sábado, 3 de novembro de 2012

Dia de Finados em grande estilo

Ontem, foi Dia de Finados e eu só pensava em matar minha fome. Tinha saído no dia anterior, acordei tarde, faminto, mas a dispensa estava vazia. Nem ia tomar café. Como já era hora de almoçar, queria ir para algum restaurante e encher a pança. Mas queria companhia. Liguei para a Sara:

Sara: Oi, Adal.

Adalberto: Está falando baixinho por quê?

Sara: Eu estou no cemitério. Vim aqui com a minha sogra. A gente está no meio de uma oração. Depois, eu te ligo.

Eu queri ter falado que não precisava me ligar depois, que o que eu queria fazer não podia esperar a oração dela... Mas ela não me deu tempo para isso e desligou. Se desse tempo, eu também iria perguntar para quem elas estavam rezando. Mas isso, eu posso saber depois.

Opção 2: Marjorie.

Marjorie: Oi, Adal.

Adalberto: Que voz é essa?

Marjorie: Como assim?

Adalberto: Você está com uma voz de enterro.

Marjorie: É que eu acabei de voltar do enterro da Dora.

Adalberto: Quem é Dora?

Marjorie: A minha hamster. A minha vida acabou.

Eu senti vontade de rir. Juro, não consigo sofrer pela morte de um bicho, mas entendo quem é assim.

Adalberto: Ela morreu?

Marjorie: Morreu, né, Adal...

Adalberto: É, eu sei. Não foi isso que eu quis perguntar. Eu só queria lamentar, mas acabou me expressando mal e fiz uma pergunta meio que óbvia. Mas, na verdade, eu só queria te dizer que... Bom, eu queria te dizer que... Nessas horas... A vida... Eu acho que quando um animal morre é como se... Não... talvez seja melhor você... Sei lá.

Ai, acho que é mais fácil confortar uma pessoa que perdeu a mãe, do que alguém que perdeu um hamster, que só sabia fazer sujeira pela casa inteira!

Marjorie: Adal, eu vou desligar. Eu preciso ficar um pouco aqui, na minha.

Melhor assim.

Adalberto: Está bem, então, amore, só liguei para saber se estava tudo bem com você. Eu lembrei que a Dora estava mal e aí te liguei para isso. Eu só não sabia o nome dela, né? Mas lembrei que a hamster estava bem mal. Eu sou péssimo para nomes. E, quando você fala Dora, sempre me vem à mente a Dorinha, a nossa ex-vizinha lá do Méier. Lembra da Dorinha? Uma querida aquela menina. Parece que ela teve um filho. Aliás, vamos combinar um dia de ir lá na casa dela, visitar a mãe dela, conhecer o filhinho dela. parece que ela separou do marido. Mas, segundo diziam, o cara não valia nada. Talvez tenha sido melhor assim, né? Marjorie? Marjorie? Jojô? Ih, a ligação caiu.

Ou, não. Decidi que a Lu seria a minha companhia para almoçar.

Lu: Oi, Adal.

Ela parecia bem nervosa, mas eu fingi que não tinha percebido nada.

Adalberto: Boa tarde!

Lu: Boa tarde, por quê?!

Adalberto: Porque já passou do meio-dia e as pessoas educadas cumprimentam assim.

Lu: Mas eu estou cansada de educação. Eu fui educada, maneira, parceira com aquela canalha do Clodowilson ele me trocou por uma garota, que ainda nem tirou as fraldas. Eu não mereço isso! Eu não mereço isso! Eu vou matar aquele desgraçado!

Adalberto: Lu, olha só, hoje é Dia de Finados. Deixa para matar ele outro dia. Imagina como deve ser ruim para uma família quando alguém morre no Dia de Finados...

Lu: Eu quero que se dane ele e a família dele. Aquela jararaca da mãe dele, que dizia que eu era a sua segunda filha, nem atende as minhas ligações. Se ela cruzar a minha frente, eu mato ela também. Adal, eu estou indo agora com uma faca até a casa do Clodowilson para matar aquele ordinário.

Eu precisava parar essa doida!

Adalberto: Lu, não! Me espera. Eu vou com você. Te ajudo a matar ele, a mãe dele, o pai dele, a irmãzinha dele, que é uma fofa, mas é irmãzinha dele, a vozinha dele, o cachorro, o papagaio, o periquito... Chacina total. Acabar com aquela raça de gente. Topa?

Lu: Não, primo. Eu sei que você está falando isso só para me enganar. Depois, vai chegar aqui e não vai fazer nada disso.

Adalberto: Eu te prometo.

Lu: Não. Depois, você vai ficar sabendo pelo boletim de ocorrência, que, com certeza, alguém vai fazer.

Adalberto: Lu, não! Por favor! Lu! Lu! Lu? Desligou. Droga!

Perdi até a fome... Com a Sara ocupada com a sogra e a Marjorie arrasada, só me restou ligar para a Ane me ajudar a conter a Lu.

Ane: Oi, Adal.

Adalberto: Que voz é essa?

Parecia que ela estava gemendo.

Ane: Nada, Adal, fala.

Adalberto: A Lu saiu de casa agora para matar o Clodowilson. A gente precisa impedir essa louca de fazer isso. Liga para ela. Eu falei com ela, mas não adiantou nada. Acho que ela te ouve mais.

Ane: Não, não, não, não, não, não, não, não, nãããããããããããããããããããoooooooooooooooo!

Adalberto: Está bem, Ane. Não precisava disso tudo. Era só dizer uma vez que não, que eu ia entender.

Ane: Calma, Adal.

Adalberto: Calma, o quê? Eu estou calmo. Você é que está gritando comigo. Aliás, eu tenho motivos para estar nervoso. A nossa prima foi matar o ex-namorado e nem por isso eu te destratei.

Ane: Adal, eu estava transando.

Adalberto: Como assim? Você atende telefone, enquanto transa?

Ane: Ideia do Creonelson. Ele disse que era para eu atender. Fetiche bobo.

Muito bobo!

Adalberto: Quem é esse idiota?

Ane: Adal, o Creonelson, não lembra? Falecido Creonelson, que eu namorei tem uns dois anos, mas que terminou comigo, porque se mudou para o interior de Minas.

Óbvio que eu não me lembrava!

Adalberto: Ah, sim. Lembro, sim.

Ane: Então, ressuscitou. Veio fazer um trabalho aqui no Rio e resolveu me fazer uma visitinha. Foi ótimo.

Adalberto: Ah, que bom que foi bom para você. Agora, vamos lá comigo impedir que a Lu faça uma loucura.

Ane: Você sabe onde é?

Adalberto: Acho que sim. Eu já fui com ela à casa desse cara uma vez.

Ane: Está bem. Vou dispensar o Creonelson, tomar banho e, quando você passar aqui, eu já vou estar prontinha, te esperando.

Adalberto: Em vinte minutos eu chego aí.

Fui voando para a casa da Ane. Devo ter tomado várias multas de excesso de velocidade e ultrapassagem de sinal. Tudo por uma nobre causa.

Chegamos a tempo à casa do Clodowilson. Ela ainda não tinha chegado. Fizemos hora numa barraquinha de cachorro-quente. Eu até tinha voltado a sentir fome, mas estava com nojo. A vendedora, que chamava Djenanny, com dois ênes e ípsilon, era uma menina querida. Mas tinha um aspecto de porca.

Duas horas se passaram e a gente nem sentiu. Foi como se estivéssemos há quinze minutos ali. Estávamos tendo altos papos com a Djenanny. Ela contou cada coisa da vida da vizinhança, que até Deus duvida. Já éramos melhores amigos de infância dela.

De repente, ela começou a contar uma história que me soou um pouco familiar. Ela disse que um cara, que tinha largado uma mulher mais velha para ficar com ela, voltou atrás e largou ela para ficar com a mulher mais velha. Ela falou que estava com ódio dele, porque eles mal terminaram e ele já tinha ido ficar com a outra. Segundo ela, ele queria trocar de moto e sabia que a "otária" ia ajudá-lo a comprar uma nova. E afirmou que, se ele passasse ali com ela, ela ia jogar aquela panela inteira, com molho de cachorro-quente fervendo, em cima dele e dela. A Ane não parava de rir, mas eu fiquei pensativo.

Me afastei um pouco delas e liguei para a Lu.

Lu: Ou, Adal.

Agora, ela parecia feliz.

Adalberto: Lu, onde vocês está?

Lu: Estou aqui na rua do Clodowilson e estou te vendo. Quando eu estava saindo de casa, dei de cara com ele na portaria com um buquê de flores. Eu sabia que você ia vir para cá para não deixar eu matar o Clodowilson.

Eles estavam quase chegando à altura da barraquinha de cachorro-quente. Eu precisava impedir a Lu de cruzar com a ira da Djenanny.

Adalberto: Lu, o esgoto daqui da rua está vazando. Tem um monte de barata aqui. Ai, olha! Uma até subiu em mim. Corre!

E ela correu a tempo de evitar a queimadura de terceiro grau, de molho de cachorro-quente, que deformou o rosto do Clodowilson.

As meninas ficaram apavoradas. Fomos para a casa da Marjorie tentar espairecer. A Sara estava lá. O clima, que parecia bom, ficou melhor depois que contamos a nossa aventura.

Passamos o resto do dia conversando, bebendo e rindo. terminamos o Dia de Finados em grande estilo: celebrando a vida.

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