sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Viva eu! ou Viva o Dia dos Idosos Abandonados em Asilos!

Excepcionalmente esse ano, o dia do meu aniversário, 27 de novembro, foi celebrado também o Dia dos Idosos Abandonados em Asilos. Soube disso ao ler o jornal pela manhã. Eu estava de folga do trabalho, claro. Achei a data tão curiosa, que não esperei nenhuma das primas me ligar, desejando parabéns, para contar sobre a inusitada coincidência.

Lu: Como assim, você me ligando? Era para eu te ligar, garoto.

Adalberto: Eu sei, Luluzita, mas eu preciso te contar uma coisa.

Lu: Adal, eu não estou ouvindo nada do que você está me falando.

Adalberto: Pois é. Está uma barulheira aí, onde você está. 

Lu: primo, eu não estou te ouvindo, não adianta. Olha, eu estou aqui com a Ane, a Sara e a Marjorie. Viemos naquele asilo na rua detrás de onde a Sara mora. Hoje é o Dia dos Idosos Abandonados em Asilos. Depois, a gente passa aí para te dar um beijo de parabéns. Não vou te dar parabéns agora. Beijo! Até mais tarde.

Eu não estava acreditando no que estava ouvindo. Como assim elas me trocaram por um bando de velhinhos, que foram abandonados em asilos? Que raiva que eu fiquei! Das minhas primas, de mim por gostar tanto delas e, principalmente, dos velhinhos abandonados em asilos. Por um momento, eu queria que todos os velhinhos abandonados em asilos explodissem! Mas logo a parte psicologicamente correta da minha mente me condenou por isso e, em seguida, eu já estava pedindo perdão a Deus por isso. 

Fui até o asilo. As quatro traíras ficaram surpresas ao me ver.

Sara: Você aqui?

Adalberto: Não. Eu sou a reencarnação de um velhinho, que foi abandonado num asilo. Voltei só para atazanar a vida de vocês.

Marjorie: Adal! Você está maluco? Fala baixo!

Ane: Sem noção!

Adalberto: Sem noção? Vocês me trocam por um monte de... De velhinhos abandonados em asilos, no dia do meu aniversário, e ainda querem que eu fale baixo?

Lu: Claro. Se você não teve educação, nós tivemos.

Marjorie: Gente, vamos ali para fora.

Continuamos a DR na parte externa do asilo.

Adalberto: Sem noção são vocês, que me trocam por um bando de velhinhos.

Ane: Não fala besteira!

Quer me deixar com ódio mortal? Só dizer que o que eu estou falando é besteira.

Adalberto: Falo! Falo besteira, sim. sabe por quê? Porque é besteira o que eu represento para vocês. E como eu estou falando de mim, eu estou falando de besteira, então, né? Eu não sou besteira para vocês? Me responde! Eu quero ouvir de vocês.

Lu: Garoto, para de ser mimado!

Adalberto: Eu não sou mimado!

O pior é que eu me acho um pouco mimado, sim.

Marjorie: Ah, não é?

Adalberto: Não!

Sara: Mas está parecendo.

Adalberto: É? E você com isso? Você se importa com isso? Eu sou besteira para vocês. Por que é que vocês vão se importar se eu pareço mimado ou não?

Lu: Adal, para! Você está com ciúme, porque a gente veio aqui visitar os velhinhos. Pronto!

Adalberto: Ciúme? De vocês que cagam dez quilos para mim? Não estou, não, querida. Você está muito enganada.

Ane: Gente, vamos parar de discutir?

Adalberto: Ah, está cansadinha? Eu também estou cansadinho. Cansadinho de vocês, suas ingratas.

Marjorie: Está bem. Agora, vamos lá dentro, que a gente quer te mostrar uma coisa.

Adalberto: Você não entendeu que eu não gostei nada dessa vinda de vocês para cá? Ainda quer que eu vá lá dentro? Para quê? Para dar comidinha na boca dos velhinhos. Eu? Se nem os parentes tiveram paciência com eles, você acha que eu vou ter? No dia do meu aniversário?

Marjorie: Garoto, nem todos os velhinhos que moram aqui foram abandonados pelos seus parentes. Tem gente que veio por falta de opção mesmo.

Sara: E tem uns que vieram, porque aqui tem quem cuide.

Adalberto: Como é que vocês sabem disso? Quando trazem os velhinhos aqui, alguém pergunta "o senhor veio só deixar ou está abandonando mesmo"?

Marjorie: Não fala assim, Adal.

Adalberto: Jojô, vocês nem sabem quantos velhinhos foram abandonados pelos parentes. De repente, nenhum velhinho que mora aqui foi abandonado e vocês vieram comemorar um dia, que pode não ser o deles. 

Lu: Garoto, a menina que trabalha aqui falou que mais de 50% dos velhinhos desse asilo foram abandonados pelos parentes.

Adalberto: É? Lá em casa, 100% das pessoas fazem aniversário hoje. 

Ou seja, eu.

Ane: Está bem. Agora, vamos lá dentro,  Adal

Lu: É, garoto. Para de palhaçada e vamos logo. Anda!

Sara: Por favor, primo.

Adalberto: Vem cá, vocês não entenderam mesmo, né? Querem que eu desenhe, então? Eu vou embora desse lugar, de onde eu nunca deveria ter pisado os meus pés. E vou pedir um favorzinho para vocês.

Eu ia dizer para elas nunca mais falarem comigo, esquecerem que eu existo, apagar meu telefone das agendas dos seus celulares, quando uma moça que trabalha no asilo foi até nós.

Moça que trabalha no asilo: Gente, desculpa interromper a conversa de vocês...

Conversa? Como ela foi simpática.

Moça que trabalha no asilo: ... Mas a gente precisa cantar logo o parabéns para o primo de vocês, senão vai ficar tarde para os meus anjinhos tomarem banho.

Adalberto: Como assim, parabéns?

Marjorie: Essa é a sua festa surpresa, seu bobo.

Eu estava em estado de choque.

Adalberto: Como assim?

Ane: Festa surpresa, ué. Você não joga na nossa cara, que a gente nunca consegue fazer uma festa surpresa para você? Então, a Sara teve a brilhante ideia de fazer o seu aniversário num asilo. 

Sara: É. Só assim a gente conseguiu te fazer uma surpresa.

Marjorie: E ainda viemos trazer alegria para todos os velhinhos que moram aqui no Dia dos Idosos Abandonados em Asilos. Não é legal isso, primo?

Adalberto: Vocês só podem estar de brincadeira. Não estou acreditando nisso.

O pior é que eu estava acreditando, sim. De repente, se a moça que trabalha no asilo não tivesse aparecido, falando do meu aniversário, eu não acreditaria. Eu ia pensar que elas estava aproveitando a celebração do Dia dos Idosos Abandonados em Asilos para fingir que o motivo da festa era, na verdade, o meu aniversário. E o melhor é que não era.

Quando eu entrei na sala de eventos, vários velhinhos abandonados naquele asilo cantaram parabéns para mim. Amei aquilo. Amei aqueles velhinhos. E entendi por que a moça que trabalha lá os chama de anjinhos. Eles são uns lindos. Queria levar todos para minha casa, dar de tudo do bom e do melhor para eles, queria bater em quem abandonou eles ali.

Fui a um barzinho comprar cervejas para a gente tomar com os velhinhos. A diretora do asilo liberou para eles tomarem um goró, pelo menos, no dia deles. Mas com a condição de ser dois copos apenas para cada um. 

É claro que eu não fiquei regulando nenhum velhinho. Eles encheram o pote. Eu e as minhas primas também.  Até a diretora do asilo e as moças que trabalham lá beberam além da conta. Parecia que nunca tinham visto cerveja na vida.

De repente, uns instrumentos brotaram na festa e, quando dei por mim, estava numa roda de samba formada por idosos abandonados em asilos. Me acabei!

Já tarde da noite, completamente bêbado e quase sem conseguir andar, fui me despedir da velharada. Foi dessa maneira que eu me referi a eles depois de uns quatro copos.

Adalberto: Já vou.

Velhinho: Já? Ah, não vai.

Adalberto: Eu tenho que acordar cedo amanhã.

Moça que trabalha no asilo: Deixa ele ir. No ano que vem, a gente comemora de novo. Parece que essa data vai entrar mesmo para o calendário comemorativo nacional. 

Adalberto: Mesmo se não entrar, a gente institui. Adorei ter comemorado o meu aniversário aqui. Fiquei muito emocionado com a surpresa.

A moça que trabalha no asilo, que também estava completamente bêbada, deu uma gargalhada.

Adalberto: Eu falei alguma coisa engraçada?

Moça que trabalha no asilo: Ai, menino. A tua prima me mandou uma mensagem de texto, enquanto vocês brigavam lá fora, dizendo para eu chamar vocês para a sua festa surpresa de aniversário. Falou que você estava morrendo de ciúmes e que não podia nem sonhar que a festa era para os meus anjinhos. 

Adalberto: Sério? 

Eu estava tão nervoso, durante a discussão com as minhas primas, que nem percebi quem foi a ingrata, que mandou essa mensagem de texto.

Velhinho: A menina foi correndo lá dentro dizer que a gente tinha que cantar parabéns para um cara. Ninguém entendeu nada. Depois, que explicaram para a gente melhor.

Moça que trabalha no asilo: Olha, eu só estou te contando isso, porque vi que você é muito maneiro e vai levar isso na esportiva. 

Velhinho: Pelo jeito que falaram de você, a gente pensou que fosse um monstro.

Moça que trabalha no asilo: Pois é, menino. As suas primas exageraram. Você é muito legal.

É... Realmente, dessa vez, elas exageraram mesmo.

Moça que trabalha no asilo: Parece que elas iam para a sua casa, depois da festinha daqui pelo Dia dos Idosos Abandonados em Asilos. Mas foi bem melhor assim, né? vai dizer que você não gostou.

Não. Mesmo bêbado eu ainda tinha discernimento. É claro que eu estava gostando. Mas, depois de saber a verdade, eu estava odiando aquilo tudo.

Velhinho: Ele gostou, sim. Não gostou.

Adalberto: Gostei.

Fui embora para casa à francesa. Chorei copiosamente na minha cama. Dormi sem me dar conta de até onde chorei e, no dia seguinte, para a minha surpresa, acordei com nadinha de ressaca.

O álcool deve ter saído todo pelas minhas lágrimas. Então, até que não foi nada mal. 

E viva eu!

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