havia acabado.

Quando chegamos, tomei um susto com o bando de gente que veio me fotografar. A Ane que estava com um bico do tamanho do mundo, porque eu não quis deixá-la ir atrás do bandido do Afonsino, estava curtindo o momento "prima de um pseudo-famoso".

Adalberto: O que é isso, gente?

Lu: Esqueceu que você agora é uma celebridade? O show foi transmitido na TV aberta, meu bem. 

Adalberto: Ah, meu Deus, que vergonha.

Já tinha gente com faixa, cartaz com foto minha e tudo...

Nem consegui pedir minha cervejinha. Os meus fãs não me deixavam em paz. Fui para casa sozinho. A Ane e a Lu, espertas que só elas, se arrumaram entre os meus fãs.

Adalberto: Esses meninos devem ter menos de dezoito anos!

Lu: Deixa! A gente cuida deles direitinho.

Adalberto: Vocês não valem nada.

Ane: Por isso que você gosta da gente.

Adalberto: Pelo visto, já esqueceu o Afonsino, né?

Ane: Quem é Afonsino?

Lu: Afonsino já é passado na vida dela, meu bem. A gente, agora, vai investir na primeira idade.

Adalberto: Tchau, suas louquinhas! Agora, vai ser assim que vou chamar os meus fãs. Os da Lady Gaga, são monstrinhos e os meus, louquinhos. Gostaram?

Ane: Adorei.

Lu: Muito bom, primo.

Muito boa foi essa reviravolta que deu na minha vida. Ontem, fui convidado para da entrevista para vários telejornais, estou sendo chamado para fazer presença VIP em várias festas, estou conhecendo vários artistas e fui sondado para fazer a abertura do "Soletrando", do programa do Luciano Huck, no começo do ano que vem.

Tomara que os meus quinze minutos de fama durem até lá.

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